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“Federação partidária, uma coligação de fato”: Gilson Pescador aborda assunto alvo de discussões

Por GILSON PESCADOR*

Pesquisas eleitorais são 'retrato do momento' e favoritismo a um ano do pleito nem sempre se confirma. Foto: Antonio Augusto/Ascom/TSE

Um dos assuntos que mais tem preocupado e assustado partidos políticos, parlamentares e pré-candidatos ao pleito eleitoral deste ano de 2022 é a novel federação partidária, especialmente no que concerne aos votos para às eleições proporcionais.

E com razão.

Até hoje não há doutrinadores, juristas, tribunais e resoluções que explicitem e deixem claro como vai ser a contagem dos votos para as eleições proporcionais, numa federação formada por dois, três ou mais partidos.

Evidentemente, a Lei 14.208/21, que criou a federação partidária, a qual já vinha sendo discutida no Congresso Nacional desde o ano de 2015, dispõe expressamente em seu artigo 1º, acrescentando o artigo 11-A a Lei 9.096/95 (Lei Orgânica dos Partidos Políticos), que tal entidade de direito privado, registrada em cartório, com seu estatuto próprio, “atuará como se fosse uma única agremiação partidária”.

Então, a federação atuará como se fosse um só partido político, mantendo, tais partidos, a sua existência, com nome, estatutos e sedes próprias. A federação fará uma nominata, com o nome dos candidatos, e atuará, para os fins eleitorais, como uma verdadeira coligação.

É uma lista só, com todos os nomes, obedecendo-se, tanto os partidos como a federação, tanto a cota de sexo (30% e 70%), como a de raça, sob pena de indeferimento de registro da chapa, acaso não se corrijam as distorções apontadas pela Justiça Eleitoral, que vai checar a declaração do candidato (raça/gênero) com o constante em seus arquivos.

Cada candidato levará ao lado o nome de seu partido, por mais que integre uma federação, sendo que o número de vagas é de 100% (cem por cento) mais um, do número de vagas disponíveis na Assembleia Legislativa e na Câmara Federal. Não é mais uma vez e meia o numero de cadeiras a serem ocupadas, como nas eleições anteriores.

Assim, a federação deverá atingir o coeficiente eleitoral e o correspondente ao coeficiente “partidário”, enquanto que o candidato tem que ter a votação individual mínima de 20% (vinte por cento) do quociente eleitoral, como desempenho merecer uma vaga.

Como se trata de uma só lista, a briga interna vai ser grande, porque não importa muito quanto cada partido contribuiu para o número de votos obtidos, mas a somatória dos votos da federação, para se chegar ao número de candidatos eleitos, na comparação com outros partidos e federações.

Agora, a questão é que, para candidatos fracos eleitoralmente, pouco importa estarem na federação ou em um partido isolado, que dispute o pleito sem integrar o coletivo da federação.

A insegurança exsurge para os candidatos de votação média, conforme o histórico de cada um.

Isto porque a dúvida estará em lançar-se candidato pelo seu partido que integra uma federação ou sair enquanto há tempo, e lançar-se por um partido que disputará as eleições sozinho, isoladamente, máxime a janela de transferência de partidos estar aberta logo mais.

É uma previsão e uma conta difícil de fazer.

Ocorre que, estando na federação, pode disputar com candidatos mais fortes, eleitoralmente, e, mesmo tendo uma boa votação, ficar fora. No partido solitário poderá, se a agremiação tiver bom desempenho, obter até menos votos que alcançaria na federação, mas ser eleito, pelos critérios complicados, mas conhecidos do sistema eleitoral, de contagem de votos.

O contrário também poderá ocorrer. Como a federação atuará unida, é o que se preconiza, terá mais recursos materiais e financeiros e tempo de televisão, o que poderá dar mais condições para o candidato médio de votos crescer eleitoralmente, mormente se houver, ainda, candidatos fortes aos cargos majoritários, que puxarão muitos votos para o rumo da federação.

Alguns Ministros dos tribunais superiores (STF e TSE), alguns políticos e juristas, fazem verdadeiro malabarismo para dizer e tentar convencer que a federação não é uma coligação partidária, de forma bisonha e melancólica.

A federação partidária é uma coligação partidária, senão de direito, de fato.

Os argumentos são utilizados para escamotear a única intenção das federações, que é ajudar os partidos nanicos a cumprir a cláusula de barreira, e, assim, não deixar de existir.

A principal explicação é de que uma coligação nasce na convenção e fenece após as eleições, imediatamente. A federação teria uma duração maior, com uma vida de, no mínimo, quatro anos.

