ALERTA: este texto aborda assuntos como violência doméstica e violência contra a mulher, podendo ser gatilho para algumas pessoas. Caso você se identifique ou conheça alguém que esteja passando por esse problema, denuncie! DISQUE 180]
A auxiliar de saúde bucal e estudante de estética e cosmética Kauane Cellarius, de 22 anos, denunciou o pai, o cantor Fernando Cellarius, da dupla Giba e Nando, de agressão e ameaça de morte. A jovem, de Ponta Grossa (PR), resolveu expor as violências que teria sofrido, por meio das redes sociais, em 8 de março, no Dia Internacional da Mulher, como forma de alerta. Em um áudio, ela expôs o que teria sido uma das situações mais graves: ela teria sido ameaçada por ele com uma arma de fogo. De acordo com Kauane, ela foi vítima de agressões físicas e verbais a infância inteira. O cantor, no entanto, nega todas as acusações e afirma que apenas se defendeu.
Em um áudio, Kauane registrou uma discussão entre ela e o pai. “Pai: ‘Eu tô falando que pode ser você, pode ser ** o que seja, não vai faltar com respeito comigo’/ Filha: ‘E se alguém maior que você viesse te bater’?/ Pai: ‘Daí eu uso isso aqui [engatilha arma]. É simples, é assim que eu resolvo a vida. É assim que até hoje eu cheguei nos meus 38 quase resolvendo a vida’.” Além do áudio, Kauane tem registros, em fotos, de lesões no rosto que, segundo ela acusa, teriam sido causadas pelo pai.
Em 2021, Kauane denunciou as agressões que sofria à Polícia Civil (PC-PR) após ser incentivada pelo namorado, o assessor jurídico e estudante de Direito Nathan Biscaro Santos, de 23 anos. Depois disso, conseguiu uma medida protetiva contra o pai, que não pode se aproximar dela nem entrar em contato. Em janeiro deste ano, a Justiça aceitou a denúncia do Ministério Público do Paraná (MP-PR) contra o sertanejo por lesão corporal no âmbito de violência doméstica, tornando-o réu.
Em conversa exclusiva com Quem, Kauane conta como era sua relação com o cantor. “Morei com meu pai a vida inteira. Ele pegou minha guarda quando eu ainda era bebê e passei a morar com ele, meus avós paternos e minhas duas tias. Ele dizia que minha mãe não cuidava de mim, então, eles foram ao juiz e ele conseguiu minha guarda. Minha avó conta que moro com eles desde que eu era bebê. Não tinha contato nenhum com minha mãe”, afirma.
Segundo Kauane, Fernando sempre a agrediu. “As agressões aconteciam desde que me conheço por gente. Ele me batia de cinta, de fivela, de mão fechada. Minha família via, mas não fazia nada. Aí, em 2009, meu pai se casou e eu passei a morar com ele e minha madrasta. O tempo foi passando, eu fui virando adolescente e as agressões pioraram”, lamenta, acrescentando que o pai também era violento com a madrasta. “Ele gritava muito com ela, humilhava, e me batia na frente dela. E ela não podia fazer nada. Pensei que isso ia parar conforme eu fosse crescendo. Mas completei 18 anos, e era frequente. Uma vez ao mês, pelo menos, acontecia uma briga que se transformava em uma agressão absurda”, afirma.
Durante a pandemia, Kauane foi morar com a tia. “Meu pai não estava mais com a minha madrasta e comprou um apartamento. Fui morar com ele e comecei a namorar. Na madrugada de 9 de outubro de 2021, cheguei tarde em casa, estava com um casal de amigos e meu namorado. E, quando retornei, perto das três da manhã, começaram as agressões. Dois meses antes, eu havia pedido para que ele parasse de me bater, porque eu não tinha a mesma força física que ele. E aí ele falou que ninguém ia faltar com o respeito com ele. Aí perguntei: ‘e se fosse alguém maior?’ Ele foi no guarda-roupa, pegou uma arma, engatilhou, e disse: ‘aí, vou usar isso aqui’. Tenho gravado e expus isso”, conta.
