A pedido do Ministério Público Federal (MPF), o ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), concedeu liminar para interromper novas convocações para o curso de formação de aprovados no concurso para o Corpo de Bombeiros Militar do Acre, iniciado em 2022.
O MPF questionou dispositivos de leis acreanas que poderiam limitar a participação de mulheres nos concursos públicos para a Polícia Militar e Corpo de Bombeiros.
O ministro também suspendeu qualquer interpretação das normas que impliquem a restrição da participação feminina, em função do sexo, nos concursos para a PM e para o Corpo de Bombeiros do Acre, até que o STF julgue o mérito da ação.
Entenda o pedido do MPF
Proposta em dezembro do ano passado, a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7557 contesta dispositivos de três normas acreanas: a Lei Complementar 164/2006, a Lei 2.001/2008 e Lei 2.009/2008. As leis estabelecem que a admissão na PM e no Corpo de Bombeiros ocorrerá mediante concurso público, regido por regulamentos e critérios de distribuição de vagas a serem definidos pelos comandantes das duas corporações.
Para o MPF, da forma como estão redigidas, as regras abrem espaço para a criação de critérios diferenciados para a participação das mulheres nos concursos, com reserva de vagas a candidatos do sexo masculino, por exemplo. Com base nas normas, o concurso público para o Corpo de Bombeiros Militar do Acre de 2022 reservou 122 vagas para o sexo masculino e apenas 31 para o sexo feminino, o que corresponde a 20% do total.
Afronta à Constituição
De acordo com a ação, ao permitirem restrições à participação das mulheres nos certames, as leis estaduais violam diversos dispositivos constitucionais. Entre eles, o direito à não discriminação em razão do sexo; o princípio da isonomia e da igualdade entre homens e mulheres; o direito social à proteção do mercado de trabalho da mulher; a proibição de discriminação em razão do sexo quando da admissão em cargos públicos; e o direito de acesso a cargos públicos, mediante os requisitos e condições previstos em lei em sentido estrito.
O MPF ressalta ainda que, além de prever o direito à isonomia e ao tratamento igualitário, a Constituição Federal impõe ao Estado o dever de atuar ativamente para a superação das desigualdades e para a concretização dos direitos fundamentais de todos, incluindo os das mulheres, que enfrentam barreiras históricas no acesso ao mercado de trabalho, entre outras dificuldades. A exclusão está traduzida em números: dados do perfil das Polícias Militares do Brasil (ano-base 2018) revelam que, no Estado do Acre, apenas 10% do efetivo da polícia militar era de mulheres.
Efeitos práticos
Em decisão monocrática de 16 de maio, Dias Toffoli concorda com a argumentação. “A Constituição Federal não pode ser interpretada como a consentir que, ao se estabelecer requisitos de admissão para ingresso no serviço público, possa o Poder Legislativo ou a Administração agravar a marginalização de uma categoria que ela mesma buscou dignificar”, diz ele. O ministro lembra que só são admitidos critérios diferenciados em concursos públicos na medida das exigências específicas relacionadas à natureza do cargo e desde que outros direitos não sejam ofendidos.
A decisão registra que, embora esteja concluído e homologado, o concurso ainda não teve todos os efeitos práticos implementados. A lista de 388 aprovados do sexo masculino e 121 do sexo feminino já está divulgada, com aprovados nas vagas ofertadas em edital e para o cadastro de reserva. Desse universo, foram convocadas para o curso de formação (etapa do concurso) mulheres até a 50ª posição e homens até a 199ª posição. Ou seja, existe um universo abrangente de candidatos em cadastro de reserva que podem vir a ser chamados. A aula inaugural do curso de formação está marcada para 2 de julho de 2024 e há pedido de prorrogação do prazo de validade do concurso por mais dois anos.
Para o ministro, permitir novas convocações pode representar violação dos direitos das candidatas aprovadas. Assim, as convocações ficam suspensas até que o Plenário do Supremo avalie “se e em que medida as futuras convocações podem ser compatibilizadas com o critério da equidade de gênero, exigido pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal”.
Atuação ampla
As ações da PGR contra regras que limitam a participação de mulheres em concursos públicos das MP e dos Bombeiros foram ajuizadas em bloco no ano passado e questionam trechos de leis de 17 estados. São eles: Tocantins (ADI 7479), Sergipe (ADI 7480), Santa Catarina (ADI 7481), Roraima (ADI 7482), Rio de Janeiro (ADI 7483), Piauí (ADI 7484), Paraíba (ADI 7485), Pará (ADI 7486), Mato Grosso (ADI 7487), Minas Gerais (ADI 7488), Maranhão (ADI 7489), Goiás (ADI 7490), Ceará (ADI 7491), Amazonas (ADI 7492), Rondônia (ADI 7556), Acre (ADI 7557) e Bahia (ADI 7558).