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Leia a íntegra da entrevista de Ciro Gomes ao Jornal Nacional

Por UOL

Foto: divulgação

Ciro Gomes (PDT) foi o segundo presidenciável entrevistado pelo Jornal Nacional, da TV Globo, nesta semana. Em conversa amistosa com William Bonner e Renata Vasconcellos, nesta terça-feira (23), Ciro abriu a sabatina falando sobre a fome e o desemprego no Brasil. Ele citou seu programa de renda básica.

O concorrente ao Palácio do Planalto defendeu a necessidade de plebiscitos e disse que o modelo atual do governo brasileiro é uma “certeza para a crise eterna”. Também atacou o PT, alegando que o partido replica modelo “trágico” da Venezuela no Brasil. As emergências climáticas também foram assunto na entrevista, assim como a federalização da segurança pública.

Leia aqui a íntegra da sabatina com Ciro Gomes no Jornal Nacional:

[Renata Vasconcellos]: Olá, boa noite. Nós estamos entrevistando nesta semana os candidatos à presidência mais bem colocados na pesquisa Datafolha de intenção de voto divulgada no dia 28 de julho. Pela ordem determinada em sorteio, com a presença dos assessores dos partidos, Ciro Gomes, do PDT, é o entrevistado de hoje. Na quinta-feira será Luís Inácio Lula da Silva, do PT; e, na sexta, Simone Tebet, do MDB. O candidato à reeleição, Jair Bolsonaro, do PL, foi o entrevistado de ontem.

[William Bonner]: Em 40 minutos, nós vamos abordar os temas que marcam essas candidaturas, e o candidato vai ter ainda um minuto para as considerações finais. Candidato Ciro Gomes, boa noite.

[Ciro Gomes]: Boa noite, Bonner. Boa noite, Renata.

[Renata Vasconcellos]: Boa noite.

[Ciro Gomes]: Boa noite a todos.

[William Bonner]: Obrigado por ter vindo.

[Ciro Gomes]: Agradeço o privilégio de estar aqui.

[Renata Vasconcellos]: Obrigada pela sua presença, e o seu tempo começa a contar a partir de agora. A defesa da democracia e o apaziguamento do país têm sido temas centrais nessas eleições. O senhor mesmo tem criticado o clima de polarização entre os candidatos que estão à frente nas pesquisas, mas o senhor tem se referido a eles em termos bastante duros, diria até, em alguns casos, ofensivos. É com esse discurso que o senhor pretende unir o país?

[Ciro Gomes]: Eu pretendo unir o Brasil através de um projeto, e esse projeto tem um diagnóstico. Eu acho que o Brasil vive hoje a mais grave crise se nós tomarmos em atenção os números do desemprego, da fome. Fome, fome, 33 milhões de pessoas estão com fome; 120 não fizeram as três refeições hoje. E há pessoas e grupos políticos responsáveis por essa tragédia; e eu acho, francamente, que a maior ameaça à democracia é o fracasso dela na vida do povo; mas eu vou me esforçar para unir o Brasil. Unir o Brasil, reconciliar o Brasil, o que não me parece haver contradição.

[Renata Vasconcellos]: Esse é um tema que não é banal, é um tema extremamente importante pelo nível de polarização que nós temos enfrentado, e é importante atentar como o governante, o eventual governante, vai lidar com o contraditório, eventuais adversários, e volto a insistir na pergunta: o senhor tem se referido aos principais? aos candidatos que estão à frente nas pesquisas com termos bastante duros, eu volto a lhe fazer a pergunta, com esse discurso, ele não agrava esse clima de polarização?

[Ciro Gomes]: Eu talvez deva levar em consideração a sua pergunta, mas repare, a corrupção é praticada por pessoas, e o desastre econômico, o privilégio que faz com que o Brasil tenha cinco pessoas acumulando a venda de cem milhões de nacionais brasileiros mais pobres de classe média é responsabilidade de pessoas e de grupos. Elas têm que ser apontadas, indicadas ou responsabilizadas, mas não olhando para trás, olhando para frente, porque a ciência da insanidade, dizia o Einstein, o maior cérebro da idade moderna, é você repetir as mesmas coisas e esperar resultados diferentes. Estou tentando mostrar ao povo brasileiro que essa polarização odienta, que eu não ajudei a construir, pelo contrário, eu estava lá, em 18, tentando advertir que as pessoas não podiam usar, vamos dizer, a promessa enganosa do Bolsonaro para repudiar a corrupção generalizada e o colapso econômico gravíssimo que foram produzidos pelo PT. Isso aconteceu no Brasil. E agora está se tentando repetir uma espécie de 2018, portanto, a gente tem que denunciar isso, compreendendo, respeitando, vou levar em consideração as suas ponderações, mas nós temos que ser duros, sabe? A corrupção é um flagelo no Brasil.

[Renata Vasconcellos]: Estou me referindo especificamente aos termos usados. Acho importante lembrar que hoje esses adversários têm juntos 79% das intenções de voto, então, o senhor está dizendo aqui que reavalia esse discurso?

[Ciro Gomes]: Devo sempre reavaliar. Eu faço esse esforço de humildade permanentemente. Minha tarefa é reconciliar o Brasil. Deixa eu explicar aqui: o Brasil tem hoje, como eu lhe falei, pessoas que estão passando fome em uma conta de metade da população, e eu tenho um programa, um programa de renda mínima, com status constitucional, que vai entrar como uma ferramenta da Previdência Social, ou seja, para nos proteger das manipulações de véspera de eleição. Para que eu viabilize isso, eu tenho que confrontar aqueles que mandaram no Brasil durante esses anos todos. E às vezes, sim, eu tenho? eu venho de uma tradição, vamos dizer, do Nordeste, a nossa cultura política é palavrosa, digamos assim, às vezes, no Sul, no Sudeste, as pessoas não entendem bem. Não me custa nada rever certos temas, especialmente na proporção em que meu sonho é reconciliar o Brasil.