Kauane afirma que teve medo de morrer no dia 9 de outubro. “Quase perdi a minha vida, ele apertava meu pescoço com força, e tentou me matar naquele dia. Lembro que bateu minha cabeça contra o espelho. Depois tentou alegar que cheguei quebrando tudo e quebrei o espelho. Só não morri porque meu namorado notou que eu não estava respondendo as mensagens, nem atendendo o telefone, e retornou ao local. Ele pegou meu pai em flagrante. Me viu deformada, cheia de sangue. Nesse dia não fui para o hospital. Meu pai, na tentativa de se defender, ligou para a polícia e disse que eu estava sob efeito de drogas, descontrolada e quebrando tudo”, recorda.
Medida protetiva
A jovem conta que o pai foi colocado no camburão da polícia e conduzido até a 13ª DP. “No desespero, pedi que meu namorado ligasse para uma tia. Chegando à delegacia, ela foi falar com meu pai e depois foi falar comigo. E disse: ‘você vai destruir a família!’ Muito desesperada, naquele momento, acabei não representando contra meu pai. Na mesma semana, teria feriado de Nossa Senhora Aparecida e o IML estava fechado, então não consegui fazer o corpo de delito. Mas, por incentivo do meu namorado, fui a Deam (Delegacia de Atendimento à Mulher), e pedi medida protetiva e exame de corpo de delito. Meu pai alega que não foi que ele me agrediu, que ele só tentou me conter. Mas marcas de contenção não são no braço? Minha cara inteira ficou deformada, tive que fazer tomografia e precisei ir a um hospital em Curitiba para ver se eu não tinha descolado a minha retina”, lembra.
Depois da última agressão, Kauane foi morar sozinha. “Comecei a dividir um apartamento com outras meninas e passei a morar com meu namorado, que hoje em dia é meu noivo. Ele foi um anjo na minha vida. Só não morri por conta dele. Hoje o processo está rolando pelo Ministério Público. Mas fiquei sabendo que a audiência será somente em agosto do ano que vem. Depois que expus as agressões, outras duas namoradas dele vieram falar comigo e disseram que sofreram agressão física também. Uma delas chegou a perder um bebê, depois de levar um chute dele na barriga. Ele também chegou a ameaçar outras mulheres com aquela arma”, diz.
A jovem explica que só expôs a agressão agora, porque estava com o psicológico muito abalado. “Ele destruiu minha infância, minha adolescência. Só consigo levantar da cama por Deus. Ele se pronunciou hoje dizendo não tinha conhecimento sobre o áudio. Minha família, meus avós e tias nunca mais me procuraram. Tenho recebido muita mensagem de apoio. Minha mãe se pronunciou, veio me procurar. Mas fiquei feliz e triste, porque ela disse que meu pai não a deixava se aproximar de mim. Ela sempre sentiu muito medo dele. Cresci com a ideia de que ela não queria me ver. Ela ficou muito triste depois que soube que meu pai tirou a guarda dela para fazer tudo isso”, afirma.
Kauane só quer justiça. “Não só por mim, mas por todas as mulheres que ele agrediu. O que ele fez é desumano. Ele matou um bebê! Se eu não me engano, a ex-namorada dele já estava com três meses de gestação quando ele a chutou a barriga dela e ela perdeu a criança. Ele tem uma outra filha, minha meia-irmã, que tem pavor dele, não quer se aproximar dele. Hoje em dia, ela mora em Itajaí com a mãe”, acusa ela, que sempre teve uma relação conturbada com o pai. “Qualquer deslize meu era motivo de agressão. Uma vez apanhei porque quebrei uma pecinha de encaixar ovo na geladeira. Ele me jogava no chão, segurava o meu cabelo e batia minha cabeça várias vezes no chão, me sufocava”, lembra.
Kauane Cellarius acusa o pai, o sertanejo Fernando Cellarius, da dupla Giba & Nando, de agressão — Foto: Reprodução
Agressões físicas e psicológicas
Segundo a jovem, ela era vítima de agressões físicas e psicológicas. “Na época do colegial, quando ele me batia, me fazia usar maquiagem para ir à escola, e ameaçava me bater na frente dos meus colegas. Ele também falava, quando acabava de me bater: ‘agora eu duvido que você me denuncie, porque lutei muito para ter o cargo que eu tenho hoje’. Na época, ele era assessor do deputado Emerson Bacil. Ele dizia: ‘sou amigo de peixe grande, nunca vou ser preso, nada vai acontecer comigo'”, recorda.
