O ativista cultural acreano Francisco Gregório Filho, falecido na tarde deste sábado (12), no Rio de Janeiro, onde vivia desde que deixou o Acre, nasceu em Rio Branco, então território federal, em 30 de março de 1949. No Governo Flaviano Melo, no período de 1987 a 1990, o ator, diretor, gestor de programas e projetos culturais nas áreas de música, então funcionário ativo da Fundação Biblioteca Nacional, deixou a função e o Rio de Janeiro para voltar ao Acre e dirigir o movimento cultural local através da Fundação de Cultura que hoje chama-se “Elias Mansour” (FEM). Era funcionário público federal aposentado e nos últimos anos se dedicava à contação de histórias no canal YouTube. As causas da morte não foram reveladas pela família.
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Menino urbano de uma Rio Branco ainda em formação, cresceu por entre os bairros da Capoeira, Cerâmica e o Centro da cidade. Frequentou a Escola Infantil Menino Jesus e a Escola Primeiro de Maio, onde completou o primário. Iniciou o ginásio no Colégio Nossa Senhora das Dores e concluiu no Colégio Acreano. O secundário foi iniciado na Escola Técnica de Comércio Acreano, mas foi no Rio de Janeiro, na Escola Técnica de Botafogo, que se diplomou contador de histórias. Em 1975 formou-se em Artes Cênicas na Escola de Teatro da Federação das Escolas Federais Isoladas do Estado do Rio de Janeiro (Fefierj), atual Unirio.
“Francisco Gregório da Silva Filho, disse minha mãe quando eu nasci”, disse ele ao falar de sua vida numa longa entrevista. Nos idos da década de 1960, em Rio Branco, participou de diversos grupos de teatro, tendo sido inclusive secretário geral da Casa do Estudante do Acre (CEA). Quando a família se mudou para o Rio de Janeiro, em 1968, participou ativamente do Teatrinho Azul e dos movimentos artísticos do Museu de Arte Moderna (MAM).
Em 1972, criou o grupo Ensaio de Teatro, com o qual participou da montagem do espetáculo “Aquele que diz sim e aquele que diz não”, de Bertold Brecht. O espetáculo foi apresentado em diferentes universidades, até em clubes de Rio Branco, Acre. Nesse mesmo período integrou o elenco do musical “Em torno da palavra homem”, uma coletânea de poetas brasileiros.
Em 1973, dirigiu e atuou em espetáculos com grupos de jovens em diversos municípios do Acre. Ainda nessa época, desenvolveu programas nas rádios Difusora e Andirá. Em 1974, dirigiu os ensaios da peça “Como castrar seu porco chauvinista ou só engorda quem negocia”, de Marcílio Moraes, que foi proibida pela censura no dia de sua estreia. Anda nesse ano, apresentou a peça “O ator com cara de bolacha versus Mimi fla-flu”, também de Marcílio Moraes, em teatros da cidade do Rio de Janeiro.
De 1976 a 79, participou ativamente do movimento cultural de seu estado natal: produziu e apresentou o programa Perfil Contemporâneo, na rádio Difusora, e o programa Momento Experiência, na rádio Andirá; também participou da criação do cineclube Aquiry, tendo sido seu primeiro diretor. Com o grupo Ensaio de Teatro, dirigiu a atuou as peças “A cigarra e a formiga”, “ZYH apresenta mensagem e melodias”, e “A floresta negra e dona Margarida”.
Nessa época, foi diretor geral do Departamento de Assuntos Culturais da Secretaria de Educação e Cultura do Estado e secretário do Conselho Estadual de Cultura. De 1978 a 79 acumulou ainda a função de diretor da rádio Difusora Acreana. No primeiro semestre de 79, exerceu a função de Gerente de Bem Estar Social do SESC.
De volta ao Rio, no final de 1979, passou a integrar a equipe da Coordenadoria de Assuntos Artísticos da Secretaria de Assuntos Culturais do MEC, onde permaneceu até 1981. Em 1982, assumiu a coordenação de Teatro Amador do Instituto Nacional de Artes Cênicas (Inacen), permanecendo até 1987. Simultaneamente participou do projeto Interação entre a Educação Básica e os Diferentes Contextos Culturais existentes no país, desenvolvido pela Secretaria de Cultura do MEC.