[William Bonner]: O senhor trouxe à baila agora a economia, o senhor falou do programa de renda mínima, né? O governo atual aumentou o Auxílio Brasil para 600 reais só até dezembro. Esses 200 reais a mais, só até dezembro, vão custar 26 bilhões de reais. O senhor mencionou, o senhor tem aí um plano de garantir uma renda mínima de mil reais para todas as famílias brasileiras de baixa renda, e em caráter permanente. Como, candidato?

[Ciro Gomes]: Essa é uma boa pergunta, porque eu peço às pessoas para me darem a oportunidade de numa… CiroTV.com.br, ela vai estar no ar, competindo com a Rede Globo, a partir de sábado. Brincadeira. Mas eu quero explicar ali. Mas você me dá a oportunidade. Veja, o que eu estou propondo é uma perna de um novo modelo previdenciário. Então, eu vou pegar o BPC —Benefício de Prestação Continuada—, a aposentadoria rural de muitos brasileiros que ainda remanescem, que não contribuíram no passado, o Seguro Desemprego, e pegar todos os programas de transferência, especialmente o novo Bolsa Família, que é o Auxílio Brasil, transformar num direito previdenciário constitucional, ou seja, ninguém mais vai depender de político A, político B, eleição A, como está acontecendo, ameaças e tentativas de manipular o sofrimento mais humilhado do nosso povo, das mães de família que estão vendo seus filhos dormir hoje com fome, isso me dói o tempo todo. Essa é minha história de vida. E essa consolidação dá 290 bilhões de reais.

[William Bonner]: Essa conta fecha, candidato?

[Ciro Gomes]: Fecha. Por que eu vou agregar para fechar os 290 bilhões dos recursos que já existem, eu vou agregar um tributo sobre grandes fortunas apenas e tão somente sobre os patrimônios superiores a 20 milhões de reais. Entenda bem, só 58 mil brasileiros têm um patrimônio superior a 28 milhões de reais (sic), 20 milhões de reais. Quer dizer o seguinte: cada super-rico no Brasil vai ajudar a financiar com 50 centavos apenas de cada 100 reais da sua fortuna a sobrevivência digna de 821 mil brasileiros abaixo da linha da pobreza, ou seja, aqueles domicílios que as pessoas ganham 417 reais, ou menos, por cabeça, por mês.

[William Bonner]: O seu plano de governo, além dessa proposta de garantia e renda mínima, prevê ainda também reformas, né? Tem reforma tributária, tem reforma fiscal. E esse tipo de assunto precisa ser resolvido com o apoio do Congresso Nacional. O que nos leva a questão do isolamento. O senhor tem 40 anos de vida pública, o senhor foi prefeito, foi governador, foi deputado, ministro de estado. O senhor hoje disputa a presidência da República pela quarta vez. E, no entanto, o seu partido, o PDT, não conseguiu formar alianças nessa eleição. É fato, a candidatura Ciro Gomes pelo PDT é uma candidatura como se diz “puro-sangue”, uma chapa sem alianças. Como é que o senhor pretende formar maioria no Congresso para a aprovação das suas propostas?

[Ciro Gomes]: Eu proponho mudar o modelo econômico, que é uma tarefa profundamente complexa e difícil, e eu pretendo mudar também o modelo de governança política, pedindo às pessoas para pensarem juntas comigo. O Brasil se redemocratizou, se nós tomarmos eleições diretas para presidente, em 89. O Collor governou com esse modelo e foi cassado. O Fernando Henrique Cardoso e o PSDB nunca mais ganharam uma eleição nacional governando com esse modelo. O Lula foi parar na cadeia governando com esse modelo.

[William Bonner]: A que modelo o senhor se refere, especificamente?

[Ciro Gomes]: O que se convencionou chamar de presidencialismo de coalizão, na expressão elegante do Fernando Henrique, ou nessa adesão vexaminosa e corrupta ao Centrão. Mas a questão básica para explicar, então, se a gente não chegar à conclusão, Bonner, Renata, de que este modelo é a certeza de uma crise eterna, Lula para a cadeia, Dilma cassada, Collor cassado, Fernando Henrique e o PSDB nunca mais disputaram eleição nacional e Collor cassado, e o Bolsonaro desmoralizado agora. Então veja, qual é a minha proposta? A minha proposta é transformar a minha eleição, isso é muito importante para a dona de casa que está nos ouvindo, para o cidadão brasileiro, transformar a minha eleição não em um voto pessoal, mas num plebiscito programático. Eu vou tentar forçar a mão em todas as ocasiões que eu tiver oportunidade. Mais uma vez agradeço a vocês, aos senhores, estão me chamando de “senhor”, estar aqui, para que a gente discuta ideias, por quê? Com isso eu celebro uma nova cumplicidade com o povo brasileiro. Isso diminui muito a distância entre o presidente que quer reformar o país, como eu quero, e um Congresso que tende a ser reativo naturalmente porque é filigrana. Deixa eu só completar, são mais três argumentos breves. O primeiro, propor as ideias e não “o deixa que eu chuto” que tem sido a característica do populismo de lado a lado, de direita e de esquerda. Propondo os seis primeiros meses, é uma hora mágica. Se o Fernando Henrique propõe ali, na sequência do Real, eu estava lá, está aqui as reformas… o real não vai sobreviver, tinha passado tudo. Não propuseram nada. O Lula não propôs nada, perderam àquela hora mágica. Terceiro, aí está a chave de inteligência de como é que eu tiro o Brasil dessa crise eterna. Negociar. Quem quer que o povo eleja, e eu peço que elejam deputados do PDT, eles começam com número 12, então é tradição no Brasil que o presidente elege; uma vez eleito, ele elege com ele 50, 10% do Congresso. Todos eles só elegem isso. Termino. Então, propor a ideia, propor nos seis primeiros meses e ampliar a negociação com governadores e prefeitos, estabelecer um pacto novo, libertando a falência dos estados e municípios, eu tenho os números todos, são 600 bilhões de reais de dívida que estão levando 15% da receita dos estados e municípios para Brasília. Eu reestruturo essa dívida, reforço o caminho do investimento dos estados e municípios, e os governadores e prefeitos vêm para a mediação. Ponto, acabou, persistiu o impasse nesse ou naquele ponto, chama o povo para votar diretamente através de plebiscitos.

