Após decidir descriminalizar o porte de maconha para uso pessoal, o Supremo Tribunal Federal (STF) retomou nesta quarta-feira o julgamento do tema e definiu que devem ser qualificados como usuários quem portar até 40g ou seis plantas-fêmea de cannabis, até que o Congresso nacional legisle sobre essa quantia.
Pela tese fixada pelo Supremo, as pessoas consideradas usuárias que sejam flagradas portando maconha não serão mais obrigadas à prestação de serviços à comunidade, mas serão submetidas a medidas que não tenham caráter penal, como o comparecimento a cursos educativos ou advertências sobre o uso de drogas.
Além disso, a substância — que continua sendo considerada ilícita — será apreendida. O porte para consumo pessoal, pela tese que foi aprovada, deixou de ser uma infração penal e, assim, o usuário deixa de ter um registro criminal (deixa de ser “fichado”) pelas autoridades policiais.
“Não comete infração penal quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, a substância cannabis sativa, sem prejuízo do reconhecimento da ilicitude extrapenal da conduta, com apreensão da droga e aplicação de sanções de advertência sobre os efeitos dela (art. 28, I) e medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo (art. 28, III)”, diz o texto consensuado pela Corte.
Esse primeiro ponto foi aprovado por oito ministros, ficando vencidos Cristiano Zanin, Nunes Marques e Luiz Fux, que discordam de alguns aspectos.
Um segundo ponto da tese também foi aprovado pela maioria dos ministros, e diz que que as sanções ao usuário “serão aplicadas pelo juiz em procedimento de natureza não penal, sem nenhuma repercussão criminal para a conduta”.
Além disso, nesta quarta-feira o presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso, irá proclamar o placar final do julgamento – ou seja, quantos ministros votaram a favor ou contra a descriminalização.
Definição de quantidade
A maioria dos ministros do Supremo também aprovou um dos pontos mais delicados da tese, que era a definição da quantidade que diferencia usuários de traficantes. A quantia estabelecida foi de até 40 gramas, ou seis plantas-fêmea, até que o Congresso delibere sobre o assunto.
“Será presumido usuário quem, para uso próprio, adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo até 40 gramas de cannabis sativa ou seis plantas fêmeas, até que o Congresso Nacional venha a legislar a respeito”, determina o texto.
O número final foi considerado uma “média” das diversas propostas que foram feitas pelos magistrados ao longo dos nove anos em que o julgamento ocorreu. Três correntes, ao todo, estavam em jogo: ministros que sugeriam 60g, ministros que sugeriam 25g e ministros que entendiam que não competia ao Supremo deliberar sobre essa quantidade, mas sim ao Congresso.
Os ministros entenderam, sobre a quantidade, que há uma presunção relativa, ou seja, que o juiz possa fazer uma diferenciação entre o usuário e o traficante ao analisar cada caso.
Ao final do julgamento, o presidente do Supremo, ministro Luís Roberto Barroso, voltou a afirmar que a Corte não estava legalizando o uso da droga e disse que os ministros “desincentivam” o uso de substâncias ilícitas – caso da maconha. Para ele, a importância da diferenciação entre usuários e traficantes é importante para combater o que chamou de fornecimento de mão de obra para o crime organizado a partir da prisão de pessoas pobres e periféricas.
– A não fixação de um critério distintivo entre usuários e traficantes fazia com que houvesse eram grande discriminação em relação as pessoas pobres, geralmente negras, que vivem nas periferias. Ao fixarmos a quantidade que a partir de agora que existe como presunção, vamos evitar que essas prisões exarcebadas forneçam mão de obra para o crime organizado no Brasil. Nós desincentivamos o uso de drogas, estamos debatendo a melhor forma de enfrentar o problema – disse.
Para Barroso, a não fixação dessa quantidade distintiva “tem sido uma má politica pública”para combater um problema que, segundo ele, assola o país há décadas.
A discussão que esteve no centro do debate no Supremo dizia respeito à constitucionalidade do artigo 28 da Lei de Drogas (Lei 11.343/2006), que prevê sanções alternativas – como medidas educativas, advertência e prestação de serviços – para quem compra, porta, transporta ou guarda drogas para consumo pessoal.
Em paralelo ao julgamento no STF, uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que define como crime possuir ou portar drogas, independentemente da quantidade, tramita no Congresso. O projeto foi aprovado pelo Senado em abril, e na semana passada também ganhou o aval da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados.