O ano letivo de 2024 começa nesta segunda-feira (19/2) e, enquanto as aulas voltam, persiste a polêmica do Novo Ensino Médio. O Distrito Federal conta com 200 disciplinas eletivas distribuídas pela rede pública escolar, que abordam eixos diferentes entre si. Os conteúdos constam no site da Secretaria de Educação.
Neste ano, estão disponíveis disciplinas com os temas Narrativas com RPG, Fundamentos Agroecológicos, Fotografia, Mitologia, Horta, Simulação de Júri, Linguagem no Ambiente de Trabalho, No universo da Mitologia e outros. Essas matérias são escolhidas pelos alunos e, na seleção, competem com História para o PAS, Física para o ENEM [Exame Nacional de Ensino Médio], Literatura, Filosofia etc.
O Novo Ensino Médio substituiu o formato anterior em que havia 13 disciplinas obrigatórias iguais para todos os estudantes em 3 mil horas por ano. Com o modelo recente, o total de carga horária é o mesmo, sendo que 60% (1,8 mil horas) são para disciplinas obrigatórias e em comum a todos os estudantes. As 1,2 mil horas restantes, correspondentes a 40% do período, são direcionadas para currículos específicos para cada aluno.
O formato pouco conteudista é criticado e elogiado por especialistas. Quem discorda aponta que há uma segregação de estudantes da rede pública e particular. Enquanto a rede privada mantém o ensino das disciplinas que inclusive visam a aprovação do vestibular, a rede pública favorece escolhas que não devem repercutir na inserção do estudante no ensino superior.
Para os apoiadores do modelo, os estudantes podem cursar as áreas que mais interessam, o que tende a estimular a permanência no ensino.
“Apartheid educacional”
O pesquisador Adilson César de Araújo, do Observatório do Ensino Médio e professor do Instituto Federal de Brasília (IFB), defende que o modelo prejudica a educação de jovens. “É uma reforma que estabelece um currículo mínimo para os filhos dos trabalhadores, ou seja, é uma reforma que não garante uma cultura geral”, disse.
“É uma reforma que vai alimentar o histórico de desigualdades escolares, porque as famílias que têm condições vão garantir os itinerários que estão previstos”, afirma o professor. “Um pai que pode pagar uma escola, ele vai querer que todos os conhecimentos sejam garantidos para o seu filho. Ele vai querer filosofia, ele vai querer sociologia, vai querer história, enfim. Ele vai querer os quatro itinerários formativos. Ele não vai querer educação profissional”, ressaltou.
De acordo com Araújo, a formatação do novo ensino médio segrega os estudantes. “Aperfeiçoa de maneira extremamente perversa o apartheid educacional negando aos estudantes das escolas públicas o direito a uma formação, acesso à cultura, a formação básica, um conhecedor de um currículo mínimo”.
Autonomia do estudante
Em contrapartida, o professor Remi Castioni, da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília, afirmou que o modelo tem o objetivo de estimular a autonomia do estudante. “É importante a escola trabalhar para que o aluno seja ouvido”.
O especialista destacou que o Novo Ensino Médio tem o objetivo de ser menos conteudista, mais atrativo para conteúdo digital, e que estimula o interesse do estudante pela possibilidade de escolher a área que quer focar. “No entanto, há uma dificuldade para implementação, como preparar escolas específicas para a área”.
O professor disse que poderia ter escolas no DF voltadas para determinadas áreas. “Por exemplo, no Guará poderia ser só voltada para Matemática e assim centralizar algumas para o interesse do estudante”, ressaltou.
O professor acredita que o novo ensino médio tem potencial para mudar a forma de seleção das universidades brasileiras e assim não ter tanta diferença na formação das redes públicas e privadas.
Novo ensino médio
A lei nº 13.415, de 2017 instituiu uma nova base nacional comum curricular, que divide o ensino em cinco eixos:
- Linguagens e suas tecnologias;
- Matemática e suas tecnologias;
- Ciências da natureza e suas tecnologias;
- Ciências humanas e sociais aplicadas;
- Formação técnica e profissional.
É obrigatório que todos os alunos cursem português e matemática. As demais disciplinas têm que compor os eixos, mas podem ser escolhidas pelo aluno e pela instituição, conforme o interesse.
Catálogo em parceria com professores
Questionada, a Secretaria de Educação defendeu que o modelo é centrado no protagonismo e na autonomia dos estudantes. Em nota, a pasta informou que representa uma abordagem inovadora na educação, proporcionando a liberdade de escolha dos percursos formativos de acordo com áreas de interesse e projetos de vida individuais.
Segundo a pasta, o catálogo foi desenvolvido em parceria com os professores das escolas, observando especificidades regionais, locais, e as diversidades das comunidades.
Leia a nota na íntegra:
O Novo Ensino Médio, centrado no protagonismo e na autonomia dos estudantes, representa uma abordagem inovadora na educação, proporcionando a liberdade de escolha dos percursos formativos de acordo com áreas de interesse e projetos de vida individuais.
A Secretaria de Educação do Distrito Federal (SEEDF), em parceria com os professores das escolas, desenvolveu Catálogos que consideram especificidades regionais, locais, e as diversidades das comunidades, possibilitando aos estudantes o desenvolvimento de competências e habilidades necessárias para serem protagonistas de suas próprias aprendizagens.
As unidades curriculares Eletivas, distribuídas nas quatro Áreas do Conhecimento da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), são oferecidas após uma escuta atenta aos estudantes. A SEEDF orienta que essa escuta seja realizada por meio de diferentes estratégias, como formulários, discussões entre pares, entrevistas, debates, entre outros. Essa abordagem visa garantir que as escolhas dos estudantes estejam alinhadas com seus interesses e aspirações.
A flexibilidade do currículo permite que as unidades curriculares da parte flexível ampliem conhecimentos em, pelo menos, duas Áreas do Conhecimento, promovendo a interdisciplinaridade e enriquecendo a experiência educacional. O foco é proporcionar ao estudante uma visão ampla e heterogênea, incentivando a diversificação de ideias e pensamentos em campos relacionados.
O intuito das unidades curriculares da parte flexível é possibilitar a ampliação de conhecimentos de forma independente ou aprofundar habilidades diversas, respeitando a pluralidade de ideias e interesses dos estudantes. O sucesso do ensino e da aprendizagem é intrinsecamente ligado à participação ativa dos estudantes, que desempenham um papel crucial na escolha dos Itinerários Formativos, orientados pela unidade curricular Projeto de Vida.
Todo esse movimento visa atender às necessidades e expectativas dos estudantes, fortalecendo seu interesse, engajamento e protagonismo, com o objetivo de garantir não apenas sua permanência na escola, mas também uma aprendizagem significativa e alinhada com suas metas de vida. O Novo Ensino Médio, assim estruturado, representa um avanço na promoção de uma educação mais personalizada e alinhada com as demandas e aspirações individuais dos estudantes.