[William Bonner]: Vamos falar de plebiscito daqui a pouco, mas o que chama atenção, candidato…

[Ciro Gomes]: Isso é um projeto.

[William Bonner]: É porque, em diversas eleições, nós já vimos candidatos apostarem muitos nesses seis meses mágicos, né? Tem uma lua de mel, como se chama na política. Muitas vezes, os candidatos apostam no capital político de uma vitória nas urnas para imaginar que, ao longo dos seis meses, terão a seu lado não apenas os eleitores, mas uma facilidade maior para, como o senhor acabou de dizer, convencer governadores recém-eleitos a formarem essa força de mudança, digamos assim. No entanto, não é o que se tem visto na prática. O senhor tem uma receita para que isso aconteça sem repetir o fracasso de tentativas anteriores nesse sentido que o senhor mesmo mencionou?

[Ciro Gomes]: A receita eu lhe repito: é tentar transformar a minha eleição numa eleição de ideias. Então você fala “isolamento”. O Bivar, que é presidente do União Brasil, jantamos juntos, me pediram para deixar a porta aberta até o último dia e, no fim, foi honesto, disse: “Olha, o problema do Ciro não é a pessoa dele, que nós queremos bem, gostamos e queremos, são as ideias dele”. E é basicamente isso. A gente tem que entender que eu represento uma espécie de movimento abolicionista num sistema escravista. Você não vai esperar que o escravista ajude o abolicionista. E é basicamente o que eu estou tentando fazer. Mas deixa eu lhe fazer: se nós puxarmos a história brasileira recente, nenhum presidente de verdade tinha concepção para mudar o Brasil. Qual foi a proposta que foi feita pelo mágico momento que nós elegemos o Fernando Henrique com o real? Não teve, o primeiro ano se transcorreu in albis, como a gente diz no direito, ou seja, em branco, não é? Propôs mudar só o conceito de empresa nacional de capital nacional. Qual foi a concepção estratégica do Lula? Todos se prostraram a um modelo econômico que produz desigualdade, desemprego, informalidade, e a mais grave da história do Brasil, e destruição dos serviços públicos. A infraestrutura do Brasil está caindo aos pedaços.

[Renata Vasconcellos]: Então aproveitando esse nosso debate sobre governança, modelo de governança, o senhor citou a ferramenta do plebiscito e já disse em outras ocasiões: tem impasse, se houver impasse, plebiscito. Mas o que a história tem mostrado é que os plebiscitos têm sido usados por líderes populistas, especialmente na América Latina, como um instrumento para esvaziar o congresso, o poder legislativo, criando crises institucionais graves. Esse tipo de democracia, digamos, democracia direta, pode pôr em cheque a nossa democracia representativa. Como é que o senhor pode evitar isso?

[Ciro Gomes]: Olhando mais para a Europa, Estados Unidos, do que para a Venezuela. Eu acho o regime da Venezuela abominável, então, assim, é muito clara a minha distinção com esse populismo sul-americano que infelizmente o PT replica aqui. Ortega, na Nicarágua, acho tudo isso trágico. Qual é a questão aqui? É um modelo, é uma tentativa de libertar o Brasil de uma crise que corrompeu organicamente a Presidência da República, transformou a Presidência da República numa espécie de esconderijo do pacto de corrupção e fisiologia do Brasil. Nós chegamos ao limite da emenda do relator, que é um negócio que formalizou. Eu vi ontem aqui o cidadão falando que não tem corrupção. A corrupção no Brasil está se institucionalizando pelo despudor com que se manipula os dinheiros públicos no Brasil hoje. Então, qual é a minha ideia? Primeiro, fazer com que a eleição seja um plebiscito programático. Isso faz uma diferença importante na tradição brasileira. Por exemplo, quando nós fomos com o Fernando Henrique na eleição, era o real que estava em debate, não era a personalidade do Fernando Henrique. Isso dá uma força mágica. O tempo da reforma é a qualidade da reforma que diz, mas repare: o mais importante talvez seja alargar a negociação, estabelecer uma mediação com os governadores e prefeitos, que são as forças políticas — e eu tenho muita experiência — que têm prevalência sobre os grupos de pressão e os lobbies, a corrupção e a fisiologia. Eu tenho como fazer com que os governadores e prefeitos se envolvam nesse redesenho porque eu vou libertar 15% da receita de São Paulo, do Rio de Janeiro, de Minas Gerais, do Rio Grande do Sul, que estão falidos, pegando liminar para não pagar dívida, eu vou fazer o quê? Vou reestruturar isso, esses 15% vão ficar na mão dos governadores, nós vamos combinar um grande projeto de investimento por onde vou dizer de onde virão cinco milhões de empregos nos dois primeiros anos, que é um dos elementos centrais, também, do meu projeto, que eu peço atenção das pessoas para especializar como é que eu vou fazer lá, e aí eu vou conseguir uma mediação generosa. Persistindo o impasse, Renata, é o Congresso que interessa chamar a população para deslindar esse impasse. Por exemplo, imposto sobre grande fortuna. 58 mil brasileiros em 212 milhões de pessoas são muito poderosas, dão as cartas, sabe? Controlam os elementos da política centrais e tal, eles vão ser contra isso. Ainda ontem tive uma discussão fraterna com um amigo velho querido, que é contra, hostil demais com isso, que é o presidente do Grupo Guararapes, meu amigo, o Flávio Rocha. Disseram que era bate-boca; não é bate-boca, é uma questão de modelo. E eu não estou querendo cobrar nada, mas veja, essas pessoas vão dizer: “Não, isso é ruim, isso vai fazer fuga de capital”. Eu vou dizer: não. Se a alíquota fosse alta, sim, mas eu vou fazer uma alíquota moderada, calibrada com o IOF da remessa de lucro para, da remessa de dinheiro para o estrangeiro, de maneira que fica 50 centavos em cada 100 reais e cada super-rico vai pagar a vida digna, com mil reais por domicílio, de 821 brasileiros mais pobres. Isso é sério. E aí vamos ver: o Congresso persiste o impasse? Vamos pedir ao povo que vote.

