O Conselho Nacional de Justiça recebeu, nesta segunda-feira, uma reclamação disciplinar contra o juiz Carlos Alberto Garcete, da 1° Vara do Tribunal do Júri de Campo Grande (MS), feita pela Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas (Abracrim). O magistrado expulsou o advogado criminalista Willer de Almeida de uma sessão após ele oferecer água a uma testemunha. Apesar de ter ocorrido em meados de maio, o vídeo do momento repercurtiu nos últimos dias nas redes sociais.
O CNJ ainda deverá analisar a admissibilidade da reclamação para que se de início ao procedimento. Não há previsão para a decisão. A Abracrim classifica a conduta do magistrado como “desrespeitosa, humilhante e preconceituosa”, além de “autoritária” e “ilegal”. Procurado, o Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul ainda não se manifestou sobre o episódio.
Durante a sessão, do dia 19 de maio, o advogado Willer de Almeida levou um copo de água para uma testemunha:
— Tira a água, que eu não autorizei água. O senhor não está aqui para servir água para as pessoas. O senhor está aqui como advogado. O copo com vidro não é autorizado — diz Garcete na gravação da audiência, enquanto Almeida retira o copo da mesa e antes de concluir — Servir o senhor deixa para o pessoal daqui.
— Eu faço o serviço que eu quiser. Se o senhor quiser que eu não sirva a ela, que inclusive esta num momento debilitado, quase chorando, tudo bem. Agora, o que eu vou fazer, se eu vou fazer trabalho de advogado, se eu vou fazer trabalho de serviçal, não diz respeito ao senhor — argumenta Almeida.
— Isso é para aprender a respeitar a ordem judicial aqui — conclui o magistrado, pouco antes do advogado ser levado por dois seguranças para fora da sessão.
Para a Abracrim, a atitude do juiz destoa “do que se espera de uma autoridade que deveria ser imparcial, cordial e respeitosa, como previsto na Lei Orgânica da Magistratura e no Código de Ética da Magistratura”. Ainda segundo a entidade, a conduta do juiz “também denotou insensibilidade com aqueles que precisam de acolhimento para uma correta produção da prova, impactando negativamente o ato processual”.
“O próprio advogado acredita que há indicativos de que a situação tomou esta absurda proporçãopor preconceito, tendo em vista que ele é negro”, diz ainda o documento. Ao GLOBO, Willer Almeida disse que vê no episódio um reflexo do racismo estrutural no Brasil:
— Não entendo que tenha sido um racismo explicito — pontua o advogado, antes de continuar — Se você analisar as imagens vai ver que apenas o advogado negro foi expulso da audiência a empurrões dos policiais. É a mania de achar que o negro é um ser perigoso. Será que se fosse um advogado branco seria retirado daquela maneira?
A Associação de Magistrados do Mato Grosso do Sul (Amansul) se manifestou a favor do juiz Garcete. Segundo a entidade, “é dever de todo e qualquer Juiz, ao presidir audiência, manter a regularidade dos trabalhos, a disciplina e o decoro durante o curso do processo, evitando a prática de atos capazes de prejudicar a regular tramitação do feito”.