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PT comemora 43 anos de fundação, mas partido no Acre já não conta com os velhos fundadores

Por Tião Maia, ContilNet

A caminho do seu quinto governo na presidência da República do Brasil, a exemplo do que ocorreu no Acre, onde passou 20 anos no poder com cinco governos consecutivos, de 1998 a 2018, o Partido dos Trabalhadores (PT) completa, nesta sexta-feira (10), 43 anos de fundação. O Partido foi fundado em nível nacional por militantes de oposição à ditadura militar então vigente no país, sindicalistas, intelectuais, artistas e católicos ligados à Teologia da Libertação, no Colégio Sion, em São Paulo.

No Acre, um dos primeiros estados do país onde o Partido se organizou de forma regional no mesmo ano de 1980 para disputar as eleições gerais seguintes, em 1982, foi fundado num escritório acanhado da Avenida Getúlio Vargas, ao lado da Lavanderia Poty, onde funcionava o escritório local da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag). Ali trabalhavam, o delegado João Maia da Silva Filho, um paulista da cidade de Santa Branca com doutorado em sociologia no Canadá, e os acreanos de Cruzeiro do José Elson Santiago de Melo e seu irmão Carlinhos, que no futuro todos se tornariam políticos com mandatos de deputado e vereador, embora por partidos diferentes daqueles que ajudaram a fundar.

Ao inaugurar o Hospital da Criança em Rio Branco, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em maio de 2003, no primeiro ano do segundo mandato do então governador petista Jorge Viana, o fundador e presidente de honra do PT revelou como se deu seu contato com os homens que fundariam o PT no Acre.

Segundo ele, o primeiro contato deu-se em São Paulo, mais precisamente em São Bernardo do campo, onde ele, Lula, presidia o já famoso Sindicato dos Metalúrgicos, que havia liderado as grandes greves de trabalhadores do chamado ABC paulista no final dos anos de 1979 até 1980, quando surgiu a ideia da fundação de um partido nacional de defesa da classe trabalhadora.

Lula estava na sede do Sindicato, quando, segundo ele, chegaram dois homens estranhos, usando óculos escuros do tipo Ray Ban e muito parecidos com policiais e homens da comunidade da informação pró-ditadura disfarçados que a época se infiltravam nas organizações sindicais a fim de monitorar suas lideranças e levá-las presas em casos de algum desvio de conduta segundo o código dos ideólogos da ditadura militar. Discutir política partidária dentro de Sindicatos, na época da vigência da Lei de Segurança Nacional, era considerado crime e, como Lula já havia sido preso acusado de fazer política através do Sindicato, ele temia ser confrontado de novo e novamente preso.   

Foi quando os dois homens se identificaram: um era João Maia, o delegado da Contag no Acre, e o outro, vereador do MDB de Xapuri, Francisco Alves Mendes Filho, o Chico Mendes, e ambos estavam ali para fundarem o PT no Acre. Foi um alívio para Lula, que, mesmo assim, levou os futuros companheiros para tomar cachaça e tirar o gosto com torresmo no “Bar do Gordo”, que ficava próximo à sede do Sindicato.

Foi assim, entre torresmos e cachaça, que começou a nascer o PT do Acre, segundo o líder máximo da sigla.

Em meados de  1980, ao deixar uma carta na sede do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Brasileia, cujo presidente era Wilson Pinheiro de Souza e que seria morto a tiros em  julho daquele ano, Chico Mendes assinava a correspondência como presidente da executiva provisória do PT em Xapuri e anunciava que o sindicalista brasileiense seria o presidente naquele município.

Lula vem ao Acre, acompanhado de outras lideranças do PT nacional conforme previamente marcado para fundar o PT em Brasileia, mas naquele 28 de julho a data coincidia com  a missa de 7º Dia em memória de Wilson Pinheiro, o sindicalista que deveria presidir a comissão provisória do diretório municipal.

Em nível nacional, o partido foi fruto da aproximação entre os movimentos sindicais da região do ABC, que organizaram grandes greves entre 1978 e 1980, e militantes antigos da esquerda brasileira, entre eles ex-presos políticos e exilados que tiveram seus direitos devolvidos pela lei da anistia. Desde a fundação, o partido assumiu a defesa do socialismo democrático.

Após o golpe de 1964, o Comando Geral dos Trabalhadores (CGT) — federação de trabalhadores que desde a Era Vargas reunia dirigentes sindicais tutelados pelo Ministério do Trabalho — foi dissolvido, e os sindicatos passaram a sofrer intervenção do regime militar.

O surgimento de um movimento organizado de trabalhadores, notabilizado pelas greves lideradas por Lula no final da década de 1970, permitiu a reorganização de um movimento sindical independente do Estado, o que foi concretizado na criação da Conferência das Classes Trabalhadoras (CONCLAT), que viria ser o embrião da Central Única dos Trabalhadores (CUT).