[Renata Vasconcellos]: O senhor está contando que o Congresso aderirá, mas se o Congresso se opor a essa estratégia, a crise está instalada, não é?

[Ciro Gomes]: Não, eu vou energizar a política brasileira. Por que a crise brasileira está instalada e tem 30 anos. Deixa eu lhe dar aqui alguns rápidos e breves números de quem acompanha a vida nacional, e deu-se ao povo brasileiro por paixão e amor a vida inteira. O Brasil tinha 34% da sua riqueza tirada da indústria, que paga os melhores salários, que dá os melhores empregos. Hoje está com menos de 10%. Destruíram a indústria nacional brasileira. A tradição do desemprego no Brasil é 4%, 5%. Nós batemos em 12 e estamos aí na faixa de 10%. A informalidade está mandando para a velhice? Minha irmã, deixa eu lhe dizer, perdoa aqui a expressão, mas é uma irmandade, uma fraternidade que eu estou pedindo. Nós estamos mandando para a velhice, daqui 15 anos, 50 milhões de brasileiros que não terão nenhuma cobertura previdenciária. Só eu estou preocupado com isso? Não é possível! A política não pode ser reduzida a essa coisa odienta, de: “O Bolsonaro é um protesto contra a corrupção e a crise econômica que o PT produziu”. Agora a frustração com o Bolsonaro, a gente vai voltar ao passado? O Brasil não aguenta mais isso.

[William Bonner]: Candidato, além do capital político obtido com uma vitória expressiva nas urnas, além do apoio de governadores que o senhor descreveu aqui, além de uma união nacional em torno de uma ideia de que o senhor venda, ao longo da campanha, o senhor chegou a mencionar, também mais de uma vez, que o senhor pretendia assumir um compromisso com o eleitor brasileiro de não concorrer à reeleição. Não terá sido o primeiro político a prometer isso, mas a questão que se apresenta é a seguinte: de que maneira um compromisso desse de: “Olha, não vou concorrer à eleição”, poderia ajudá-lo a formar maioria no Congresso, como o senhor chegou a replicar em alguns momentos da sua campanha?

[Ciro Gomes]: Reafirmo aqui solenemente, pode me cobrar.

[William Bonner]: Por que o senhor não tinha dito hoje isso.

[Ciro Gomes]: Mas é porque você me interrompeu, e eu estava sendo extenso, porque são quatro providências e um gesto.

[William Bonner]: Ah, tá.

[Ciro Gomes]: Então, as quatro providências são: Plebiscito programático, seis meses, renegociação com a mediação de governadores e prefeito, plebiscito para os impasses, e tão somente para eles. O gesto: abrir mão da reeleição a partir de agora.

[William Bonner]: Mas então, por que abrir mão da reeleição significaria, para o senhor, facilitar suas relações com o Congresso Nacional?

[Ciro Gomes]: Por que o que destruiu a governança política brasileira, nesse modelo que eu estou lhe falando, é a reeleição. O presidente se coloca infenso, com medo dos conflitos, porque quer agradar todo mundo para fazer a reeleição. O presidente se vende a esses grupos picaretas da política brasileira, desculpe a expressão, eu tenho, a pedido da Renata, trocar um pouco as expressões, mas esses grupos de pouco escrúpulo republicano – também tem essas expressões – porque têm medo de CPI e porque querem se reeleger. Eu tenho outra relação com a questão moral, eu me garanto, eu não sou corrupto, eu resolvi fazer uma vida republicana, então, eu não tenho medo de CPI, pelo contrário. Em um governo como o meu, CPI vai me ajudar, porque se eu não roubo, não vou deixar ninguém roubar. Quem denunciar corrupção no meu governo estará cooperando comigo. E abrindo mão da reeleição, eu vou estar cuidando só de fazer a reforma que o país precisa. Veja, essa é a minha história.

[William Bonner]: A minha visão…

[Ciro Gomes]: Deixa eu só completar. Por que, assim, a minha história, eu fui governador do Ceará, o mais popular governador do Brasil, nunca mais voltei.

[William Bonner]: A minha questão é: uma vez colocado como não candidato à reeleição, o senhor diz assim: “Eu estou eleito e eu vou fazer um mandato só. Eu vou ficar quatro anos na presidência”. O senhor diz que com isso o congresso vai olhar para o senhor e de uma forma menos belicosa ou com maior boa vontade na aprovação dos seus projetos?

[Ciro Gomes]: Isto ajuda muito, acredite. Com a experiência que eu tenho, ajuda muito. Mas deixe eu lhe dizer: eu vou negociar. Deixe eu dizer de novo: elejam deputados que tenham compromisso comigo, não necessariamente só do PDT, que tenham compromisso com esse conjunto de ideias, porque quem você eleger – desculpe eu me dirigir para as pessoas -, quem você eleger, é com esses que eu sou democraticamente obrigado a negociar. A minha diferença é que o Bolsonaro, por exemplo, denunciou isso e fez o oposto do que denunciou. A minha diferença é que o PT fez o tempo inteiro a denúncia da corrupção dos outros, e, depois, negociou exatamente nas mesmas bases. Eu estou anunciando humildemente que quem quer que o povo eleja, é com eles que eu vou negociar. O que eu prometo? Negociar em cima da mesa, sem o toma lá dá cá e sem a roubalheira, porque eu vou substituir esse aliciamento por uma aliança do novo pacto das finanças estaduais e municipais: prefeitos e governadores; e tem um fusível: persistiu o impasse, somente naquele ponto onde o impasse persistir, por maioria simples, que eu monto entre a eleição e a posse, isso é relativamente simples, eu peço a autorização do Congresso para fazer um plebiscito popular.

