A líder indígena Sônia Guajajara assumiu nesta quarta-feira (11) o comando do Ministério dos Povos Indígenas. Agora à frente da pasta, Guajajara entra para a história ao se tornar a primeira indígena a ocupar um ministério.
Durante a cerimônia de posse no Palácio do Planalto, a ministra homenageou o indigenista Bruno Araújo Pereira e o jornalista britânico Dom Phillips – que foram assassinados em uma expedição à região amazônica do Vale do Javari, no Amazonas, em junho de 2022.
“Preciso destacar a força de Bruno Pereira e Dom Philips, em memória de quem saúdo todos os nossos aliados e aliadas defensores do meio ambiente e dos direitos humanos”.
Ela também destacou a simbologia do evento, com um discurso que focou bastante na valorização da ancestralidade, e anunciou a recriação do Conselho Nacional de Política Indigenista.
“Sabemos que não será fácil superar 522 anos em 4. Mas estamos dispostos a fazer desse momento a grande retomada da força ancestral da alma e espírito brasileiros. Nunca mais um Brasil sem nós”, afirmou Guajajara.
Concorrida, a solenidade, que contou com a presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), teve muitas filas. Quem não conseguiu entrar para ver, assistiu em um telão montado no primeiro andar do palácio.
Na abertura da cerimônia, parte do Hino Nacional Brasileiro foi cantado na língua Ticuna, dos povos Ticuna – o mais numeroso povo indígena da amazônia brasileira.
Quem é Sônia Guajajara?
A indígena é reconhecida internacionalmente pelas dezenas de denúncias que já fez à Organização das Nações Unidas (ONU), ao Parlamento Europeu e às Conferências Mundiais do Clima (COP) sobre violações de direitos dos povos indígenas no Brasil.
Uma das 100 pessoas mais influentes do mundo: em 2022, ela entrou para a lista da revista Time, ao lado de nomes como Volodymyr Zelensky, presidente da Ucrânia, e Ketanji Brown Jackson, a primeira mulher negra nomeada para a Suprema Corte dos Estados Unidos.
Ativismo ambiental: a ministra se destaca também na linha de frente na luta contra projetos que ameaçam as florestas e os modos de vida dos povos indígenas.
O Ministério dos Povos Indígenas foi criado para cuidar das políticas de governo relacionadas aos povos indígenas como cumprimento de uma promessa de campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
‘Futuro do planeta é ancestral’
Em seu discurso, Sônia Guajajara afirmou que é importante que a população brasileira saiba que os indígenas “existem de diferentes formas” e que “não são o que muitos livros de histório costumam retratar”.
“Estamos nas cidades, nas aldeias, nas florestas, exercendo os mais diversos ofícios que vocês puderem imaginar. Vivemos no mesmo tempo e espaço que qualquer um de vocês, somos contemporâneos deste presente e vamos construir o Brasil do futuro, porque o futuro do planeta é ancestral”, disse a ministra.
Conselho Nacional de Política Indigenista
Guajajara anunciou a recriação do Conselho Nacional de Política Indigenista. O órgão colegiado foi criado em 2015 e extinto pelo governo Bolsonaro em de abril de 2019.
O que o órgão faz?
Ele é responsável pela elaboração, acompanhamento e implementação de políticas públicas voltadas aos povos indígenas.
Ela também indicou os nomes que farão parte do ministério. São eles:
- Eloy Terena, secretário-executivo;
- Jozi Kaigang, chefe de Gabinete;
- Eunice Kerexu, secretária de Direitos Ambientais e Territoriais;
- Ceiça Pitaguary, secretária de Gestão Ambiental e Territorial Indígena;
- Juma Xipaia, secretária de Articulação e Promoção de Direitos Indígenas;
- Marcos Xucuru, assessor especial do ministério.
‘Resistência preta e indígena’
Durante o evento, Anielle Franco também assumiu o comando do Ministério da Igualdade Racial, órgão recriado por Lula. No discurso, Guajajara homenageou Anielle e destacou a simbologia das posses desta quarta.
“A nossa posse aqui hoje, minha e de Anielle Franco, é o mais legítimo símbolo dessa resistência secular preta e indígena no Brasil”, disse a ministra.
As cerimônias de posse das duas ministras estavam previstas para segunda-feira (9), mas foram adiadas em razão dos estragos deixados por bolsonaristas radicais que invadiram o Planalto e outros prédios da esplanada no último domingo.
‘Ministério ancestral’
Durante a cerimônia, a indígena, Célia Xakriabá – deputada federal por Minas Gerais – fez um discurso forte, em que ressaltou a importância da criação da pasta e os feitos de Sônia Guajajara.
“Esse ministério é novo, mas na verdade é ancestral. É fruto da luta. Quantas vezes estivemos do lado de fora [do Palácio do Planalto] levando bala de borracha? Estamos agora do lado de dentro. É o ministério da floresta, da terra”, disse Célia.
Sobre a ministra, Célia afirmou:
“Sônia também é sabedoria, é sonho, é sol, é semente. Sônia é mulher que não se mede pela sua estatura, mas pela coragem e pela sua voz”.
Trajetória de Sônia Guajajara
Em 2009, Sônia Guajajara foi eleita vice-coordenadora da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB). Em 2013, assumiu a coordenação-executiva da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB).
Em 2019, esteve à frente da Jornada Sangue Indígena Nenhuma Gota Mais, que percorreu 12 países da Europa levando denúncias sobre violações, cometidas pelo governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Nascida na Terra Indígena Araribóia, no Maranhão, é do povo Guajajara/Tentehar. Formada em letras e enfermagem pela Universidade Estadual do Maranhão, também possui pós-graduação em educação e pecial pela mesma universidade.
Durante a jornada, o grupo cobrou também medidas para que o governo brasileiro e empresas do agronegócio cumprissem os acordos de preservação do meio ambiente e respeito aos direitos dos povos indígenas.
Após a eleição de 2022, Guajajara atuou na equipe de transição do novo governo, no núcleo dedicado aos povos indígenas.
No final de dezembro, a indígena foi anunciada por Lula para o cargo de ministra.