Mistura do português com o espanhol nas fronteiras com Paraguai e Bolívia cria pegadinhas: ‘Pedi bolo e recebi pão’
Por G1
O portunhol, mistura de português com o espanhol, está se tornando quase uma terceira “língua” nas regiões de fronteira com o Paraguai e a Bolívia em Mato Grosso do Sul.
Entretanto, se as semelhanças entre os dois idiomas muitas vezes facilitam, por meio desse “dialeto”, a comunicação dos brasileiros com os vizinhos, em algumas palavras, o significado totalmente diferente, as transforma em verdadeiras pegadinhas.
A campo-grandense Alyne Maia, de 37 anos, que estuda Medicina em uma faculdade na Bolívia conta que já foi vítima de algumas dessas pegadinhas do portunhol. Ela recorda que recentemente ao embarcar em um ônibus boliviano esbarrou em um passageiro e para demonstrar a escusa pela situação disse: “Opa! Desculpa!”. Acontece, que a interjeição no país significa algo como “tonto” e a pessoa se sentiu ofendida. “Eu fui para a Bolívia sem saber nada de espanhol. Fui na sorte”, diz ela.
Além da sorte, Alyne diz que improvisou muito para se comunicar na Bolívia. Para comprar coisas simples como alho, por exemplo, ela pesquisava na internet e mostrava a figura ao vendedor. Mesmo assim era complicado. “A tradução em espanhol de alho é ajo (se pronuncia arro em espanhol), mas quando dizia ‘arro’ recebia arroz porque os bolivianos costumam subtrair o z desta pronúncia”.
A estudante diz que atualmente já consegue entender e se fazer entender no país vizinho. “Agora falar é um pouco mais difícil porque tem a pronúncia, o sotaque e as palavras que são escritas iguais, mas com significado diferente. Complica mais ainda”.
Quem ficou confusa com os falsos cognatos – palavras que tem grafia semelhante nas duas línguas, mas significados diferentes, foi a médica Jenipher Pereira Cordeiro, de 28 anos, na época em que fazia faculdade na Bolívia.
“Asignatura que quer dizer disciplina escolar. Apellido é sobrenome. O pastel de lá é nosso bolo aqui e nosso pastel é empanada no país vizinho. No começo não entendia muito o que os professores falavam porque eles falavam muito rápido, mas depois eu me acostumei, me adaptei. Não demorou muito não, foi rápido, por causa do dia a dia”.
Quem também não entendia muito das aulas é a também médica Lorrayne Silva, de 30 anos. Filha de missionários evangélicos ela deixou Corumbá e foi morar no país vizinho aos 14 anos. “Entrei na 8ª serie lá e era praticamente a única brasileira da escola. Eles não entendiam e a gente também não porque falavam rápido. Ainda têm as gírias que complicavam muito mais”, lembra.
O médico Júlio Brandão, de 29 anos, lembra de algumas confusões que fez com o idioma ao deixar Corumbá para estudar na Bolívia, como pedir “cueca-cuela” em uma conveniência. A pronúncia correta da marca de refrigerante é bem semelhante a do Brasil, a diferença é que o som da letra “o” é mais fechado no país vizinho.
Atualmente, ele diz que consegue entender o idioma e até escrever sem dificuldades, mas confessa que evita falar até o portunhol. “Sempre tive vergonha de falar errado, então acaba que não falo muito. Mas se colocar alguém para falar comigo acredito que consiga porque o conhecimento fica”, diz.
Portunhol do Paraguai
Quem também está adaptada ao idioma e cultura é Vitória Ferreira, de 29 anos. Ela deixou o Pará para estudar Medicina no Paraguai e comenta que é muito difícil encontrar na região de fronteira, entre a cidade sul-mato-grossense de Ponta Porã, e a paraguaia, Pedro Juan Caballero, uma pessoa que fale apenas um idioma.
“Ao mesmo tempo que estão conversado com você em espanhol, misturam o português, misturam o guarani. Mas o portunhol em si é fácil de você aprender e entender o que as pessoas estão falando. Você vai aprendendo com o tempo”, diz Vitória.
O maior perrengue que ela diz ter passado em Pedro Juan Caballero, onde mora. “Fui comprar bolo na padaria esperando realmente receber o alimento. Voltei para casa com uns pães e somente depois entendi que deveria ter pedido sopa de chocolate.”