[William Bonner]: Aí o senhor é eleito, o senhor consegue convencer o Congresso Nacional de que não vai concorrer a uma reeleição, e aí, digamos que o senhor consiga com isso fazer uma administração exitosa. Ao fim de um mandato exitoso, é muito natural que um Presidente da República se converta em um eleitor poderoso do seu sucessor.

[William Bonner]: No eleitor poderoso do seu sucessor, o senhor não contrai com a oposição no Congresso o mesmo problema daquele presidente que vai disputar a reeleição? No fim das contas, se o senhor vai fazer o seu sucessor, muda muito a história para quem está no Congresso, na oposição.

[Ciro Gomes]: Sim e não. Mas, veja, a chave aqui é que naquela reeleição o povo estará sendo induzido voluntariamente a votar no projeto que começou a produzir resultados positivos. É o que eu sonho para o Brasil. O país está bombando, crescendo a 5% ao ano. O meu projeto, Bonner, não sei se é impertinente eu mostrar, ele está escrito, é um livro que já vendeu mais de 200 mil exemplares. Eu peço para quem puder, tem gente de graça já na internet, ele está explicado. Eu não estou dizendo que é fácil, eu estou tentando sair dos impasses que acertam para o Brasil a maior crise econômica da história e a maior crise política que não tem fim. São 11 anos sem crescer, 27 milhões de brasileiros nasceram no nosso país, o país crescendo 0,26%, ¼ de 1%. Sabe, com perversões absolutamente graves na concentração de renda, na miséria, na violência, nas doenças. No Brasil, Bonner, eu vi ontem o cidadão aqui, eu vou atender ao apelo da Renata, o senhor Presidente da República dizendo aqui. Mas, veja bem, o Brasil, meu irmão, tem 3% da população do mundo. E no Brasil morreram 11 de cada 100 pessoas que morreram no mundo na pandemia. Qual é a explicação? Foi o comportamento genocida, que é uma palavra ruim, dura, mas foi o comportamento anti ciência, foi o adiamento eterno por politicagem barata com a questão das vacinas, numa briga vil, dizendo: “ah, em janeiro nós vacinamos”, nós vacinamos porque o governador de São Paulo transformou isso na sua principal ferramenta, faço uma homenagem aqui ao João Dória. Que, aliás, eu sobrevivo aqui porque grandes brasileiros claudicaram do caminho da pré-campanha. Eu estou aqui. Por quê? Porque é grande a massa de brasileiros, e eu espero estar falando com eles hoje, sabe, estão votando no Lula porque querem se livrar do Bolsonaro, e esqueceram que amanhã tem o Brasil para governar. Uma grande massa de brasileiros que é frustrada pela enganação do Bolsonaro, mas não quer voltar ao Lula e ao PT. Sabe, a gente não precisa aceitar isso. Por que a gente não usa a sabedoria dos dois turnos? Eu estou pedindo para mim uma oportunidade de aclarar as ideias, o Brasil tem saída.

[Renata Vasconcellos]: Agora, candidato, falando nesse seu plano de governo que o senhor tem, que o senhor citou aqui, mas sobre… o senhor vai precisar do apoio do Congresso, e a gente pode lembrar que o PDT não conseguiu votar coisas importantes, como a PEC dos Precatórios, votar unido nessas questões importantes, né? Isso é um fato importante que tem que ser colocado.

[Ciro Gomes]: É importantíssimo. Eu, por exemplo, a única vez na vida que eu falei na palavra “renunciar”, “desistir”, foi naquela noite. Depois eu até entendi que foi um grande mal-entendido. A bancada achava o seguinte: que se votasse contra era irrelevante porque ia passar por esmagadora maioria, aí tentaram atenuar os danos, mitigar, que é o papel de uma bancada pequena numa onda de 300 deputados…

[Renata Vasconcellos]: Por que não houve união do seu próprio partido?

[Ciro Gomes]: Por que foi de madrugada. Então, eu estava explicando isso. Na madrugada, eles… dormindo, nos entendimentos, o Lira, o presidente Lira disse para eles: Ó, nós temos 340 votos, mas nós queremos fazer por consenso, então se vocês votarem junto para fazer o consenso, nós vamos entregar aqui a proteção aos professores, vamos tirar o precatório dos professores dessa restrição imoral. E eles de boa-fé acreditaram. E consultaram o meu irmão. E ao consultar o meu irmão, que é senador, eles imaginaram que estavam me consultando, foi um curto-circuito.

[Renata Vasconcellos]: E ameaçar deixar o partido…

[Ciro Gomes]: Não, deixar o partido, não. Deixar a candidatura.

[Renata Vasconcellos]: Deixar a candidatura, o senhor acha que foi a melhor estratégia?

[Ciro Gomes]: Foi o sinal de a quem eu sirvo. O meu senhor, eu tenho muita honra de estar no partido que mais construiu para a vida do brasileiro, é o PDT, é o trabalhismo, a corrente mais fecunda da história do Brasil, eu estou muito feliz de estar aqui, e eu espero morrer aqui, eu que tive uma vida partidária relativamente trágica por contradição dos partidos que ajudei inclusive a criar. Mas acima do meu partido está a minha vassalagem ao povo brasileiro.

[William Bonner]: Vamos falar, candidato, então, agora de meio ambiente. Um tema importantíssimo, né? A crise climática é um tema que se impõe a todo o planeta nesse momento. E no momento em que o Brasil vive aí um recorde de desmatamento, são três anos consecutivos, né? Só que o Brasil tem um compromisso com o mundo de acabar com o desmatamento ilegal até 2028. O senhor tem dito que vai resolver essa situação do desmatamento no Brasil. O senhor usa até uma expressão em inglês [fala em inglês], traduzindo meio assim seria algo como…

[Ciro Gomes]: Fazer a lei pegar.