O segundo argumento é que a federação atuará como um só partido com identidade político-ideológica que os aproximam – imagine só –  por isso, comungariam de ideais comuns e caminhariam de mãos dadas pela defesa da democracia e do bem comum, razão primacial do Estado.

E, por fim, a terceira razão, é de que atuariam nas Casas Legislativas e no Poder Executivo como se fosse uma só agremiação partidária, com um líder que os represente, escolhido nos termos do estatuto previamente discutido e aprovado por todos os partidos que a integram e caracterizam.

Ledo engano.

As federações não irão resistir, não irão sobreviver por muito tempo. Alguns partidos sairão da federação antes mesmo do término dos quatro anos, por diversas razões, inclusive pessoais, afetivas e emocionais entre seus componentes. É óbvio que o partido que se desligar terá punições, como não poder integrar outra federação até o restante dos quatro anos daquela a qual pertencia, entre outras.

Se há um afigura que poderia bem expressar as federações, com a infinidade de partidos e ideologias que tem no Brasil, seria a do Frankenstein, montando o Cavalo de Tróia, com uma Caixa da Pandora dentro.

A ideologia será o menos importante na formação das federações. O poder, o dinheiro, as chances de eleição, de proporcionais e majoritários, sim. A partilha do poder, posteriormente, sim.

Afinal, o que é ideologia?

Há políticos, militantes e partidos de esquerda – aliás, o que é ser esquerda? – que defendem os patrões, os banqueiros, os grandes proprietários de terras e, inclusive, crescem com eles.

E há políticos, militantes e partidos de direita – aliás, o que é ser de direita? – que defendem maior investimento do Governo nas questões sociais e partilha entre os trabalhadores e camponeses, quanto aos meios de produção.

Entre ambos, o que resta de comum é a corrupção e defesa de impunidade de maus gestores.

As alegações assacadas para diferenciar federação de coligação, que mencionamos acima, são, na realidade fática, comuns a ambas instituições.

Se na federação o argumento maior é o fato de ser perene, em relação às coligações,  esta nota também faz parte também se verifica, mesmo após sua extinção jurídica com o encerramento das eleições, razão de que os partidos, em sua grande maioria, permanecem juntos ou próximos, mormente quando se partilha a vitória da eleição majoritária, com a distribuição de cargos, direitos e obrigações.

Historicamente, se pode constatar que, a cada eleição, são praticamente os mesmos partidos que voltam a se agrupar, a se “federar”, variando um pouco de acordo com a mudança de seu dono, do seu proprietário ou pasteiro, nos anos anteriores.

E, entre uma eleição e outra, os partidos perdedores, especialmente nos Parlamentos, vão para a oposição, enquanto que os vencedores, via de regra, constituem a base de Governo, a situação, variando muito pouco, de acordo com as conveniências “políticas e ideológicas” de cada um, por vezes nada republicanas.

Nesta linha de intelecção, o argumento que defende a federação, de que os membros e partidos vão permanecer casados, no regime de comunhão de desígnios e de ideais, é ingênua e superficial, afastada da realidade histórica dos fatos.

Não é a existência de um estatuto comum e de alguns acordos prévios, formalizados, que diferencia, no mundo dos fatos, a federação de uma coligação normal, já conhecida de todos.

No que concerne a facilitar a vida nas Casas Legislativas, por meio de reuniões de poucos líderes, o que daria celeridade e agilidade ao trâmite dos expedientes, vez que a federação age como partido e representa alguns outros, também não milita a favor dos argumentos que tenta convencer de que esta novidade se diferencia da coligação entre dois ou mais partidos.

Um pouco mais ou um pouco menos de gente sentada ao redor de uma mesa não é entrave para o bom funcionamento do Congresso Nacional ou da Assembleia Legislativa de um Estado. É simples e tão somente a seriedade e boa vontade dos partidos e parlamentares de atuar na defesa dos interesses da população. Só isso, mesmo porque, quem tá com o governo geralmente é a favor das proposições do Executivo e quem está contra, quase sempre a minoria, só resta gritar e/ou correr para o Poder Judiciário, para intervir nos mais variados assuntos.

Em arremate, o único aspecto que importa mesmo estar atento, para quem pretende disputar um cargo eletivo no pleito eleitoral deste ano, é a fidelidade partidária, que continua valendo para as federações, e por qual caminho terá mais chance de se eleger, se sozinho ou em grupo, onde tudo pode acontecer.

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