‘Não pode ser invasivo’: como série de ficção da Boate Kiss trata o luto

A madrugada de 27 de janeiro de 2013 é inesquecível para o Brasil. Às 23h do dia 26, começou em Santa Maria (RS) a festa Agromerados, na badalada Boate Kiss. A fatídica noite terminou em 242 mortos, 636 feridos e uma tragédia que, 10 anos depois, continua sem resposta na Justiça.

Agora, o caso se transforma em uma série de ficção da Netflix, que tem como objetivo garantir que a história das vítimas, dos sobreviventes e familiares jamais seja esquecida.

“Todo Dia a Mesma Noite” é inspirada no livro homônimo de Daniela Arbex, premiada jornalista investigativa brasileira que também é autora de “Holocausto Brasileiro” e “Cova 312”. Na obra, a autora dá voz pela primeira vez a familiares, amigos, profissionais e sobreviventes do incêndio.

A série, com cinco episódios, tem Arbex como consultora criativa, Gustavo Lipsztein como roteirista e Julia Rezende na direção-geral. O time olha com muita delicadeza para a história abordada, e uma das maiores preocupações da equipe era garantir que tudo fosse tratado com muita humanidade e muito respeito.

Por isso, os atores tiveram como material base para preparação o livro de Daniela.

Embora os personagens representados sejam inspirados diretamente nas pessoas que a jornalista entrevistou para escrever o livro, os verdadeiros sobreviventes e familiares foram poupados, e não se envolveram diretamente com a construção dos personagens ou o desenvolvimento do roteiro.

“Não tivemos contato com os sobreviventes”, enfatizam os atores Thelmo Fernandes, Débora Lamm e Leonardo Medeiros, em entrevista a Splash. Os três interpretam pais de vítimas do incêndio, que se tornam vozes ativas na comunidade em busca de resposta e justiça pelos próprios filhos.

Imagem: Guilherme Leporace/Netflix

“Eu acho que tem muito bom gosto, no sentido da delicadeza, com que o assunto foi tratado muito respeitosamente. São 100 entrevistas que a Daniela fez”, continua Leonardo, deixando claro que o material reunido no livro era base mais que o suficiente.

Então, cada um desses pais que a gente faz é uma amálgama. A gente sabe que tem um lá que é parecido, mas não é exatamente a mesma pessoa. Então, nesse sentido, tivemos muita liberdade.

Leonardo Medeiros, ator de ‘Todo Dia a Mesma Noite’

Ao longo dos cinco episódios, o público acompanha toda a transformação de Santa Maria e a luta desses pais por respostas na Justiça para o que ocasionou a tragédia na boate.

“Estamos contando uma história baseada em fatos. Mas, no fundo, no fundo, é uma ficção, e uma ficção que vem a serviço de uma causa que ainda está inacabada”, reforça Débora. “Acho que o nosso lugar principal é de extremo respeito. Queremos que o nosso trabalho sirva para que a história deles possa se resolver, que isso possa levar a luta à luz”, continua.

Ciente do tamanho que a série pode ter e do quanto seus trabalhos representam, Lamm reconhece que há um peso maior e mais imponente em “Todo Dia a Mesma Noite”.

É nessas horas que, sim, a gente percebe o quanto a nossa profissão tem esse lugar de excelência. É poder emprestar a sua voz, o seu potencial e a sua energia de trabalho a uma causa tão urgente, nesse momento.

Débora Lamm, atriz

Os atores Luan Vieira e Paola Antonini, que interpretam jovens que estavam na festa, ressaltam que a preparação antes das filmagens foi primordial para que eles conseguissem acessar as emoções de forma saudável.

Como é um trabalho com muito cuidado e respeito às vidas e memórias, a gente também não se aproximou das pessoas envolvidas. Porque também não pode ser invasivo, machucar e ferir.

Luan Vieira, ator de Todo Dia a Mesma Noite

“Acho que cuidar é a palavra-chave mesmo”, completa Paola. “A gente sabia a história que estava contando, e queria contar da forma que ela merece, para que as memórias fiquem vivas e que todo mundo conheça essas histórias.”

“Todo Dia a Mesma Noite” estreia na Netflix no dia 25 de janeiro.

PUBLICIDADE