[William Bonner]: Vai fazer a lei pegar…

[Ciro Gomes]: Por que, no Brasil, essa lei pegou, essa lei não pegou.

[William Bonner]: Muitas vezes, uma lei pega, às vezes não pega. É fato.

[Ciro Gomes]: Só entre nós.

[William Bonner]: Fazer a lei ser cumprida, fazer a lei pegar. Isso basta, candidato?

[Ciro Gomes]: Primeiro, antes de mais nada, e, portanto, não basta, primeiro é preciso entender que o Brasil perdeu o senhorio sobre o seu território. Nós mandamos —basicamente— e são filhos, ou eles mesmos que estão lá — 40 milhões de brasileiros migraram do Sul, do Nordeste para integrar, para não entregar, a Amazônia. E sabe qual era a condição que o INCRA impunha ao amazônida, ao brasileiro que foi trabalhar e produzir na Amazônia? Mostrar que desmatou. Se ele não mostrasse que desmatou, o INCRA não dava o papel da terra. De repente, em um período de meia geração, isso vira crime hediondo; os nossos irmãos de lá não entendem.

[Renata Vasconcellos]: Então como mudar essa cultura?

[Ciro Gomes]: É isso que está a chave: não podemos imaginar que só repressão resolve. Nós temos que fazer, primeiro, uma base de desenvolvimento sustentável, que está na boca de muita gente, e que não aterriza no território. Então, o que é o território? Zoneamento econômico-ecológico, estabelecer, no mapa, um georreferenciamento com satélite, “aqui pode, aqui não pode”, “aqui pode, aqui não pode”; pegar as unidades de conservação, as terras indígenas, os biomas mais sensíveis, que não é só Amazônia; Mata Atlântica, que está até se recuperando um pouquinho, a Caatinga está em extinção, o Pantanal está sofrendo como nunca sofreu também; às vezes a Amazônia chama muita atenção do mundo, mas esses outros biomas brasileiros estão sofrendo do mesmo estresse. Então, “aqui pode, aqui não pode”. A partir disso nós temos que fazer um grande esforço de retreinamento, de diversificação da atividade produtiva. Por que o nosso povo? O nosso povo só sabe desmatar, pega a madeira-de-lei sensível, corta e ganha dois mil dólares por um metro cúbico, dois metros cúbicos de mogno. Ele não entende como é que vai passar fome, com o filho dele com fome ou tendo que ir embora, com aquela árvore ali podendo dar dois mil dólares com contrabando absolutamente grave. Nós precisamos fazer, então, um grande trabalho de reconversão da lógica produtiva, proteger Manaus, que está sendo assediada para ser destruída por conta de uma política malsinada de mudança de IPI do Bolsonaro. Ali vem 8% da produção industrial brasileira. Mas fazer com que a economia rural aprenda — aí é com financiamento, capacitação gerencial, acesso a mercado, marketing, sabe? Apoio ao comércio exterior —, aprenda que a floresta vale muito mais em pé do que derrubada. Biotecnologia, uma nova farmácia, biomassa, sabe? Uma série de coisas que você— com a floresta em pé, e aí reflorestamento. Áreas do Pará, por exemplo, o Pará já é praticamente todo desflorestado. Todo é um exagero, mas parte importante do Pará é desflorestado. É preciso que a gente tenha clareza. Se nós fizermos zoneamento econômico-ecológico, existe uma essência que o deputado Giovanni Queiroz, que foi secretário de cultura — um abraço para ele e toda a gente querida do Pará — e do Emílio Goeldi, que me ajuda a pensar essas coisas, não é? O IMPA, que me ajuda a pensar essas coisas da Amazônia, essa teca — teca, que é uma madeira que vale mais do que o mogno —, então vamos ajudar a acontecer essas alternativas, aí sim, se você dá uma alternativa para produzir em bases sustentáveis, a repressão, o enforcement vale para o verdadeiro marginal. Vamos lá: aquele pedaço— Só uma informação telegráfica…

[William Bonner]: É que seriam quatro anos de mandato para fazer um projeto?

[Ciro Gomes]: A minha tarefa é projetar o Brasil para os próximos 30 anos. Essa é que é a essência do projeto. Eu quero transformar o Brasil, para as pessoas terem como acompanhar, num Portugal sob o ponto de vista de indicadores sociais e econômicos: qualidade de vida, matrícula, maternidade materna infantil, atenção à velhice, que é uma tendência grave. Então, Portugal tem o seguinte padrão; o Brasil está em um padrão muito atrás. Eu quero, em 30 anos, que o Brasil vire um Portugal como qualidade de vida, e a minha etapa são os primeiros quatro anos.

[William Bonner]: Candidato, está ok, mas a nossa pergunta era sobre o meio ambiente, eu vou lhe trazer de volta para isso por quê? Nós temos uma questão urgente. Como eu disse na pergunta, em 2028, o Brasil tem que eliminar o desmatamento ilegal. E o senhor tem se referido ao enforcement, fazer a lei pegar. Eu lhe pergunto: o arcabouço legal da área ambiental no Brasil lhe parece suficiente, adequado para fazer com que o Brasil, com esta urgência que temos — e não em 30 anos, com esta urgência —, cumpra essas metas de acordos assinados, firmados internacionalmente? O senhor mudaria, o senhor tentaria encaminhar mudanças de legislação e tem já algumas ideias nesse sentido?

