Depois de a campainha de sua residência tocar, o jornalista Paulo Cezar de Andrade Prado abriu a porta e se deparou com um homem que já conhecia, um oficial de Justiça. Ele entrou e começou a proceder à penhora de vários bens.
Uma geladeira, uma adega, monitores de computador e até um ventilador entraram na lista. O juiz responsável pelo caso, porém, decidiu que só deveriam permanecer penhorados o ventilador e a adega. Ambos devem ser transferidos para Leila.
A penhora foi realizada em 5 de dezembro de 2020, após pedido na Justiça feito pela bilionária Leila Pereira, da Crefisa, cerca de um ano antes de ela ser eleita presidente do Palmeiras. Em post no seu blog, Paulo havia feito insinuação ofensiva: ao citar a Rua Augusta, endereço da Faculdade das Américas, uma das empresas de Leila, o blogueiro acrescentou “região, aliás, em que a empresária, a duras penas, teria ganhado seus primeiros trocados”. Leila considerou que a frase a associava à atividade de profissionais do sexo, que por décadas tiveram no local um ponto tradicional de trabalho.
O responsável pelo Blog do Paulinho sequer apresentou defesa, e foi condenado em primeira instância. Em sua casa, o oficial de Justiça foi tentar encontrar bens que pudessem ser usados para assegurar o pagamento de indenização por danos morais.
O valor cobrado na ação de execução já supera R$ 50 mil, mas os itens encontrados estão longe de satisfazer o débito, resultado de apenas um dentre quatro processos públicos movidos pela empresária contra o jornalista – somadas, as ações, que envolvem diversos textos, superam R$ 1 milhão em pedidos de indenização. No centro da guerra entre ambos está um embate que confronta liberdade de expressão e ofensa à honra.
Tanto o jornalista como a dona da Crefisa e da FAM, patrocinadoras do Palmeiras, são veteranos nas trincheiras jurídicas. Paulinho já foi preso três vezes por causa de ações movidas por personagens que se sentiram ofendidos ao lerem suas postagens. Por sua vez, a dirigente palmeirense e empresária já processou outras pessoas por sentir a sua honra ofendida.
A penhora original incluiu:
– Uma geladeira Eletrolux de duas portas, com abastecimento de água gelada na porta, avaliada em R$ 1.050.
– Um ventilador Mondial Maxi Power 40, com seis pás e valor calculado em R$ 150.
– Uma adega da marca Cadence com avaliação de R$ 900.
– Dois monitores Samsung para microcomputadores no valor estimado de R$ 300 cada.
– Uma impressora fotocopiadora da marca HP avaliada em R$ 300.
A defesa de Paulinho contestou a penhora. No ano passado, em 20 de julho, o juiz Paulo Rogério Santos Pinheiro, considerou impenhoráveis a geladeira, “por ser necessária à habitação digna”, os monitores e a impressora, que são utilizados profissionalmente.
O advogado Diogo Flora, que defende o blogueiro em diversos casos, diz que esse processo está entre os que mais o surpreenderam envolvendo o jornalista.
“Uma pessoa bilionária citada pelo jornalista, e que possui vários processos contra ele, em um desses processos pediu a penhora da geladeira, ventilador e alguns materiais de trabalho do jornalista. Felizmente conseguimos preservar a geladeira e o material de trabalho, mas mesmo assim essa pessoa bilionária conseguiu a adjudicação, que em outras palavras significa pegar para si para quitar parte da dívida, de um ventilador e uma adega velha”, declarou o advogado.
A presidente do Palmeiras apareceu em quinto lugar na lista de mulheres mais ricas do Brasil publicada pela Forbes em setembro do ano passado. A publicação estimou sua fortuna em R$ 7,2 bilhões.
Leila não comenta
Procurada por meio de sua assessoria de imprensa para responder a perguntas sobre o processo contra Paulinho e opinar em relação ao caso, a presidente do Palmeiras não se manifestou. “Eu não comento processos e decisões judiciais”, disse ela.
Apesar do silêncio de Leila, trechos de peças anexadas nos processos contra o blogueiro indicam como ela vê a atuação do jornalista. Na petição inicial de uma dessas ações, por exemplo, o advogado da empresária diz que o blogueiro mantém “campanha tresloucada de difamação, calúnia e tentativa abjeta de desconstrução da honra e da imagem dos autores (Leila e Crefisa)”.
Outras brigas
Leila está acostumada a processar quem ela entende ter ferido a sua honra. Em 2018, por exemplo, ela entrou com ação contra Genaro Marino Neto, Victor Fruges e José Carlos Tomaselli, que na época eram vices do Palmeiras. Ela se sentiu ofendida por nota divulgada pelo trio e pediu R$ 100 mil de indenização dos três, mas não foi atendida.
Chico Lang e cobrança de cerca de R$ 30 milhões
Por sua vez, Paulinho está habituado ser acionado na Justiça por personagens ligados ao futebol. Um dos casos mais curiosos é uma ação aberta em 2011 pela Fundação Cásper Líbero e pelo jornalista Chico Lang. Por causa desse processo, em março do ano passado, foi determinado o bloqueio de R$ 29.937.756,38 nas contas do blogueiro.
A fundação e Lang pediram indenização por danos morais de 252 salários mínimos alegando que foram difamados por publicações de Paulinho . Também foi requerido que fossem retiradas do ar todas as reportagens com seus nomes do blog e que Paulinho não mais os citasse em suas matérias. Foi pedida multa diária de R$ 1.000 para o caso de não cumprimento da sentença.
Decisão de abril de 2012, confirmando liminar que havia sido concedida, condenou o blogueiro a pagar R$ 20 mil para cada parte, a excluir as postagens e a não escrever novas matérias sobre os autores da ação. Ficou estabelecida multa diária de R$ 1 mil para o não cumprimento. No entanto, não foi estipulado um teto para a multa.
“Que loucura. A condenação é baixa. Eles estão cobrando multa diária desde 2011. A chance de eles receberem é nenhuma. Preocupação zero”, afirmou Paulinho.
Pelas contas do blogueiro, ele já foi processado mais de uma centena de vezes. “Ganhei a maioria, mas os que perdi me geram três prisões, a meu ver, indevidas”.