Já são 91 os deputados federais que assinaram até a manhã desta terça-feira (20) o requerimento que pede o impeachment do presidente Luiz Inácio Lula da Silva por suas declarações na Etiópia, no domingo (18), comparando às ações do governo de Israel em Gaza ao Holocausto comandado por Adolfo Hitler. O requerimento é de autoria da deputada Carla Zambelli (PL-SP) e, entre os 91 deputados favoráveis, dois são da bancada de oito deputados federais do Acre – Coronel Ulysses (União Brasil) e Roberto Duarte (Republicanos).
“O que está acontecendo na Faixa Gaza não existe em nenhum outro momento histórico, aliás, existiu, quando Hitler resolveu matar os judeus”, afirmou Lula durante a entrevista cujo teor foi recebido com indignação pelo governo do primeiro-ministro israelense Benjamim Netanyahu, que ameaçou romper relações diplomáticas com o Brasil caso o presidente brasileiro não se desculpasse. Lula não só reafirmou o que disse como mandou buscar o embaixador brasileiro em Israel.
A fala do presidente também não agradou parlamentares oposicionistas que se reuniram para firmar o pedido de impeachiment. Entre os signatários deste pedido, há pelo menos 20 integrantes de siglas que compõem atualmente o primeiro escalão do governo: União Brasil (10), PP (5), PSD (2) e Republicanos (3) que, juntos, lideram oito ministérios. Apesar de serem de siglas da base do governo, este grupo de deputados se identifica com a oposição e raramente vota com o Planalto. É o caso do Coronel Ulysses, o primeiro entre os parlamentares acreanos a assinar o requerimento de impeachiment.
O deputado Roberto Duarte usou suas redes sociais para anunciar adesão ao documento. “Ele precisa ser responsabilizado pela sua fala criminosa, com declarações contra Israel”, disse o parlamentar. “O Art. 5 da Lei do Impeachment é muito claro ao classificar como crime de responsabilidade “ato de hostilidade contra nação estrangeira, expondo a República ao perigo da guerra, ou comprometendo-lhe a neutralidade”, acrescentou.
O termo impeachment não é novidade no vocabulário brasileiro. O país já viveu dois processos de impeachiment, o ex-presidente Fernando Collor, em 1992, e o da ex-presidente Dilma Rousseff, em 2016. No Brasil, o trno voltou à tona com o “superpedido” de impeachment do então presidente, Jair Bolsonaro.
O impachiment é um processo em parte jurídico, em parte político, conduzido pelo Congresso Nacional, que julga se uma pessoa com função pública cometeu um chamado crime de responsabilidade. No caso do presidente, ele pode ser condenado por oito grupos diferentes de crimes de responsabilidade.
Pessoas com função de chefia no Poder Executivo podem sofrer impeachment: a lei prevê o uso desse processo contra presidente e seus ministros de estado na esfera federal, bem como governadores e seus secretários na esfera estadual. É controverso se vice-presidentes e vice-governadores também podem sofrer impeachment, mas grande parte dos juristas entende que sim. A lei também não prevê esse procedimento contra prefeitos, mas de fato eles podem ter seus mandatos cassados pelas Câmaras de Vereadores de seus municípios.
Qualquer cidadão pode fazer um pedido de impeachment. Basta entregar uma denúncia contra uma pessoa com função no Executivo à Câmara dos Deputados. É claro que, para ela ser acatada, ela tem que estar acompanhada de provas do suposto crime cometido pela pessoa acusada. Outros critérios para que a denúncia seja aceita são conter uma lista de pelo menos cinco testemunhas e ter uma assinatura com firma reconhecida.
Se o presidente da Câmara considerar que a denúncia é válida, ele deve lê-la em plenário para a Câmara. Em seguida, ela é encaminhada para uma comissão formada especialmente para analisar o caso. A comissão ouve a acusação e a defesa do presidente. Prazo para os trabalhos da comissão: 10 sessões. O relator da comissão apresenta um parecer sobre o caso. Depois da leitura do parecer, ele é discutido e votado pela comissão dentro de 5 sessões.
48 horas após a apresentação do parecer, o documento deve ser incluído na ordem do dia e votado em plenário pelos deputados (513, ao todo). São necessários dois terços dos votos (342) para que a abertura do processo de impeachment seja recomendado para o Senado (abstenções e ausências são votos contra a abertura do processo).
Aprovado no plenário da Câmara, o pedido é repassado para o Senado, que é responsável pelo julgamento propriamente dito. O Senado também deve decidir pela abertura do impeachment. Para isso, é instalada uma comissão especial, semelhante à comissão da Câmara.
Após a comissão elaborar e votar o parecer do relator, ele é levado para votação em plenário. Para que seja aberto o processo, basta o voto da maioria simples dos senadores (41 de 81; a maioria dos presentes basta).
Quando o Senado instaura o processo, o presidente é afastado de suas funções por um período 180 dias e se torna oficialmente réu por crime de responsabilidade. Começa a fase de pronúncia, em que uma nova comissão é instalada para aprofundar as investigações das acusações. Essa comissão designa um relator, que elabora novo parecer recomendando se o acusado deve ser julgado ou não. Esse parecer é encaminhado ao plenário, que mais uma vez por maioria simples decide se a presidente é julgada ou não.
Finalmente, chega o dia do julgamento. A sessão do Senado em que o presidente é julgado por crime de responsabilidade é presidida pelo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF). Dessa vez, dois terços dos senadores (54 de 81) precisam ser a favor do impeachment para que ele seja condenado (abstenções e ausências também são votos contra a condenação).
O prazo para finalizar o processo é de 180 dias, mas ele pode se estender mais. Se demorar mais que 180 dias, o presidente volta às suas funções; mas se for considerado culpado, será novamente afastado.
O presidente condenado em processo de impeachment, além de perder o cargo, fica inelegível por oito anos. Se não for condenado, o presidente volta às suas funções.