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Geógrafo alerta para possível surgimento de novas ‘crateras’ em Rio Branco

Por Thiago Cabral, ContilNet

Logo no início deste ano, no dia 4 de janeiro, após as chuvas intensas registradas na capital, uma enorme cratera surgiu no bairro Ayrton Senna. De lá pra cá, a Prefeitura de Rio Branco vem empreendendo obras no local, na tentativa de conter o estrago, e a Defesa Civil municipal monitora 62 bairros com áreas de risco de desmoronamento para que não ocorra o mesmo.

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A erosão deixou duas ruas interditadas/ Foto: Defesa Civil

O prefeito Tião Bocalom (PP) chegou a afirmar em algumas ocasiões que a causa do cratera teriam sido obras “mal feitas” executadas por gestões anteriores a sua. Para entender o que de fato ocorreu para a abertura daquela cratera e se há possibilidade de surgirem novas, a reportagem do ContilNet conversou com o professor Doutor da Universidade Federal do Acre Waldemir Lima dos Santos.

Santos é bacharel e licenciado em geografia, com mestrado em Ecologia e Manejo de Recursos Naturais e doutorado em Geografia, na linha de Análise Ambiental. Na Ufac é titular das disciplinas de Geomorfologia Estrutural e Climática, Geomorfologia Fluvial e Geomorfologia e Dinâmica de Vertentes, também com atuação em Biogeografia e Climatologia, com atuação no curso de graduação e no mestrado em Geografia.

Já no início da entrevista o professor rebateu a hipótese de que a cratera tenha surgido por ocasião de obras mal feitas. “Não existe obra mal feita que possa justificar o problema de deslizamento apresentado. A abertura da cratera está relacionado à diversas variáveis que agem em conjunto. Inicialmente, é um bairro localizado numa planície de inundação do rio Acre, onde a deposição de materiais finos (argila, silte e areia fina) são constantemente depositados a cada cheia e seca do rio. Quando enche leva material, quando seca, o material se deposita. Passado o tempo, as pessoas foram ocupando e dando origem ao bairro e construindo em cima de um material que não tem consistência e é bastante friável e fácil de ser mobilizado. A mobilização do material fica mais facilitado com a presença da água em subsuperficie. Algum vazamento na canalização de águas sejam pluviais ou servidas e a declividade do terreno ajudam a acelerar a ocorrência do problema”, disse o professor.

“O que ocorre, a exemplo do que temos no bairro Ayrton Senna, são movimentos de massa ligados à própria dinâmica do rio Acre”, diz o geógrafo/Foto: Reprodução

O geógrafo complementou afirmando que “há que se considerar, ainda, que desbarrancamentos ou deslizamentos são movimentos de massa que ocorrem, como no caso do bairro Ayrton Senna, logo após a inundação, quando há o rebaixamento do nível das águas, por um processo de desmonte hidráulico. Portanto, não há falar-se em ‘obras mal feitas’, e sim, em um processo natural de evolução da paisagem proporcionada pelas características geomorfológicas e potencializadas pelos picos de cheia e seca do rio Acre”.

Questionado sobre o que pode ser feito em situações como essa, da cratera do bairro Ayrton Senna, para apaziguar o estrago já causado, o professor disse que apenas “obras paliativas”.

“Para que amenize o problema e a população siga morando na região. Obras que utilizem conhecimentos geotécnicos, como construção de taludes para amenizar a declividade do terreno e a força da água superficial. Obra de contenção seguida de plantio de gramíneas e árvores com raízes alongadas, como o bambu, por exemplo, amenizam a situação”, pontuou Santos.

Erosão no bairro Ayrton Senna, em Rio Branco/ Foto: ContilNet

Quando a pergunta foi sobre a possibilidade de crateras como aquela se espalharem por outras localidades de Rio Branco, o professor foi categórico: “Sim!”. “Há possibilidade desse processo se repetir como já temos alguns exemplos, no bairro Cidade Nova, Quinze, Base, ou seja, bairros que têm composição de material igual ao do bairro Ayrton Senna e que se constituem planícies de inundação do rio Acre são mais propícios a ocorrência desse tipo de fenômeno geomorfológico”, relatou.

Para finalizar a entrevista, relembramos que há cerca de um ano, no estado do Maranhão, apareceram diversas voçorocas, o que foi objeto de notícias e estudos nacionais e internacionais. O professor explicou que são fenômenos diferentes.

“As voçorocas são fenômenos geomorfológicos que ocorrem na presença de material arenoso, quase sempre combinado com o fluxo subsuperficial. Ou seja, material friável na parte de cima e uma lâmina de água em subsuperficie que, com o tempo, provoca o desmonte. Na nossa região não temos a ocorrência de voçorocas como as que ocorreram em Buriticupu, no Maranhão, devido a nossa constituição de materiais serem mais argilosos do que arenosos e com alta presença de ferro que ajuda na estabilidade dos agregados. A argila mais o ferro e a alta temperatura favorece a formação de agregados que dificultam a remobilização de material. Não é o caso das áreas imediatamente próximas do rio Acre e que constituem sua planície de inundação, que são constituídos de argila e areia fina com a presença/ausência da água a cada ano, favorecendo a mobilização de material”, explicou.

No entanto, o professou concluiu fazendo um alerta: “O que ocorre, a exemplo do que temos no bairro Ayrton Senna, são movimentos de massa ligados à própria dinâmica do rio Acre e que podem se tornar comuns com o avanço das mudanças climáticas a partir de eventos extremos de seca e cheia”, encerrou.

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