São Paulo — Vídeos do ataque a tiros que matou uma aluna e feriu outras duas estudantes nessa segunda-feira (23/10), na Escola Estadual Sapopemba, zona leste de São Paulo, colocam em xeque a versão apresentada à polícia pelo adolescente de 16 anos que cometeu o atentado. Ele foi apreendido e levado para a Fundação Casa.
Segundo o advogado Antonio Edio, o estudante disse que os alvos do ataque seriam “dois meninos que faziam bullying contra ele”, pelo fato de ele ser homossexual. Ainda na versão do autor dos disparos, a aluna Giovanna Bezerra da Silva, de 17 anos, foi morta “acidentalmente”.
“Ele me confessou que a menina foi acertada acidentalmente, que o tiro não era para a menina que faleceu. Ele não tinha nada contra essa menina. Ao contrário, ela nunca fez nada contra ele”, disse o advogado.
Ainda segundo o profissional, “na hora que o autor foi efetuar o disparo de arma de fogo contra os dois meninos”, que seriam os autores do bullying, “ela (Giovanna) achou que a arma era de brinquedo e acabou entrando na frente”.
Contudo, imagens de uma câmera de segurança da escola que flagrou o exato momento em que o autor do atentado atira em Giovanna desmentem essa versão. No vídeo, o adolescente chega por trás da vítima, que caminha na direção de uma escadaria. A menos de um metro de distância, ele atira na nuca da garota, à queima-roupa, quando ela descia o primeiro degrau. No instante do disparo, não havia mais ninguém na frente do atirador.
Questionado mais de uma vez por jornalistas sobre o tiro na aluna assassinada, o advogado do adolescente apreendido insistiu: “A jovem, segundo ele falou, foi uma fatalidade. Não era para ela esse disparo de arma de fogo, mas, sim, para esses dois jovens”.
Outro vídeo, que mostra a ação do atirador dentro de uma sala de aula, também coloca em xeque a versão da defesa. Nele, o autor do atentado aparece entrando no ambiente cheio de estudantes com o revólver em punho e apontando a arma na direção de meninas.
Além de Giovanna, que morreu na hora, duas alunas de 15 anos foram atingidas pelos disparos — uma na clavícula direita e outra na região do abdômen. Uma delas já teve alta nessa segunda-feira, e a outra não corre riscos, mas aguardava exames para avaliar a necessidade de cirurgia.
Até mesmo em relação às duas vítimas baleadas, o relato da defesa do atirador não se sustenta. Aos jornalistas o advogado Antonio Edio afirmou que, segundo o adolescente, “dois dos jovens alvejados eram os que mais praticavam bullying contra ele”.
À polícia o atirador de 16 anos disse que agiu sozinho e que os alvos foram aleatórios. O Metrópoles apurou que ao ser confrontado com o fato de que uma das vítimas era uma aluna com quem ele havia brigado meses antes, como mostra um vídeo que circulou entre os estudantes, o adolescente riu.
Segundo a investigação, o jovem pegou o revólver calibre 38 e quatro munições escondido da casa do pai, durante o fim de semana, para cometer o atentado na segunda-feira. Após a ação, ele foi contido pela coordenadora pedagógica da escola até a chegada dos policiais militares. De acordo com o advogado, ele se diz “totalmente arrependido” do crime, “principalmente em relação ao disparo que ele acertou na moça (Giovanna)”.
Bullying grave e omissão
O advogado do adolescente disse que ele sofria “grave bullying” por ser “homossexual assumido” e que o Estado foi “omisso” por não ajudá-lo. Segundo o defensor, as agressões cometidas pelos colegas contra o autor do ataque já haviam sido relatadas à escola e à Polícia Civil.
Além disso, continua, ele recebia tratamento em um Centro de Atenção Psicossocial (Caps) e era acompanhado pelo Conselho Tutelar. Nenhum desses órgãos, porém, conseguiu oferecer a ajuda necessária, na versão do advogado.
“Há mais de dois anos ele sofria um grave bullying vindo da escola porque ele é homossexual assumido e há um bom tempo ele começou a gravar esse bullying que sofria. A mãe dele teve conhecimento disso, levou ao conhecimento da escola, através da diretora. A diretora não tomou providência alguma, a única coisa que a diretora da escola informou para a mãe foi que ela transferisse a criança de escola”, disse Edio.
A mãe do adolescente também registrou boletim de ocorrência por lesão corporal e ameaça, em abril. Mas, segundo o advogado, “por falta de conhecimento jurídico”, ela não fez a representação do caso para que ele fosse investigado por meio de inquérito policial.
O defensor afirma que os colegas de sala chamavam o adolescente de “Luluzinha” e que os professores e a diretora “sabiam que ele era tratado assim nessa escola”.
“O Estado tem responsabilidade nisso, espero que o governador Tarcísio de Freitas reflita e não pense só que é uma culpa da família, como falou o secretário da Segurança Pública, mas, sim, uma grande culpa da Secretaria da Educação, que foi omissa em relação a não fazer o acompanhamento devido do jovem”, frisou o advogado.
Nessa segunda, o secretário da Educação de São Paulo, Renato Feder, afirmou que o aluno autor do ataque não demonstrava ser um “potencial agressor” e que quando o boletim de ocorrência por agressão foi registrado pela mãe dele, em abril, o garoto estudava em uma escola municipal.