Foi então convidado para presidir a Fundação de Cultura e Desporto do Acre, cargo que exerceu até março de 1990. Durante esse período, produziu na rádio Difusora o programa “Aboio – canto de reunir”. Foi também vice-presidente do Fórum Nacional de Secretários de Cultura.
Retornou ao Rio em 1990, para coordenar a área de teatro do Instituto Brasileiro de Arte e Cultura (Ibac), do Ministério da Cultura. De 1982 a 96, a convite da Fundação Biblioteca Nacional, integrou a equipe que criou o Programa Nacional de Incentivo à Leitura (Proler), tendo assumido a coordenação da Casa da Leitura (sede do Proler) em 93.
Em 1997, passou a integrar a equipe do setor educativo do Centro Cultural Paço Imperial do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), onde desenvolveu atividades de contação de histórias e práticas de leitura. Também produziu e dirigiu espetáculos musicais e de teatro, além de ter participado de inúmeros seminários, fóruns, simpósios e encontros de leitura e literatura. Inseriu a sua paixão pelas pipas nas oficinas e passou a contar histórias fazendo pipas. Pipas feitas de tecidos, botões, rendas, bordados, provas testemunhais de sua biografia. O acervo ficou tão vasto que se transformou em exposição.
A partir de 2004 retornou ao Acre, no Governo Jorge Viana, para exercer o cargo de presidente da Fundação Cultural Elias Mansour, onde permaneceu até o início de 2006. Na função, realiza a 1º Conferência de Cultura e insere os artistas acreanos no Projeto Pixinguinha, além de ampliar verba destinada à cultura no Estado.
Também iniciou construção da sede da Fundação, cria e apresenta os programas “Se Esta Rua Fosse Minha”, na Rádio Difusora, e o “Almanaque Aldeia”, na Rádio Aldeia, ambos com a proposta de levar informação cultural à população e resgatar músicas populares e folclóricas.
O ativista cultural virou nome de rua, no bairro Chico Mendes, outro ícone acreano com o qual ele também conviveu. A rua foi nomeada em sua homenagem pelos próprios moradores, em 1992.
Em 2006, em reconhecimento aos seus méritos, recebeu a Medalha de “Ordem do Mérito do Livro”, conferida pela Biblioteca Nacional. Posteriormente foi convidado como um dos pesquisadores da Cátedra Unesco de Leitura, na PUC/RJ. Retornou para o Paço Imperial, aí permanecendo até início de 2010, quando recebeu o desafio de implantar a primeira Secretaria de Promoção da Leitura do país, em Nova Friburgo, RJ. Em 2011 tornou-se membro da Academia Acreana de Letras. Neste mesmo ano retornou para a Fundação Biblioteca Nacional para compor a equipe do Sistema Nacional de Bibliotecas Públicas, até se aposentar em 2013.
Nos últimos anos de sua vida, Gregório Filho se dedicava às oficinas de contação de histórias e promoção da leitura em todo o Brasil. Ensinava o ofício por dentro e por fora, a partir de informações teóricas e práticas, de escolha de repertório e acervos pessoais, passando pela expressão corporal, indicações bibliográficas e apresentação pública.
Dizia que a arte de contar histórias é, na verdade, um instrumento para desenvolver o prazer de narrar e de ler, de mediar a realidade, reinterpretando-a. Suas oficinas são direcionadas a educadores sociais, professores, estudantes e profissionais de diferentes áreas. Ou apenas àqueles que querem ouvir boas histórias. Gregório é convidado a contar histórias em diversos espaços: palácios, museus, centros culturais, bibliotecas, universidades, escolas, estações de trem, de metrô, centros comunitários, igrejas, embarcações fluviais, aldeias indígenas, centros quilombolas etc.
A convite do Sesc e Sesi também desenvolvia oficinas nos programas de criação literária e contação de histórias em eventos em todo o país. Gregório Filho era casado com a educadora Lucia Yunes. Tem um filho, de seu primeiro casamento, também Francisco Gregório, agora Neto, carinhosamente chamado de Kiko.