Um dos mais populares e até recentemente o mais antigo radialista do Acre, o amazonense Altemir de Oliveira Passos nascido em Boca do Acre no dia 17 de junho de 1937, completa 87 anos de idade nesta segunda-feira. Apesar dos problemas de saúde enfrentados desde 2013, quando sofreu um AVC (Acidente Vascular Cerebral) e ter contraído a Covid-2019 em 2021, permanece bem, apesar da idade avançada.
A revista “Tropas: Comunicação, Sociedade e Cultura”, editada pela Universidade Federal do Acre (Ufac), sob responsabilidade do jornalista Francisco de Moura Pinheiro, publicou, há dez anos, a mais completa entrevista do radialista contando sua própria história de vida. De acordo com a publicação, a vinda de Altemir Passos para Rio Branco deu-se em 1949, aos 12 anos.
Dois anos antes, ele havia mudado, junto com todos os familiares, para Manaus. Mas a família não se adaptou aos ares e ao calor da capital amazonense. E aí sobreveio a nova mudança, dessa vez de forma definitiva. Na principal cidade do estado, ele cursou ginásio e científico no Colégio Acreano e, posteriormente, Direito na Universidade Federal do Acre (Ufac).
Sua trajetória com um microfone em punho começou nos primeiros anos da década de 1960, na Rádio Difusora Acreana, convidado pelo advogado, professor e deputado constituinte Omar Sabino de Paula, que na época exercia o cargo de diretor do Departamento de Imprensa do Acre. Mas antes disso, ele trabalhou algum tempo como chefe de almoxarifado da Secretaria do Fomento Econômico, órgão dirigido pelo político Ruy da Silveira Lino, que se tornaria deputado federal plo Acre, falecido em 1987.
Na década de 1970, já popular na Capital como radialista e dono de uma voz de timbre inconfundível, Altemir Passos foi eleito o vereador mais votado de Rio Branco, pela Arena (Aliança Renovadora Nacional). “Embora fosse o partido de
sustentação do regime militar, ao qual era submisso o governo estadual, Altemir credita a sua votação às críticas que fazia ao poder enquanto radialista. Verdadeiro ou não, o certo é que ele foi reeleito vereador, chegando posteriormente à Assembleia Legislativa”, revela Francisco Pinheiro. Ele foi deputado na legislatura de 1978 a 1982, quando perdeu a primeira reeleição.
Como deputado estadual, a carreira de Altemir durou apenas um mandato. Ele tentou ser reeleito duas vezes e perdeu em ambas. O fracasso nas urnas, ele credita a uma divergência com o bispo católico Moacyr Grecchi. Segundo o veterano radialista, o bispo fez campanha contra ele por causa das suas reiteradas críticas ao religioso que, no seu dizer, tinha uma atuação mais política do que voltada aos interesses da igreja. Nos dias atuais, Altemir de Oliveira Passos leva uma vida calma e tranquila, ao lado do filho mais novo Altemir Passos, fruto de seu último casamento, com a jornalista Beth Passos da qual é divorciado faz mais de 15 anos. Desde então, passou a morar com o filho e com a nora, Raquel Zaire.
Na entrevista a Francisco de Moura Pinheiro, Altemir Passos revela como começou na profissão de radialista. “Eu sempre gostei de falar em microfone. Lá no segundo distrito existia o Salão de Beleza Miriam, bem onde hoje fica a cabeceira da ponte metálica. Esse salão fazia a sua propaganda através de um serviço de alto-falante. E era justamente eu que fazia a locução, anunciando os produtos e os horários do salão, mandando recados, mexendo com alguém que ia passando na rua, essas coisas todas. Aí, um dia, o professor Omar Sabino de Paula, de saudosa memória, pessoa que toda vida foi um homem muito importante e de conduta ilibada, sendo, inclusive, deputado autonomista, e que na época era diretor da imprensa oficial, me ouviu falando, gostou da minha voz, me achou com um vozeirão de locutor de rádio e resolveu me convidar para ingressar na Rádio Difusora Acreana”, contou.
