Em entrevista ao GLOBO, o ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Ricardo Lewandowski se manifestou contrário à sugestão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de que os votos da Corte fossem secretos. Lewandowski afirmou, por outro lado, ser favorável à discussão sobre mandatos para ministros do Supremo, para evitar permanências de décadas em tribunais superiores — cenário que comparou a uma “aristocracia”.
Como senhor viu a declaração do presidente Lula de que os votos dos ministros do Supremo não devem ser conhecidos, apenas o resultado?
A publicidade é um princípio constitucional. É uma cláusula pétrea. Não há nenhuma possibilidade de reversão nesse sentido. Isso afeta a administração pública em geral, mas afeta também particularmente o Poder Judiciário. Todas as decisões e todas as seções em qualquer nível judicial são necessariamente públicas por força de um dispositivo constitucional, desse princípio da publicidade. Então, a transparência é a regra.
Mas o senhor acredita que o voto de cada ministro, individualmente, deve ser divulgado?
Totalmente. Não é possível nenhum retrocesso nesse sentido. Pelo menos desde a Constituição de 1988 sempre foi assim. E isso, a meu ver, seria um retrocesso muito grande.
Existe uma crítica sobre o papel da TV Justiça. O senhor acha que ampliou a pressão sobre o Supremo?
Em um primeiro momento, eu guardava certas reservas com relação à TV Justiça. Mas eu verifiquei, ao longo do tempo, que, com um certo protagonismo do Poder Judiciário, especialmente o Supremo, é muito importante que os cidadãos, o povo, veja como as coisas são decididas e possam, inclusive, aferir qual é a posição de cada juiz. Esse é um ônus que os juízes têm por se sentar na prestigiosa cadeira de ministro do Supremo.
Ex-ministro do STF, Lewandowski afirmou em entrevista ao GLOBO que Corte deveria ter mais mulheres e pessoas negras, mas que inclusão ‘leva um certo tempo’ — Foto: Brenno Carvalho/Agência O Globo
Como o senhor viu o primeiro mês de atuação de Cristiano Zanin, que o sucedeu?
O ministro Zanin é muito preparado. Repito que para ser ministro do Supremo não é preciso ser um acadêmico. Quem faz carreira acadêmica está sujeito a determinados critérios de ascensão na carreira. E quem vai para a carreira judicial? São outros critérios. Ele é um profissional do direito experiente, tem a idade necessária, notável saber jurídico e reputação ilibada. Está se saindo muito bem.
E como avalia as críticas em razão de decisões que desagradaram parte da esquerda?
O ministro do STF precisa interpretar a Constituição no caso concreto, que é submetido a ele. Mas é claro que ninguém se livra das suas visões de mundo. As críticas fazem parte, e também são o ônus de integrar o STF. Entendo que as críticas que a sociedade dirige ou ao Supremo ou a um juiz em particular permitem inclusive que ele veja como a sociedade está reagindo às suas decisões e, eventualmente, se for o caso, corrija o rumo.
O senhor ainda é a favor de mandato para ministros de tribunais superiores?
Um mandato, a meu ver, de 10 ou 12 anos, seria uma fórmula para permitir que os juízes refletissem esta visão da sociedade.
Já defendeu essa proposta ao presidente Lula?
Não cheguei a falar. Mas, em uma República, todos os cargos públicos são temporários. A periodicidade é uma regra na República. Então, se nós imaginarmos que alguém pode entrar com, teoricamente, 35 anos em um tribunal superior e sai com 75, são 40 anos, é quase que uma aristocracia.
Tem preferência por algum nome para ocupar a vaga que será aberta com a aposentadoria da ministra Rosa Weber?
É uma escolha exclusiva do presidente da República. Ele vai nomear uma pessoa com a qual ele tem afinidade. Não afinidade no sentido pessoal, uma afinidade ideológica ou, supostamente, que tem uma mesma visão de mundo ou uma mesma visão do modo como a jurisdição deva ser feita.
Como avalia a possibilidade de diminuição no número de mulheres no Supremo?
O Supremo deve, de certa maneira, representar a composição da sociedade brasileira, dentro do possível. Se tem 50% ou mais de mulheres, evidentemente que deve haver um número maior de mulheres na Suprema Corte. Assim como também deve haver uma representação maior dos negros. Agora, isso é um processo. É um processo que leva um certo tempo para completar. Não sei se seria viável para essa primeira vaga. Que é desejável, é. Se é viável, eu não sei.
Os nomes de algumas mulheres têm circulado também. A ministra Regina Helena, do STJ, a desembargadora Simone Schreiber, do TRF-2…
São nomes que o senhor entende que são bons nomes?
Todos esses nomes são excelentes também. Acho que ocupariam um cargo na Suprema Corte com muita distinção. Estas e outras que foram ventiladas também.
O presidente Lula chegou a pedir algum conselho para o senhor?
Não pediu. Eu também não sugeriria. Essa é uma prerrogativa do presidente da República. Não ousaria.
E no caso da PGR, acha que seria desejável uma recondução de Augusto Aras?
Não posso dizer se é desejável ou não. O que eu posso dizer é que o doutor (Augusto) Aras tem um excelente trânsito no Supremo. Ele exerceu o seu cargo sem maiores sobressaltos, cumpriu o seu dever. Acho que é um candidato, dentre outros, que também pode ser cogitado pelo presidente da República.
Como avalia críticas que apontam “excessos” do ministro Alexandre de Moraes?
As decisões do ministro Alexandre, é importante que se diga isso, são submetidas ao crivo dos demais ministros. Ele não age isoladamente. Quer dizer, o que ele faz tem respaldo dos demais integrantes da Suprema Corte.