[Ciro Gomes]: Tomar o pulso do controle do território brasileiro é no primeiro dia de um governo meu. Assim, restaurar a autoridade. Eu estou lhe dizendo: eu conheço ali Alto Solimões, Cabeça do Cachorro, ali é território sem dono, quem manda ali é uma holding do crime. Eu denunciei isso porque eu sei o que está acontecendo no território brasileiro. Eu fui processado pelo atual Ministro da Defesa do Bolsonaro porque eu disse que tal extenso domínio pelo narcotráfico, pelo contrabando de arma, pela caça e pesca ilegais, pelo desflorestamento ilegal é um processo de uma holding do crime de lavagem de dinheiro e não aconteceria, com tal extensão, sem a conivência ou a omissão das Forças Armadas. O problema é que nós destruímos a estrutura de comando e controle no território, Bonner. Então, assim, em princípio, a legislação deve estar sempre permeável para ser melhorada, e eu quero fazer isso permanentemente em audiência das cabeças ali da Amazônia: Emílio Goeldi, IMPA; há um estudo acumulado para a gente sair do eixo São Paulo-Rio-Brasília, que, muitas vezes, idealiza uma coisa que não tem aderência lá. Mas, olha, sabe onde é que estão desflorestando? Unidade de conservação. Sabe onde é que estão invadindo? Reservas indígenas já pactuadas. Sabe onde é que estão destruindo coisa de recursos hídricos, nascentes etc. etc.? Em áreas que já estão protegidas pelo Código Florestal. Ou seja?

[Renata Vasconcellos]: Candidato, o seu…

[Ciro Gomes]: Neste caso, falta mesmo é uma mão firme, e a algema vai voltar a funcionar no primeiro dia do governo, disso ninguém duvide.

[Renata Vasconcellos]: Agora, seu plano de governo não trata especificamente de um plano específico para tratar de emergências climáticas, catástrofes naturais, enchentes. Por exemplo, 457 brasileiros já morreram por causa da chuva. Qual é o seu plano para coordenar ações junto ao Governo Federal, estados e municípios, nesse sentido?

[Ciro Gomes]: Nós vamos mapear. Está, sim, no meu plano. Eu já, inclusive, chefiei a Defesa Civil e já fiz, pioneiramente, algumas iniciativas nessa área. Nós já meio que sabemos, Petrópolis, encosta de Salvador, que está diminuindo muito graças ao grande governo que o ACM Neto fez lá, como prefeito, mas a gente já sabe, Recife todo ano. Fortaleza não tem mais, por quê? Porque nós mapeamos, ao longo de muitos anos atrás, todas as áreas de risco e passamos a atuar contínua e planejadamente [sic] com orçamentos fixos, com estratégias, e o Brasil não tem mais nada disso. Então, eu assumo claramente o compromisso disso: mapear as áreas de risco do Brasil. Por quê? Por que os cinco milhões de empregos que eu pretendo germinar, fundamentalmente são obras paradas, 14 mil obras paradas, e fundamentalmente subir o morro, entrar na favela, entrar na palafita com reurbanização, drenagem, macrodrenagem, micro drenagem, contenção de encostas e reforma de moradia popular, saneamento básico. Isso daqui é o que gerará os tais cinco milhões de empregos em dois anos, que estão bastante bem mapeados. Ao lado de um esforço, que é estratégico, de transformar a educação pública do Brasil em uma das dez melhores do mundo em quinze anos.

[William Bonner]: O senhor é a favor do saneamento básico com a participação da iniciativa privada. O senhor já se manifestou assim.

[Ciro Gomes]: Sim. É preciso? Deixa só pontuar. É preciso que a responsabilidade por garantir a harmonia do sistema de saneamento e abastecimento d’água seja do Estado, mas a execução disso, o Estado pode perfeitamente delegar, se for possível.

[William Bonner]: Mas a pergunta que lhe faço, é porque o seu partido, o PDT, foi contra o marco legal do saneamento, foi ao Supremo contra o marco legal, e isso me ocorre a pergunta: não poderia criar alguma desconfiança, algum temor de uma insegurança jurídica das empresas privadas no momento de um governo Ciro Gomes, entrarem para sanar esse problema, essa dívida que o Brasil tem em relação a saneamento básico no Brasil? São cem milhões de pessoas sem esgoto no país.

[Ciro Gomes]: Nós precisamos resolver o problema. Portanto, a minha compreensão é: a responsabilidade é pública, é estatal, mas a execução desse objetivo de universalizar o saneamento básico, o abastecimento d’água, deve ser delegada a quem for mais eficiente de fazer. No Ceará, a Companhia Cagece? Eu apresento o Ceará porque é um lugar de onde eu já vim, onde eu já trabalhei, onde eu já fiz, e as pessoas podem atestar se minhas ideias são praticáveis. Então, a Cagece, do Ceará, é estatal. Mas qual é a questão lá? Você tem o seguinte, vamos lá, os números não sei direito, vou dar ordem de grandeza. O Ceará tem 184 municípios, a Cagece está em 20, e 20 que dão lucro, que estou querendo dizer, ou dez, os outros dão prejuízo. Então, o que ela faz? Ela faz subsídio cruzado. Essa é a responsabilidade. Cedae, no Rio de Janeiro, privatizada. Você vai ver. Zona Norte e Zona Oeste vão ter dificuldades graves, porque a Rocinha está de um lado; São Conrado, do outro. A Rocinha não pode pagar o imobilizado nem a manutenção de um sistema eficaz de esgotamento sanitário. São Conrado pode pagar sobrado. Se eu privatizo, a lógica da privatização é o lucro. Ou eu ter uma regulação forte. E essa é a razão pela qual nós desconfiamos do marco que foi votado. Eu considero um avanço. Foi relatado por um grande brasileiro, senador Tasso Jereissati. Todo mundo conhece as minhas afinidades com ele, mas a nossa preocupação é que não está nesse marco o cuidado com isso. Se eu privatizo o filé? Por exemplo, devolveram o Galeão. O Galeão foi concedido, qual o problema de conceder aeroporto? É o marco regulatório: devolveu, fracassou.