Kauane diz que trabalha desde os 17 anos. “Hoje tenho uma casa a zelar, vivo com meu noivo e tenho minha vida para manter. Passei por muito tratamento psicológico e faço tratamento psiquiátrico até hoje. Sempre senti vontade de contar sobre as agressões, mas tinha muita vergonha. Era o meu sonho ter uma família normal. Aí aproveitei o Dia Internacional da Mulher para contar tudo que aconteceu. Eu confio na Justiça daqui e na divina. No momento, recebi a notícia de que meu advogado está saindo do processo porque o caso foi parar na mídia. Estou procurando outro através do Ministério Público. Não tenho nada a temer”, conclui.
Kauane e o namorado, Nathan — Foto: Reprodução/Instagram
Kauane com o namorado, Nathan — Foto: Reprodução/Instagram
Cantor nega acusações
O cantor sertanejo Fernando Cellarius negou, nesta sexta (17), durante pronunciamento à imprensa, as denúncias de agressões feitas a ele por Kauane. Ele é réu na Justiça por lesão corporal no ambiente doméstico por agressão contra a filha de 22 anos. “Eu não imaginava que tudo isso chegaria ao ponto que chegou. Comprei um apartamento, fiquei morando durante seis meses com minha irmã, enquanto eu reformava o meu, e ela mudou o quarto dela e colocou como queria e tal. Quando ficou pronto, ela foi morar comigo. Fui tocar numa cidade próxima e ela pediu se podia trazer uns amigos. Ela disse que seriam dois ou três, e falei que tudo bem. Quando entrei no camarim, tinha uma mensagem dela me perguntando se o namorado podia dormir em casa. E falei: ‘olha, você acabou de falar para mim que conhece seu namorado há duas semanas’. E falei: ‘claro que não'”, recordou o artista.
Fernando, então, deu sua versão sobre o dia 9 de outubro de 2021, data em que Kauane diz ter quase sido morta pelo pai. “Quando eu cheguei em casa, o apartamento estava virado, o apartamento novo, que eu fiz com dificuldade. Foi um baque grande ver aquilo e comecei a ligar para ela, que não atendia. Por volta das três da manhã, ela chegou no apartamento com um transtorno muito grande. Eu abri a porta e ela entrou muito transtornada. Meu papel de pai é questionar e cobrar. Mas ela não queria dar satisfações e veio para cima de mim. Me recordo que ela deu um murro na TV que eu tinha colocado no quarto dela. Logo em seguida, quebrou o espelho do quarto dela. É muito difícil se defender de um filho! Eu não estou acusando, só estou tendo que me defender disso. Eu sei que eu vou estar com a minha filha de novo, eu sei que a gente vai estar em família, junto”, disse ele.
Segundo o artista, a situação tomou uma proporção enorme. “Eu não conseguia mais controlar, e liguei para a polícia, chamei a polícia. Nisso, chegou o namorado dela. Eu fui até o portão, o namorado dela entrou. Eu falei: ‘agora esperem a polícia chegar’. Eles não quiseram esperar e saíram. Eu não tinha como conter, porque ela tem uma estrutura corporal muito forte, não é fácil de segurar ela. Quando a polícia chegou, uns 40 minutos depois, fomos para a 13ª DP. Isso foi em 2021. Tomamos todas as providências que tinham que ser tomadas na delegacia. Ela já tinha ligado para a minha irmã. Minha irmã foi à delegacia, passou no meu apartamento novamente, pegou as coisas dela, e, a partir dali, eu nunca mais vi a Kauane”, recordou.
Para finalizar, Fernando se defendeu. “Eu preciso só que vocês entendam o seguinte: a minha família está destruída. Meus pais, que são pessoas maravilhosas, minhas irmãs. Meus pais nem sabem das provas que temos, que na hora certa vão ser mostradas. Preciso pensar na minha família. E quando falo minha família, estou colocando ela também dentro disso. Eu sei que daqui a pouco tudo isso vai passar. As pessoas que nos conhecem sabem a família que nós temos. Minha família nunca seria conivente com uma coisa dessas. Não houve agressões desde que a Kauane era criança. Isso aí é a realidade. Tem muita coisa que virá à tona e acredito na Justiça. Eu não sou um agressor e na hora certa tudo isso virá à tona e ficaremos sabendo da verdade como ela realmente é”, disse, anunciando que deixou a dupla com Giba. “Mediante tudo o que está acontecendo, estou me desligando do Giba a partir de hoje. Não tenho mais condições de tocar a vida. Nunca fugi e da minha parte está tudo sendo bem feito pelo meu advogado.”