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Dia da Visibilidade Trans: quem somos carrega beleza – por Everton Damasceno e Kahuana Leite

Por Everton Damasceno e Kahuana Leite

Ato 1: Ser quem somos é bonito

É preciso, dentre muitas coisas, beleza para reinventar o que disseram de nós, para na própria pele construir outros modos de habitar a si e habitar o mundo.

Ser quem somos é bonito! Ao contrário de toda narrativa – feia e cafona – que tentam impor para que nos sintamos constrangides.

É bonito quando nossos olhos brilham ao falar dos nossos processos, quando trocamos afetos e somos afetades por tantes, que perto ou nas proximidades das redes sociais, nos lembram que apesar da dor imposta, há muita potência em ser quem somos!

E quem somos não é um texto acabado, mas folhas e folhas a serem bordadas, pintadas, celebradas.

Nossas vidas não são detentoras de sofrimento, o sofrer vem de um mundo que nos violenta.

Nossas vidas podem dançar e criar suas próprias cordas de salvação, que não são as que pessoas cisgêneras desejam. A nossa salvação não requer que ninguém se machuque para existir como é.

Que por mais que haja tantos esforços para que não sejamos visíveis, estamos aqui, sempre estivemos.
Sempre estivemos dentro de suas casas, em sua parentela, nas suas escolas, em suas igrejas. Muitas e muites vieram antes, muitas e muites virão.

Encontrar beleza em minha vida, é o que me permite viver uma vida vivivel. E quando olho ao lado e vejo outras pessoas trans, sorrio! Há tanta beleza em nossas peles, que não podemos ser contidas, transbordamos.

Ato 2: Criar nossas próprias narrativas

Diante da imposição de limites rígidos e autoritários ao meu direito de ser quem eu sou, ouso transgredir, não aceitar, infringir, re-criar, mesmo que doa em algum lugar, porque não pertencer por teimosia é voar com medo de não saber onde chegar.

Cansado de justificar performances, lágrimas, afetos e desejos, me dei a liberdade de não definir o que emergia em mim a partir de quem queria “caravelizar” meus caminhos, mesmo que “não ser entendido” me incomodasse pela falta de confirmação. É como apontar para um horizonte de sentidos de forma solitária – mas há que se atravessar, e fiz, e faço.

Quando gritaram azul ou rosa, eu nem quis cor. Quem eu sou nem tem cor. Talvez tenha, agora, mas não cabe o que sinto e nem estou a procura dela. E se minha cor não for a que espera? E se a cor que quero for a mistura de tantas outras? E se eu deixar de gostar do amarelo queimado e encontrar outra por aí?

Quando perguntaram “homem” ou “mulher”, nem soube dizer. E muitas vezes respondi pelo que aprendi ser e pelo que disseram que sou. E quando o que vejo em mim esborra as caixinhas fechadas? Há espaço para isso?

Eu sei que o “não saber” tem sido, ao mesmo tempo que desafiador, o lugar mais pontente e TRANSformador que encontrei. E nele existem aliados, “perdidos” como eu, que encontro no caminho; que preferem fronteiras ao invés de paredes; que escorrem como o rio – apesar das margens -. Nada é tão revigorante como uma presença presente… Nada acalenta tanto como o que não prende.

[Apesar de todas os dados e dores, escolhemos nesse dia exaltar a beleza de nossa existência. Escrevemos essa carta para todas as pessoas trans e enviamos nosso afeto para todes vocês].


Everton Damasceno é jornalista, psicólogo, gestalt-terapeuta e não-binárie.

Kahuana Leite é psicólogue pela Universidade Federal do Acre (Ufac). Gestalt-terapeuta pelo Centro de Capacitação em Gestalt-terapia (CCGT Belém). Mestrande em Psicologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

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