“Chegando lá, minha primeira missão foi ler as mensagens. Eu lia pra mais de 70 mensagens num dia. Tinha que ter muito fôlego. No que diz respeito às dificuldades, a principal delas era o baixo salário. A gente ganhava muito pouco. O dinheiro, no fim do mês, não dava pra nada. A gente fazia aquilo porque gostava. Que eu me lembre, essa era a principal dificuldade”, revlou.
Altemir Passos revela que, no exercício da atividade de radialista, teve que cuidar para não melindrar e sofrer represálias do regime militar que ele então apoiava. “Na época do regime de exceção, a gente tinha que ter cuidado ao ocupar os microfones para não melindrar os militares e, dessa forma, sofrer algum tipo de punição. Mas eu sempre tive muito cuidado e posso dizer que me dei bem com os militares. Nunca fui incomodado por eles. Nunca tive sequer nenhuma advertência”, disse.
“Enquanto funcionário da rádio, ao contrário do que aconteceu com alguns colegas, eu não criticava diretamente os militares do governo. As minhas críticas eram todas em relação de determinadas ações das empresas. Casos da Eletroacre, da Teleacre, essas empresas que prestavam serviços públicos e que às vezes atendiam mal. Se eu entendia que alguma ação das empresas poderia ser prejudicial à população, aí eu tecia as minhas críticas ao microfone, mas tudo dentro de certo limite. Eu falava em favor do consumidor, sempre falei em favor do consumidor. Eu nunca sofri censura. Talvez porque as críticas que eu fazia nunca tiveram um tom mais agressivo”, contou.
No entanto, segundo Altemir Passos, foi na redemocratização do país que ele sofreu alguma retaliação por causa de suas críticas no rádio.
“Houve uma ocasião em que o meu programa foi tirado do ar e eu fui proibido de voltar. Isso aconteceu no governo da Iolanda Fleming, já na segunda metade da década de 1980. A Iolanda, que era do PMDB [Partido do Movimento Democrático Brasileiro] havia assumido o cargo de governadora no lugar do Nabor Júnior, que fora eleito senador. E ela, quando tomava alguma atitude mais enérgica contra alguém tinha amania de dizer que “ajoelhou tem que rezar”. Deu-se que eu estava casado com a Beth Passos e comecei a levá-la para apresentar o programa junto comigo na Difusora [Rádio Difusora Acreana]. Lá pelas tantas, não lembro exatamente porque, a Beth repetiu o bordão da governadora e, inclusive, citou o nome dela. A Beth disse algo assim como “ajoelhou tem que rezar né, Iolanda?” Fomos tirados do ar na mesma hora!”, revelou.
O veterano radialista também falou da experiência de ter sido parlamentar. “Durante muito tempo eu fui bastante prestigiado pelo eleitor. Ganhei três eleições, duas para vereador e uma para deputado estadual. Depois disso, apesar de continuar trabalhando, usando o meu mandato em prol do povo, eu tentei me reeleger duas vezes deputado estadual, mas não consegui mais. O que aconteceu para isso foi que eu não gostava da interferência do bispo da época, Dom Moacir Grecchi, nos assuntos políticos. Esse bispo tinha uma atuação muito mais política do que religiosa. Ele interferia mais na vida política do Estado do que cuidava das ovelhas do seu rebanho”.
“Ele era um dos políticos mais ferrenhos contra o governo estadual. E aí eu falava isso, tanto na rádio quanto na Assembleia, e ele não gostava. Por conta dessa minha atuação, eu fui perseguido por ele. Eu lembro que na última eleição que eu me candidatei, um dia eu estava em frente ao Palácio Rio Branco e encontrei umas beatas que vinham da catedral, depois de uma missa, e aí elas me disseram que eu nunca mais seria eleito, porque, no dizer delas, eu vivia falando mal do santo bispo. Imagine só, veja o termo: o “santo bispo”. O bispo mandava votar contra mim! Hoje, passado muito tempo, eu sou categórico em dizer: quem me derrotou nas urnas foi o bispo! O bispo tido como santo pelas beatas”, disse.