Há uma década, a família de Artur Paschoali convive com a saudade e a incerteza sobre o que aconteceu com ele.
O jovem, que morava em Brasília e sonhava em viajar pelo mundo, desapareceu no Peru em dezembro de 2012, enquanto fazia um mochilão no país. O caso nunca foi esclarecido.
Mãe de Artur, a arquiteta Susana Paschoali, de 62 anos, afirma que até hoje espera algum tipo de resposta sobre o caso.
“Nunca perdi essa esperança (de descobrir o que aconteceu com Artur). É uma possibilidade muito pequena, mas gostaria que isso ocorresse”, diz à BBC News Brasil.
Ao longo desses 10 anos, os familiares receberam diversas informações desencontradas sobre Artur.
Os pais do jovem fizeram investigações por conta própria e gastaram mais de R$ 200 mil com as buscas – pequena parte disso por meio de campanha de doações -, mas nada foi suficiente para esclarecer o caso.
Susana acredita que o filho morreu. “Desde o primeiro instante achei que tinham matado o Artur.”
“Não considero que sou melhor nem pior que ninguém, então se ocorreu dessa forma é porque era para ser”, diz a arquiteta. “Se fosse pra ser diferente, teria sido e já teríamos uma resposta, porque muitas pessoas desaparecem e são achadas, ou seus corpos são encontrados logo em seguida.”
Já o pai de Artur, o representante comercial Wanderlan Vieira – ele e Susana são separados -, acredita que ainda pode encontrar o filho vivo.
“É complicado porque fica tudo no campo do achismo. Mas o que eu acho é que, passado todo esse tempo, o Artur tenha sido vítima de um cartel na região do Peru e possa estar vivo”, afirma.
O MOCHILÃO
Artur tinha 19 anos quando viajou com um grupo de brasileiros para o Peru no fim de setembro de 2012. A viagem era uma oportunidade para ele, que era apaixonado por artes, conhecer mais sobre a cultura local.
A princípio, o jovem passaria apenas algumas semanas na região de Cuzco, mas se encantou pelo lugar e estendeu o período. Na época, ele comunicou aos pais que queria ficar por mais cerca de seis meses no local e depois planejava seguir para a Bolívia, antes de retornar ao Brasil.
Durante a viagem, ele se comunicava com os pais somente por meio de mensagens no Facebook.
Segundo Susana, o jovem se recusava a receber ajuda financeira da família. Em razão disso, trabalhou como recepcionista em hostels e em um bar para que pudesse ter moradia e alimentação.
No início de dezembro de 2012, ele se mudou de Cuzco para Águas Calientes, também nas proximidades de Machu Picchu, a cidade perdida dos Incas.
Foi nesse período que começou o drama da família. Dias depois da chegada dele a Águas Calientes, o jovem mandou uma mensagem que causou preocupação. Segundo Susana, ele disse que bebeu demais e teve problemas com o patrão.
Preocupada, a mãe pediu que Artur a mantivesse informada. Cerca de uma semana depois, segundo Susana, ele enviou uma mensagem dizendo que estava no distrito peruano de Santa Teresa. Foi o último contato dele.
O DESAPARECIMENTO E A INVESTIGAÇÃO
Depois do Natal de 2012, os familiares acenderam um alerta porque Artur não mandou mensagem.
Os familiares conseguiram o contato de um hostel em Santa Tereza e descobriram que um turista brasileiro havia desaparecido, mas não receberam confirmação se era Artur.
Desesperados, Susana e Wanderlan procuraram por autoridades brasileiras ou peruanas que pudessem ajudá-los. Mas, segundo eles, não conseguiram apoio naquele momento. Compraram passagens aéreas para 31 de dezembro e embarcaram para o Peru. Em Lima, descobriram que o jovem desaparecido era Artur.
A partir de então teve início a busca pelo jovem, que reuniu autoridades peruanas e brasileiras e teve grande repercussão na mídia.
Além da investigação oficial, Susana e Wanderlan começaram a apurar o caso por conta própria. Eles descobriram que o filho desapareceu em uma região tomada pelo narcotráfico e com uma população com intenso medo de passar informações.
