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Crônica: o sol que nasce no Oeste não encontra o Leste

Por Hellen Lirtêz

Foto: Reprodução

“Que este Sol a brilhar soberano, sobre as matas que o veem com amor, encha o peito de cada acreano, de nobreza, constância e valor”. O trecho pertence ao hino acreano que me lembra um fato paralelo a mensagem descrita nesses versos. Em 2020, enquanto o mundo vivia seu momento apocalíptico com o surgimento da Covid-19 uma mulher se instalou na porta de um banco na capital Rio Branco (AC).

Em seu seio esquerdo mamava em silêncio uma criança de poucos meses enquanto isso, a mulher estava cercada por uma fila imensa de pessoas. Se tratava de uma jovem que não chegava a ter vinte e cinco anos. Desempregada e mãe solteira, ela pedia ajuda para alimentar a si e a criança que carregava consigo alegando que o marido estava na cadeia.

Eram dez e trinta e cinco da manhã e ela já havia andado muito a pé o dia inteiro em busca de um emprego. Seu rosto estava queimado pelo sol, seu cabelo arrepiado e seus chinelos rachados. Mesmo assim, seu aspecto físico e suas explicações não foram convincentes. Ela foi ignorada.

Ela desistiu ao perceber a invisibilidade de suas palavras então, sentou do lado de fora e através das paredes de vidro observou as pessoas usarem os caixas, fazerem seus saques e entrarem em seus carros sem olhar para trás. O abandono estava registrado nos olhos dela. Um senhor bem vestido ao perceber que ela estava sem máscara perguntou em tom de deboche “Ei dona Maria, a senhora não tem medo do Corona não?” ela respondeu, “Eu tenho medo é de o dinheiro não dar. “Verás que um filho teu não foge à luta” quem vê essa luta? Quem não foge a ela?

A moldura da desigualdade atingia cerca de 50 milhões de brasileiros naquele ano, o equivalente a 25,4% da população, na linha de pobreza com renda familiar equivalente a R$ 387,07. Isso não dá pra comprar uma abobrinha no mercado.As narrativas de sobrevivência em tempos pandêmicos emergiram o que há de pior no capitalismo selvagem, uma falsa equidade social. As periferias não mudaram, não se recolheram, não se esconderam. Os ônibus permaneceram cheios enquanto os carros de luxo pararam de rodar, às obras continuaram ativas mesmo que a ordem fosse outra. Por isso, socialmente o sol que nasce no Oeste não encontra o do leste pois, quando um ilumina o outro escurece logo, não dividem o mesmo céu.

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