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‘Vai aumentar o dólar, cair a Bolsa? Paciência’, diz Lula sobre mudar teto de gastos

Por O GLOBO

Lula discursa na COP27 — Foto: Ahmad Gharabli/AFP

Em seu segundo dia de agenda pública na COP27, a conferência climática da ONU, o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva voltou a criticar o teto de gastos, afirmando que “não adianta só ficar pensando em dado fiscal”, mas “em responsabilidade social”. O modelo atual, disse o presidente eleito, “tenta desmontar tudo o que é da área social”.

Um dia depois de o vice-presidente eleito Geraldo Alckmin ter entregue ao Congresso a minuta da PEC de Transição, que prevê quase R$ 200 bilhões em despesas fora do teto de gastos para 2023, Lula afirmou que tudo que a regra fiscal atual faz é “tirar dinheiro da saúde, da educação, da cultura”.

Lula participou de um evento organizado pela sociedade civil, onde ouviu demandas e pedidos de grupos de jovens, cientistas e representantes dos movimentos negro e indígena, por exemplo.

— Você tenta desmontar tudo aquilo que faz parte do social e não tira um centavo do sistema financeiro — disse ele. — Se eu falar isso, vai cair a Bolsa, o dólar vai aumentar? Paciência. O dólar não aumenta e a bolsa não cai por conta das pessoas sérias, mas por conta dos especuladores que vivem especulando todo santo dia.

O petista comentava o rebuliço do mercado após sua primeira visita ao Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), em Brasília, onde funciona a transição de governo, no dia 10. Na ocasião, disse que que a questão social deve ser colocada à frente de temas que interessam ao mercado — o que fez a Bolsa cair mais de 4% e o dólar subiu com força, chegando a R$ 5,39.

— O que é o teto de gastos? Se fosse para discutir que não vamos pagar a quantidade de juros do sistema financeiro que pagamos todo ano, mas mantivéssemos os benefícios, tudo bem. Mas não, tudo o que acontece é tirar dinheiro da educação, da cultura. Tentam desmontar tudo aquilo que é da área social — afirmou ele, que chegou acompanhado do ex-prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, da futura primeira-dama, Rosângela da Silva, e do ex-chanceler Antônio Patriota, que atualmente comanda a missão diplomática brasileira no Egito.

A PEC da Transição foi o caminho encontrado pelo governo eleito para viabilizar a manutenção em R$ 600 do valor de transferência de renda paga às famílias mais pobres, hoje dentro do programa Auxílio Brasil mas que voltará a se chamar Bolsa Família. Como o Orçamento de 2023 só previa o pagamento de R$ 400, é preciso mudar as regras antes mesmo da posse de Lula para garantir recursos para um pagamento de R$ 600.

A regra constitucional do teto de gastos, criada durante a presidência de Michel Temer, prevê que as despesas do governo só podem crescer no mesmo ritmo da inflação. Por isso, para viabilizar o Bolsa Família, é preciso aprovar uma nova Proposta de Emenda à Constituição.

O texto apresentado na quarta-feira por Alckmin prevê que todos os recursos necessários para o novo Bolsa Família fiquem fora do limite do teto de gastos, num total de R$ 175 bilhões. Além disso, libera despesas de até R$ 22,9 bilhões fora do teto.

Com esse “puxadinho”, a PEC da Transição dará uma licença para Lula aumentar os gastos públicos em um total de R$ 197,9 bilhões no primeiro ano de seu novo governo, caso seja aprovada nestes termos por Câmara e Senado.

Se houver algum excesso de arrecadação (como, por exemplo, um leilão ou concessão de ativos públicos que não estavam previstos), até R$ 22,9 bilhões ficarão fora do teto de gastos, livres para outras despesas. Esse limite corresponde a 6,5% do excesso de arrecadação de 2021.

Despesas de universidades feitas com receitas próprias ou doações também ficam fora da regra. Por exemplo: se uma instituição federal de ensino vende um projeto a uma empresa privada, o gasto desse montante não mais vai entrar na conta do teto de gastos.

Além disso, as receitas de doações ambientais não seriam contabilizadas pela regra fiscal, ou seja, se um país doar ao Brasil, isso ficaria excluído do teto. Essa medida foi resultado de um pedido da ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva, que aliou-se ao presidente eleito ainda no primeiro turno.

Essas duas últimas exceções – receitas próprias de universidades e doações ambientais – não enfrentam resistência entre analistas de mercado porque não representam um custo fiscal.

As sinalizações do governo eleito de que haveria uma “licença para gastar” maior do que o necessário para o novo Bolsa Família vêm provocando instabilidade no mercado financeiro. Após as falas de Lula na semana passada, dólar e Bolsa têm oscilado dias de altas e baixas. Nesta quarta-feira, o dólar encerrou o dia cotado a R$ 5,38.

*Daniela Chiaretti viajou ao Egito a convite dos Institutos Arapyaú e Clima e Sociedade (iCS). Ana Rosa Alves viajou a convite do iCS.

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