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Em janeiro de 1997, morria “Bacurau”, fundador do Morhan, vítima de hanseníase contraída aos cinco anos

Por TIÃO MAIA, PARA CONTILNET

Bacurau é fundador do Morhan. Foto: Arquivo pessoal

Ele morreu numa manhã chuvosa do dia 12 de janeiro de 1997, na casa em que vivia com a família, no Conjunto Bela Vista, em Rio Branco. Francisco Augusto Vieira Nunes, que ganhou fama nacional sob o apelido de “Bacurau”, morreu em casa, vítima de um tumor cerebral, após pedir ao médico que o assistia num hospital em São Paulo para poder vir passar os últimos dias de sua vida em sua modesta residência no Acre.

Justificou o pedido com uma declaração comovente e que, por si só, definia o que foi, em toda avida, aquele homem humilde e sensível. “É que lá, na minha casa, pela janela, eu posso ouvir o canto dos passarinhos”, justificou.

“Bacurau” ganhou fama nacional porque, em 1981, fundou o Movimento de Reintegração das Pessoas Atingidas pela Hanseníase (Morhan), hoje uma entidade respeitada em todo o país por enfrentar a discriminação contra os portadores de sequelas e pacientes de uma doença que embora antiga, com registros de sua existência na Bíblia Cristã, ainda continua a fazer vítimas nas regiões mais pobres de todo mundo, incluindo a Amazônia, onde nasceu este autêntico herói da causa dos hansenianos.

Ele era natural da cidade de Manicoré, interior do Amazonas, e contraiu a doença aos cinco anos de idade, ainda na década de 40. Desde então passou a conhecer de preconceito, manifestado sobretudo pelo isolamento do convívio social.

Fundador do Morhan morria em um mês de janeiro, no século passado. Foto: Arquivo pessoal

Na adolescência passou a morar no hospital colônia em Porto Velho, Rondônia, e por lá ganhou o apelido, que é referência de um pássaro de hábitos noturnos da região amazônica.

Na década de 60, “Bacurau” foi internado na colônia Souza Araújo, em Rio Branco, no Acre. As sequelas, com a perda de parte dos pés e o atrofiamento das mãos, no entanto, não o impediram seu envolvimento nas questões da comunidade.

Assim, tornou-se um autêntico líder comunitário, com participação em várias lutas sociais e passou a ser reconhecido e premiado internacionalmente pelas iniciativas e conquistas. No entanto, em 1986, quando foi candidato a deputado federal constituinte pelo PT, não foi eleito.

Uma escola em Rio Branco e uma Sala na residência em que ele viveu, buscam perpetuar a memória de “Bacurau”. Ali está registrada a trajetória humanista e corajosa de um homem na sua incessante busca pelos direitos humanos e pela dignidade do portador de hanseníase e de qualquer outra patologia.

Ele também foi poeta e deixou para a história o poema “Liberdade, liberdade”, com os seguintes versos:

“Cabeça erguida, voz, identidade;
Valeu fazer a hora
Colher o medo o doce fruto da coragem
Valeu a pena escrever História
Com mãos podadas e abrir passagem
Liberdade, liberdade
Cabeça erguida, voz, identidade”

Mais que um poeta e homem sensível, “Bacurau” foi, sobretudo, uma pessoa digna que sofreu discriminação, enfrentou uma doença cruel e teve coragem de lutar por melhores condições de vida e pelos direitos dos portadores de hanseníase. Por isso, “Bacurau” vive!

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