Os pais de Artur ficaram no Peru por quatro meses logo após o desaparecimento do jovem. Eles dizem que chegaram a sofrer ameaças de morte, mas não desistiram da busca. As informações que receberam eram passadas anonimamente por pessoas que moravam na região.
A polícia peruana passou a investigar o caso como crime, não mais somente como desaparecimento, após insistência dos pais do brasileiro.
Uma das suspeitas na época, com base em informações colhidas pelos pais do jovem, era de que o dono do bar em que ele trabalhava antes de desaparecer poderia ter envolvimento com o caso.
Uma testemunha relatou ter ouvido gritos de Artur sendo agredido e pedindo para não apanhar em uma residência que pertencia ao dono do bar. No local foram encontradas marcas de sangue. No entanto, segundo a investigação policial, uma análise apontou que o sangue não era do jovem.
Na época, apesar de apontarem alguns suspeitos, ninguém foi preso porque as autoridades alegavam que não havia sequer a comprovação de que Artur havia sido morto.
Para os pais do jovem, muitas provas foram destruídas ou desprezadas durante as investigações e isso prejudicou o esclarecimento do caso. Segundo a família, por se tratar de uma região de tráfico intenso, as autoridades tiveram receio em apurar o desaparecimento a fundo.
Susana retornou ao Peru uma vez após a primeira ida ao país, enquanto Wanderlan voltou outras vezes, sendo a última delas em 2016, para investigar o sumiço do filho.
Para o pai de Artur, o filho pode ter sido escravizado e ainda pode estar vivo. “Em uma das minhas viagens ao Peru, uma testemunha me disse que viu o Artur em um local de tratamento por meio de ervas da Amazônia. Isso foi um tempo depois do desaparecimento dele. Ele estaria escravizado lá, em um pequeno cômodo dentro da selva.”
Segundo o pai do jovem, naquela época Artur estaria sendo obrigado a trabalhar como tradutor, porque sabia inglês e espanhol. Essa informação, porém, nunca foi confirmada.
“Foi a última informação que considerei confiável (sobre a possibilidade de ele estar escravizado). Desde então, não recebi mais nenhuma informação que considero confiável sobre o meu filho, só boatos”, diz Wanderlan.
DEZ ANOS SEM RESPOSTAS
Uma década depois, enquanto vive com a certeza de que o filho morreu, Susana ainda espera descobrir o que ocorreu com ele. Uma das possibilidades que ela acredita é de que, com o passar dos anos, alguma testemunha ou até mesmo pessoa que possa estar envolvida no desaparecimento a procure e dê detalhes que possam levar ao desfecho do caso.
Caso o filho realmente tenha sido assassinado, ela diz que já perdoou a pessoa responsável pelo crime.
“Há uns cinco anos, eu estava muito mal com tudo isso e fiz um propósito de perdoar. Eu entrava no banho e ficava pedindo que Deus aliviasse esse peso. Não queria mais que a pessoa fosse presa, não queria que nenhum mal acontecesse a essa pessoa e isso deu leveza à minha vida”, conta a arquiteta.
“Mais cedo ou mais tarde, acredito que essa pessoa vai ter o retorno sobre isso que fez. O que interessa é o meu filho, que eu acredito que morreu, não me interessa mais essa situação (de punição a quem possa ter cometido um crime contra o jovem)”, acrescenta a arquiteta.
Já Wanderlan acredita que um dia conseguirá recursos financeiros para voltar ao Peru e buscar novamente por respostas sobre o filho. “Não acredito que vou obter novas informações assim, do nada. Mas acredito que um dia conseguirei reabrir a investigação extraoficialmente.”
“Enquanto eu estiver vivo, vou trabalhar para desvendar esse mistério para saber o que realmente aconteceu”, acrescenta.
Em nota à BBC News Brasil, o Itamaraty não detalha sobre o caso de Artur, pois afirma que não fornece dados detalhados sobre “casos individuais de assistência consular a cidadãos brasileiros.”
“Tais informações poderão ser repassadas somente mediante autorização dos envolvidos ou de seus familiares diretos”, diz o comunicado do Itamaraty à reportagem.
Em 2020, o Itamaraty informou à BBC News Brasil que a investigação sobre o caso estava suspensa desde 2017. Os familiares de Artur confirmaram à reportagem que desde então não houve mais nenhum tipo de apuração sobre o desaparecimento.
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