ContilNet Notícias

“Sou homem e mulher”: jornalista fala sobre ser uma pessoa não-binária no Acre

Por KATIÚSCIA MIRANDA, PARA CONTILNET

“'montação' fala bastante sobre a fluidez que eu descobri que poderia ter enquanto pessoa, em relação ao meu gênero", diz Igor nas redes sociais. Foto reprodução

Voz firme, nem de homem, nem de mulher, mas de pessoa não-binária de personalidade marcante. Conversar com o acreano Igor Martins, ou com a Igor Martins, desde que seja com mente aberta e acima de tudo com respeito, é mergulhar num universo que muito se fala e a cada dia se aprende mais. E como nesta terça-feira (28) é Dia Internacional do Orgulho LGBTQIAP+, vamos conhecer um pouquinho sobre ser uma pessoa não-binária.

Mas já deixando claro que não é para todo mundo ter uma personalidade bem formada e principalmente ter orgulho de si, da construção diária de um ser que é homem, é mulher, e segue feliz sendo quem é. Igor Martins revela em seu discurso um conhecimento interior que interage com o exterior e mesmo sabendo que o tema do não-binarismo é considerado confuso, fala com a maior naturalidade, calma e paciência sobre o assunto.

A sigla LGBTQIAP+ representa as pessoas que de alguma forma não se identificam com a heterossexualidade ou com o conceito de que só existem dois gêneros (masculino e feminino) e dentro do símbolo de mais, encontram-se as pessoas não-binárias.

Igor explicou que dentro desse aspecto de não-binarismo de gênero, existem duas grandes correntes. “Uma delas é a de pessoas de gênero fluido, que se identifica tanto com o gênero masculino quanto com o feminino, que é o meu caso. E nós temos as pessoas agênero, que não se identificam nem com o masculino nem com o feminino, que preferem a neutralidade”, comentou.

Tebetê junino no instagram. Foto: Reprodução

E não foi do dia para a noite que Igor se encaixou nessa definição. “É difícil você se identificar como algo que não tem conhecimento. Há cinco anos, quando me identifiquei como uma pessoa não-binária, se falava muito menos sobre isso”, lembrou.

Ter o gênero fluido, como Igor destaca, preenche o seu ser de um modo inexplicável. Deu para ele a liberdade necessária para exercer sua voz política e artística. Política no sentido mais amplo da palavra, de conhecedor e defensor dos seus direitos e deveres, e artística no sentido mais pleno, atuando como a drag queen Ágata Power.

“Mais um Natal sendo resistência. Se não tem Papai Noel gay, vai ter Merry Christmas drag queen não binárie syyyam!!!”, diz legenda de foto no instagram. Foto: Reprodução

Ser diverso não é misturar personalidades e sentimentos: o discurso é bem organizado dentro da mente de Igor. “É importante ficar claro que o não-binarismo é uma questão de sentimento, é algo interior e muito pessoal. Não se expressa visualmente, por exemplo quando um homem usa barba, maquiagem e brincos”, disse.

Igor citou um exemplo que ele considera ainda mais claro. “Não é porque você é mulher e veste a roupa do seu namorado que você se torna não-binária. O que vai fazer que você seja, o que quer que seja é o que você sente e como se enxerga. Como os outros te vêem, já é uma coisa completamente diferente”, completou.

“Esse é o mais perto da Europa que eu vou poder passar por enquanto”, brinca nas redes sociais. Foto: Reprodução

Igor admite que o assunto é considerado confuso até para pessoas que são do universo LGBTQIAP+, mas ele garante que quando os conceitos são colocados no dia-a-dia, tudo fica mais fácil. “Eu sou Igor Martins e ponto final, mas pode me chamar de a Igor, desde que não seja de forma pejorativa. São duas existências que convivem juntas dentro de um mesmo corpo mas não contemplam 100% do que é o Igor”.

Trabalho e família

Jornalista formado há mais de 10 anos na Universidade Federal do Acre (Ufac) e atualmente servidor público na mesma instituição, Igor Martins considera-se realizado em sua atuação profissional, mas nem sempre foi assim. Ao longo da sua trajetória de estudante escutou de professores que ele não se encaixaria no padrão exigido, que a voz era bonita, mas não condizia com o corpo.

“O acaso me levou pro curso de jornalismo e olha só se já não se vão 12 anos de formação”, revela Igor. Foto: Reprodução

“Alguns professores chegaram a me dizer que eu iria me restringir a escrever textos porque eu não fazia parte de um padrão. E hoje eu trabalho na universidade, lido diante das câmeras em conteúdos para redes sociais e as pessoas convivem com uma pessoa não-binária. Isso é considerado como algo inovador. Meu trabalho sempre me deu essa liberdade, e mesmo que eu tivesse medo, pelo que ouvi no início, a universidade se tornou de fato um ambiente plural”, argumentou.

Em relação à família, Igor falou com toda objetividade. “Minha relação com minha família é razoável, por ‘n’ motivos, mas não é uma relação ruim. E hoje tenho minha autonomia, pago minhas contas e se tinha alguém que achava ruim alguma coisa, ficou no passado. E não somente a família, quem quiser achar ruim, não posso fazer nada porque não é sobre o que as pessoas pensam sobre mim e sim sobre o respeito que elas têm que ter”, finalizou.

Sair da versão mobile