[Renata Vasconcellos]: O senhor falou do seu estado, o Ceará, abordar a questão da Segurança Pública, que é um tema importantíssimo. O senhor já disse que o seu grupo político já tentou de tudo com relação à Segurança Pública em quinze anos, no estado, e o senhor disse também que lamentava, que infelizmente uma parte da polícia sempre acaba conivente com o crime. O senhor propõe um sistema único de segurança e a federalização da segurança, dessa área da segurança, mas como é que isso evitaria o problema da conivência com o crime?

[Ciro Gomes]: A federalização é de algumas figuras penais. Estou seguro pela experiência, a tentativa/erro, de que o enfrentamento das facções criminosas que hoje dominam a periferia de todas as grandes cidades brasileiras, e das milícias, que, a partir do Rio, começam também a se sediar e até a evoluir para lavar dinheiro e entrar na política, não serão enfrentadas localmente, por uma circunstância que a gente pode entender quem conhece com intimidade o Brasil, o policial é um trabalhador, e é um trabalhador cuja família mora na periferia, e se ele não acertar algum pacto de sobrevivência dele e da sua família naquela circunstância dominada pelo terrorismo da facção criminosa, é muito improvável que ele consiga sobreviver. Portanto, é preciso que o combate a essa figura seja feito de fora para dentro, ou seja, com o Governo Federal, e a partir de uma outra ferramentaria: inteligência, tecnologia e aparato. Aparato porque, sabe, dá vontade até de se falar baixo, mas o Brasil tem 11.600 policiais apenas. Um terço de 1% do orçamento é o que é aplicado em Segurança Pública, agora, no atual governo, que prometeu trabalhar. Eu vou assumir, organizar o sistema único de Segurança Pública, e já está previsto e nunca funcionou, estabelecer bases tecnológicas, científicas para padronizar a abordagem, porque você hoje, com algoritmos, talvez não devesse ser tão explícita a minha proposta, mas, assim, com algoritmos grandes policiais estão me ajudando, você pode antecipar manchas de crime e chegar antes. Chego a dizer, sofisticadamente, a hora e o local onde acontecerão assaltos e homicídios, e o Brasil não usa essa ferramentaria.

[Renata Vasconcellos]: A Secretaria Nacional de Segurança já existe há 25 anos. Em 2018 foi criada a lei que criou o Sistema Único de Segurança, de que forma a sua proposta diferiria desse aparato que já existe?

[Ciro Gomes]: É que a minha proposta resolve o problema tanto operacionalmente quanto financeiramente. Esse é o grande problema no Brasil, Renata. O que aconteceu? Se você tomar o orçamento brasileiro em segurança pública federal, é 1/3 de 1%. O tempo inteiro, a retórica muda, e eu já assisti esse debate quando, por exemplo, foi votado a equivocadíssima lei de combate ao tráfico de drogas no Brasil, que levou 800 mil jovens negros e pobres, por regra das periferias do Brasil, para o presídio, não tendo cometido por primeiro nenhuma violência, foram ali na ilusão de aviãozinho do tráfico e tal, na primeira noite que foram condenados, entraram no presídio e foram afiliados a uma facção criminosa, e aí, sim, de uma forma irrecuperável, bandidos altamente periculosos. Isso foi uma discussão. E quantas vezes eu vi nos governos com quem eu estive perto, do Lula, especialmente quando aconteceu esse debate, era assim: não, segurança é problema dos estados, não vamos nos meter nisso porque isso não tem saída, não tem solução. Isso é o bastidor, e eu acredito que não se pode desertar disso. E digo a você, se não — o Governo Federal—, assumir para si a tarefa inteirinha de investigar, prender, fazer a representação no Ministério Público, julgar e aprisionar, isolando a comunicação das cabeças das facções criminosas, nenhum estado será capaz de resolver isso.

[Renata Vasconcellos]: Então essa é a proposta da federalização?

[Ciro Gomes]: Federalização das figuras penais. Vamos lá, crime organizado, que, a saber — facções criminosas, milícias, narcotráfico, contrabando de armas, lavagem de dinheiro e crimes do colarinho branco da política passam a ser integralmente federais, a partir da investigação até o segmento penitenciário.

[William Bonner]: Candidato, nós não temos mais tempo para explorar alguma nova questão, estouraríamos o tempo. Então, eu vou agradecer a sua presença e conceder agora ao senhor aquele minuto adicional que o senhor pode se dirigir aos seus eleitores para as considerações finais.

[Ciro Gomes]: Das cinco propostas que eu me propus a trazer hoje, ainda não falei de uma que é inédita, que é a lei anti-ganância. Eu quero colocar uma lei em vigor no Brasil que eu conheço na Inglaterra. Que é assim: Todo mundo do crédito pessoal, do cartão de crédito, do cheque especial etc., ao pagar duas vezes a dívida que tem, fica quitado por lei. Essa é uma polêmica, estou apresentando aqui em homenagem ao William Bonner e a Renata, né, em primeira mão…

[William Bonner]: No “Jornal Nacional”.

[Ciro Gomes]: O “Jornal Nacional”, certamente, que me deu essa oportunidade. Mas a você, meu irmão, eu peço só uma oportunidade. A partir de sábado vai estar no ar a CiroTV.com.br. Me ajude, me dê a oportunidade de mudar o Brasil, é o que lhe peço. A ciência de errar é repetir as mesmas coisas do passado e imaginar que vai ter resultado diferente. Me ajuda a livrar o Brasil dessa bola de chumbo do passado, vamos nos esperançar de novo. Você que vota no Bolsonaro porque não quer o Lula de volta, me dá uma chance. Você que vota no Lula porque não quer mais o Bolsonaro, há um país para governar, me dê uma oportunidade. E você, indeciso, sabe quantos são vocês? Mais da metade da população.

[Renata Vasconcellos]: Acabou seu tempo, candidato.

[Ciro Gomes]: Perdão.

[Renata Vasconcellos]: Obrigada mais uma vez pela presença. O “Jornal Nacional” volta daqui a pouco.

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