Originalmente, este novo movimento trabalhista buscava fazer política exclusivamente na esfera sindical. No entanto, a sobrevivência de um sindicalismo controlado pelo Estado (expresso na recriação da CGT, que reunia líderes conservadores como Joaquim dos Santos Andrade, conhecido como Joaquinzão, e Luiz Antônio Medeiros), somada à persistente influência de partidos de esquerda tradicionais como o Partido Comunista Brasileiro sobre o movimento sindical, fizeram com que os trabalhadores do ABC, estimulados por lideranças de esquerda anti-stalinistas, procurassem identidade própria na criação de seu próprio partido político – uma estratégia diferente à realizada pelo Solidarność, na Polônia de então.

Nos anos 1980, um encontro em Roma entre Walesa e Lula mostrou que suas visões políticas eram bastante diferentes. Walesa defendia o pluralismo na política enquanto Lula defendia a união dos sindicatos em uma única entidade.

O manifesto de fundação foi lançado no dia 10 de fevereiro de 1980, no Colégio Sion em São Paulo, e publicado no Diário Oficial da União em 21 de outubro daquele mesmo ano. Mais tarde, foi oficialmente reconhecido como partido político pelo Tribunal Superior de Justiça Eleitoral no dia 11 de fevereiro de 1982.

A ficha de filiação número um foi assinada por Apolônio de Carvalho, seguido pelo crítico de arte Mário Pedrosa, pelo crítico literário Antonio Candido e pelo historiador e jornalista Sérgio Buarque de Hollanda, pai do cantor e compositor Chico Buarque.

No Acre, a partir da influência de João Maia, que seria deputado federal pelo MDB e se filiaria a vários outros partidos e hoje vive recluso numa fazenda em senador Guiomard, o PT seguiu a mesma trajetória de agremiação partidária com forte apelo sindical e nos movimentos sociais de seringueiros e trabalhadores rurais.    

Mas no Acre fica difícil saber quem poderia vir a ser o primeiro filiado. É que nesses 43 anos, o Partido em nível estadual mudou muito de endereço, por falta de uma sede própria, e também passou por vários recadastramentos, de forma que os antigos documentos sobre as filiações históricas não existem mais.

Mas militantes históricas como Júlia Feitoza e Célia Pedrina, esta última atualmente morando em Brasília, lembram de memória das primeiras reuniões e de quem delas participou para fundar o Partido de história mais longeva à frente da administração estadual – sem contar a Arena/PDS, que teve cinco governos indiretos, bem ao contrário do PT estadual, que elegeu cinco mandatos de governadores pelo voto direto.

O inusitado é que, dos três  governadores que conquistaram os cinco mandatos de governadores estaduais, Jorge Viana (dois mandatos), Binho Marques (um mandato) e Tião Viana (dois mandatos), além de lideranças emergentes da sigla como os ex-prefeitos da Capital Raimundo Angelim e Marcus Alexandre não estavam entre os primeiros fundadores da sigla. Os irmãos Viana, Jorge e Tião, eram filiados à Arena e depois ao PDS, partidos nos quais militava seu pai, Wildy Viana, então deputado federal pela sigla e que, em 1984, transferiu-se para o MDB, levando os filhos juntos; Binho Marques, embora simpático ao PT, militava na corrente do PRC, uma sigla clandestina que atuava dentro do Partido; Raimundo Angelim também era filiado ao PDS, e Marcus Alexandre ainda era menino no interior de São Paulo, onde nasceu e morava até a chegada do PT ao poder no Acre, em 1999.

Aliás, os velhos fundadores da sigla, já não têm espaço no PT atual. Uns, como José Granjeiro, Abrahim Farhat, Elias Rozendo, Hélio Pimenta, Zé Gilberto, Matias, Lovigildo, João Bronzeado, Wilson Pinheiro, Chico Mendes, João Eduardo e Guilhermina das Lavadeiras, porque já falecidos. Outros, como Nilson Mourão, José Batista Badate e Ivan Melo, porque estão aposentados ou se desencantaram com a sigla ou com a política. E um terceiro grupo, como Marina Silva, a atual ministra de Meio Ambiente, e o seringueiro de Brasileia Osmarino Amâncio, porque abandonaram a sigla. Ambos estão, respectivamente, na Rede e no PSTU. 

Mas, sob nova direção e de pessoas que só conhecem o passado da sigla pela história, como o atual presidente regional Cesário Braga, que sequer era nascido quando da fundação do Partido, o PT busca novamente se reencontrar. Com a história e com o futuro.

Embora isso hoje seja difícil para uma sigla que foi varrida do Senado, do Governo, da Assembleia, das prefeituras e das câmaras de vereadores e que não tem na Capital, por exemplo, um único representante eleito. “Vamos comemorar com direito a bolo e cantar parabéns na sede do Partido”, disse Cesário Braga sobre os 43 anos.

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