O governador afastado do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), minimizou ameaças de ataques em Brasília um dia antes dos atos golpistas de 8 de janeiro.
“Já estamos mobilizados. Não teremos problemas”, escreveu Ibaneis para o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD). Segundo Pacheco, a polícia do Senado estava apreensiva com a possibilidade de “mobilização em invasão ao Congresso”, o que de fato aconteceu no dia seguinte.
A mensagem consta na perícia feita pela PF (Polícia Federal) no celular do governador afastado. O documento foi apresentado hoje ao STF (Supremo Tribunal Federal).
Em outra perícia, sobre o celular de Fernando Sousa, então secretário executivo da Segurança do Distrito Federal, há mensagens que mostram que a PM (Polícia Militar) também não acreditava, inicialmente, em ameaças, indicando estava acostumada a atuar em “eventos de manifestações na Esplanada dos Ministérios”, diz relatório da PF.
A conclusão da perícia sobre as mensagens no celular de Ibaneis é de que o emedebista não atuou a favor dos atos golpistas do dia 8 de janeiro. Porém, as mensagens mostram que Ibaneis minimizou a dimensão da manifestação.
”A investigação não revelou atos do governador Ibaneis em mudar planejamento, desfazer ordens de autoridades das forças de segurança, omitir informações a autoridades superiores do Governo Federal ou mesmo de impedir a repressão do avanço dos manifestantes durante os atos de vandalismo e invasão.”
Trecho da conclusão da PF
Troca de mensagens
A análise feita pela PF mostra que Ibaneis Rocha recebeu uma ligação de Anderson Torres, então secretário de Segurança do DF, às 13h42 do dia anterior aos atos golpistas. Logo depois, Torres envia ao governador o contato de Fernando Sousa, então secretário executivo da pasta.
Minutos depois, o emedebista compartilha o número do secretário executivo com o ministro da Justiça, Flávio Dino, junto com uma mensagem informando que Sousa já havia tomado as providências.
No mesmo dia 7, o governador afastado ainda encaminhou um informativo e áudio de Fernando Sousa ao ministro Flávio Dino, que questiona Ibaneis sobre os pontos de bloqueio e atuação das forças de segurança do DF para o dia seguinte.
Em depoimento prestado à PF em 13 de janeiro, o governador Ibaneis Rocha já havia negado conivência com os atos golpistas e teria revelado surpresa com a falta de agentes no dia da invasão à Praça dos Três Poderes, em Brasília.
Dia dos atos
A perícia da PF no celular de Ibaneis Rocha ainda mostra o que foi conversado no dia em que os atos golpistas aconteceram.
Logo pela manhã, às 9h18, o governador recebe do então secretário executivo de Segurança um informativo e áudio sobre o monitoramento da chegada dos ônibus ao DF e acampamento do Quartel-General do Exército. Ibaneis compartilharia depois esses documentos com o ministro Flávio Dino.
Às 16h25, Ibaneis dá ordens a Fernando Sousa após ser cobrado por mensagens pela presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Rosa Weber. Ao receber informações sobre a necessidade de apoio da Força Nacional e do Exército, o governador, “quase que imediatamente” faz a solicitação ao ministro Flávio Dino, indica a PF.
O relatório ainda mostra que, nos dias seguintes, o governador comenta —inclusive com jornalistas— sobre fatos, responsabilidade e atuações dos órgãos de segurança pública federais e do DF. Ele afirma, a mais de um interlocutor, que a coordenação e atuação da Polícia Militar do Distrito Federal falhou no dia 8.
A PF ainda identificou, analisando ligações realizadas e recebidas por Ibaneis nos dias 7 e 8 de janeiro, que o governador foi responsável por diligências contra os atos golpistas.
”São inúmeras ligações de, e para, a vice-Governadora Celina Leão, o delegado Fernando Sousa, o Ministro da Defesa José Múcio, os Presidentes da Câmara e do Senado, Deputado Arthur Lira e o Senador Rodrigo Pacheco, o Ministro da Justiça Flávio Dino, dentre outros.”
Trecho da perícia da PF
O UOL tenta contato com a defesa de Ibaneis Rocha para comentar o assunto. Caso haja resposta, o texto será atualizado.
Pós-atos
Os atos golpistas do dia 8 de janeiro culminaram em uma intervenção federal no Distrito Federal, que chegou ao fim no dia 31 daquele mês. Em seu relatório, o interventor Ricardo Cappelli diz que houve falha operacional dos comandantes das forças de segurança do Distrito Federal.
Ele também aponta diretamente a conivência de militares para com a manutenção do acampamento bolsonarista em frente ao QG do Exército, em Brasília.
Por causa dos atos golpistas, Ibaneis foi afastado do cargo pelo ministro Alexandre de Moraes por 90 dias. Com o afastamento de Ibaneis, assumiu a vice-governadora do Distrito Federal, Celina Leão (PP).