Duas famílias de Luziânia (GO), no Entorno do Distrito Federal, viveram uma tragédia dupla, nesta semana. Além de perderem dois bebês, elas descobriram que os corpos das crianças foram trocados pelo Serviço de Verificação de Óbitos (SVO) do município. Um dos nenéns chegou a ser enterrado e, só após acordo entre os advogados dos envolvidos, pode ser exumado e devolvido para a mãe.
Depois de destrocados, os bebês foram sepultados pelos respectivos pais. No entanto, as duas famílias ficaram traumatizadas. Uma delas acompanhou dois enterros; a outra acompanhou a exumação da criança. Além disso, as crianças não puderam ter velórios nem cerimônias religiosas de despedida, devido ao erro.
A mãe de uma das crianças, que pediu para ter a identidade preservada, deu à luz um menino na última sexta-feira (27/10). Porém, o bebê nasceu sem vida. Em 21 de outubro, Tamires Oliveira Santos teve Thaylor Gael Santos, no Hospital Estadual de Luziânia, após uma gestação de 8 meses. O pequeno viveu por apenas quatro horas.
Os corpos dos dois meninos foram levados para o Instituto Médico Legal (IML) da Polícia Civil de Goiás (PCGO) e, depois, ficaram sob responsabilidade do SVO. Na segunda-feira (23/10), a família do bebê natimorto foi ao serviço de verificação para retirar o seu filho. No entanto, levou Thaylor Gael para sepultamento por engano. No mesmo dia, enterrou a criança, pensando se tratar do neném da própria família.
Em 24 de outubro, Tamires foi até o SVO para buscar o filho. Contudo, na hora da verificação, percebeu que a criança não era o bebê dela. Os dois nenéns tinham tamanhos diferentes, pois Thaylor Gael era maior e tinha mais peso. Em choque, a mãe registrou boletim de ocorrência na PCGO.
Liminar
Depois de descoberta a troca, a família de Thaylor Gael descobriu que o menino não poderia ser exumado. Foi necessário um acordo entre os advogados das partes envolvidas para que houvesse uma autorização judicial para remoção do corpo — liberada só após período determinado em lei a partir da data do sepultamento. O processo ocorreu às 17h dessa quinta-feira (26/10).
Muita abalada, Tamires fez o reconhecimento do corpo do filho. Cinco minutos após a exumação, Thaylor Gael foi enterrado, na presença apenas da mãe, do pai e de um irmão ainda criança. Os demais parentes do bebê não puderam dizer adeus.
A outra mãe enterrou o filho verdadeiro às 8h30 de sexta-feira (27/10). Para os advogados de ambas as partes, há indícios de erro grave no serviço prestado pelo SVO no momento da liberação dos corpos.
Erro “grotesco”
Representante da família da mãe que pediu para ter a identidade preservada, o advogado Tiago Alencar Moreira afirma que, quando a criança nasceu, a mãe estava sedada; por isso, ela não teve condições de reconhecer a criança no IML.
“No dia de reconhecer o filho no SVO, ela foi levada para uma sala, onde viu o bebê por um vidro. Mostraram uma criança e disseram que só havia aquele corpo no local. O erro começou aí: existiam dois corpos no local, e o pessoal que fez o procedimento achava que era só um”, detalhou Tiago.
Na avaliação do advogado, o equívoco foi “grotesco”, e a troca poderia ser evitada. “É preciso respeitar o momento de dor dessa família. Ela está totalmente desamparada”, enfatizou.
“Desculpas esfarrapadas”
A advogada Vera Lúcia Vieira Caixeta, que representa a família de Thaylor Gael e a família da criança anônima, junto a Tiago, também considera a situação grave. Ela destaca que o corpo do bebê que sobreviveu por quatro horas foi levado para o IML e para o SVO devidamente identificado com uma pulseira, com o nome da mãe.
Por ter passado por uma cesariana, Tamires só teve alta no fim da segunda-feira (23/10). “Ela contratou funerária, pagou a urna, escolheu, o que é um fato muito triste, comprou flores. Pagou R$ 2,8 mil para fazer o funeral da criança. Quando chegou ao IML para receber o filho, deram um chá de cadeira nela. Ela esperou quatro horas, deram desculpas esfarrapadas e, no fim da história, disseram que a criança dela tinha sido entregue a outra mãe, por engano de servidores do SVO.”
Depois disso, o SVO convocou a segunda mãe, que se dirigiu à 1ª Delegacia de Polícia de Luziânia para prestar as informações necessárias à destroca. “O filho dela, que ela achava estar sepultado, ainda se encontrava no IML. E a outra mãe [Tamires] não teve direito de enterrar o filho dignamente”, destacou a advogada Vera Lúcia.
“É um erro imperdoável de um servidor público. Porque pega a pessoa em um momento de extrema fragilidade, uma mãe de pós-parto e perda de uma criança no puerpério, em situação de alta vulnerabilidade social. As duas mães não são de famílias abastadas. O que gera um agravamento da situação. Além disso, temos o trauma psicológico e o sofrimento que abala uma mulher de forma permanente”, comentou.
Segundo a advogada, Tamires cogita ajuizar uma ação de reparação de danos contra o município.
Posicionamento
Responsável pelo SVO e questionada pelo Metrópoles, a Prefeitura de Luziânia não deu retorno até a mais recente atualização desta reportagem. O espaço segue aberto para eventuais manifestações.
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