O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco definiu que um dos temas prioritários para discussão em 2024 será a proposta de unificação do calendário eleitoral concentrando numa única data as votações para vereador, prefeito, deputado estadual, governador, deputado federal, senador e presidente. Segundo o relator da proposta, o senador Wellington Fagundes, do PT do Mato Grosso, os principais benefícios são econômicos e políticos, dando mais estabilidade ao país. Certamente, existe um número considerável de pessoas positivas a essa proposta. Mas, antes de entrar no calor do a favor ou contra, gostaria de refletir com o leitor sobre 5 pontos que precisam ser analisados antes da decisão final:
1. Economia da máquina – Os defensores da unificação do calendário alegam que juntar todas as eleições renderia uma economia considerável para os cofres públicos. Citam até que o custo com a Justiça Eleitoral chegou a 10,6 bilhões de reais no ano passado. Isso é uma meia verdade. Porque esse custo é da Justiça Eleitoral e não exclusivamente das eleições. Dos quase 11 bilhões do orçamento da Justiça Eleitoral, “apenas” 1,3 bilhão foi estimado como gasto direto com as eleições de 2022. Ou seja, o gasto maior é com a estrutura, não com as eleições. Além disso, mesmo num ano sem eleições, a Justiça Eleitoral continuará funcionando, ou seja, os gastos não cessarão;
2. Enxugamento do Fundo Eleitoral – outro argumento dos que são favoráveis a unificação das eleições é o de que com eleições ocorrendo apenas a cada 4 anos, os gastos com o fundo eleitoral serão menores e poderão inclusive resultar na moralização do seu uso.
Ora, isso é tratar do sintoma ao invés da doença. Primeiro porque se o fundo eleitoral parece tão abusivo, o caminho efetivo é simplesmente extingui-lo. Seria uma medida com o apoio de praticamente 100% da população. Mas a verdade é que não há, em nenhum trecho do projeto proposto, nenhuma menção a obrigatoriedade da contenção dos investimentos no fundo eleitoral. Pelo contrário: no mundo real é de se supor que uma vez aumentado o número de cargos em disputa, as verbas destinadas para o fundo eleitoral também terão considerável reajuste como ocorre a cada pleito como tem acontecido desde a sua criação até os dias atuais;
3. Agilidade para a Justiça Eleitoral – Na verdade, é correto prever que o resultado será justamente o contrário. A unificação de todas as disputas (vereadores, prefeitos, deputados estaduais, governadores, deputados federais, senadores e presidente) tende a sobrecarregar a Justiça com uma verdadeira avalanche de ações que não poderão ser atendidas com celeridade pelas compreensíveis limitações de atendimento a uma demanda tão pesada. Terão, os TREs condições de julgar com a rapidez que se exige todos os processos por ordem de chegada? Ou será necessário que se estabeleçam critérios de preferência? Como justificar que a decisão sobre uma disputa para a Câmara Estadual é mais importante que o julgamento sobre uma vaga à Câmara Municipal, se ambas as escolhas decorrem da mesma expressão máxima do eleitor?
Existe mais um agravante nessa questão: a natural demora ocasionada pelo excesso de processos certamente contribuirá ainda mais para a sensação de impunidade aos crimes eleitorais;
4. Pacificação do país – Segundo os que defendem o calendário único, o fato de que se termina uma eleição e logo se começa a discutir a próxima seria um obstáculo para a pacificação do país.
Novamente é minimizar o sintoma ao invés de combater a doença.
Não é a população geral quem inicia as discussões políticas no dia seguinte a eleição. São os próprios políticos. E eles não deixarão de existir. E em efeito contrário ao que se deseja, enfrentaremos o grande risco de que as eleições municipais sejam contaminadas pelo viés fortemente ideológico praticado pelas disputas nacionais;
5. Desinformação – Só se aprende a votar, votando. A Democracia é um direito que precisa ser exercido. Votações em períodos distintos para questões locais e nacionais ajudam o eleitor a entender melhor as responsabilidades de cada nível da administração pública além de permitir que os temas sejam abordados com mais profundidade e intensidade. E isso é justamente o que precisamos para enfim escapar do discurso raso entre direita e esquerda.
A Justiça Eleitoral faz um grande e louvável esforço nas proximidades das eleições para instruir o eleitor a respeito da importância do voto e suas consequências. Dilatar a periodicidade desses esforços seria um retrocesso para um país que ainda procura colocar a relação entre política e cidadania na pauta do dia.
Wilson JS Rodrigues é publicitário, especializado em comunicação eleitoral, com pós graduação em gestão pública e ênfase em comunicação pública. Coordenou campanhas eleitorais e desenvolveu campanhas do poder público para prefeitos, governadores, deputados estaduais e federais e senadores nos estados de SP, GO, AM, TO, AP, RR, RO e AC.