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Matias Vogt: a influência das eleições norte-americanas e a polarização no Brasil

Por Weverton Matias, ContilNet

As eleições nos Estados Unidos sempre atraem atenção global, e o Brasil não é exceção. Em 2024, a corrida presidencial americana novamente capturou o interesse brasileiro, com muitos buscando paralelos entre as políticas de lá e as do Brasil. Contudo, é essencial que esse interesse vá além da superfície, reconhecendo as complexidades e as implicações dessas eleições para a América Latina, especialmente para o Brasil.

Polarização e Simplificação do Debate

A política brasileira tem sido marcada por uma profunda polarização, frequentemente reduzindo debates complexos a um simples binarismo entre esquerda e direita, personificado pelas figuras de Lula e Bolsonaro. Esse mesmo dualismo é frequentemente aplicado às eleições americanas, com muitos brasileiros se alinhando automaticamente com os democratas ou republicanos, baseando suas escolhas mais em afinidades ideológicas do que em uma análise crítica das políticas propostas.

Kamala Harris e Donald Trump são candidatos a presidência dos Estados Unidos/Foto: Montagem/Reprodução

Durante o governo de Donald Trump, os Estados Unidos adotaram uma postura protecionista, refletida em políticas comerciais e migratórias mais restritivas. Essa abordagem ressoava com a retórica nacionalista de Bolsonaro, atraindo simpatizantes no Brasil que viam na política de “América Primeiro” um reflexo das próprias políticas nacionais. No entanto, a administração Trump também foi marcada por escândalos e controvérsias, incluindo tentativas de impeachment e investigações judiciais, que lançaram uma sombra sobre sua gestão.

Em contraste, o governo de Joe Biden, com uma abordagem mais progressista em questões como imigração e meio ambiente, atrai uma esquerda moderada no Brasil. Políticas como a reentrada dos EUA no Acordo de Paris e uma postura mais humanitária em relação aos imigrantes são vistas como avanços por aqueles que defendem justiça social e desenvolvimento sustentável.

O Papel das Eleições e o Impacto na América Latina

A recente notícia de que Biden desistiu da corrida eleitoral para um segundo mandato levanta questões significativas. Historicamente, é raro que presidentes em exercício nos Estados Unidos desistam de buscar a reeleição, especialmente durante o processo eleitoral. O exemplo mais notável é o de Lyndon B. Johnson, que em 1968 optou por não buscar a reeleição em meio à crescente oposição à Guerra do Vietnã e tensões dentro do Partido Democrata.

Essa decisão de Biden, embora “inesperada”, pode ser considerada como um movimento estratégico, no que pese o recente atentado contra Donald Trump e a convenção republicana que voltou os olhares para a candidatura de oposição ao governo Biden.

A retirada de Biden, a essa altura reposicionou os democratas no centro das atenções, destacando a possibilidade de uma transição de poder para uma nova geração ou, potencialmente, para uma mulher, como Kamala Harris ou outro nome democrata. Este movimento tem um simbolismo profundo, já que Kamala além de mulher-negra, tem raizes familiares de imigrantes, o que representa uma significativa mudança em termos de gênero e raça.

Perspectivas para o Brasil e a América Latina

Para os países da América Latina, incluindo o Brasil, as políticas de um governo norte-americano têm impactos diretos e significativos. A abordagem republicana, com ênfase em liberdade econômica e comércio livre, pode oferecer parcerias mais previsíveis e benéficas, facilitando acordos comerciais vantajosos.

Por outro lado, a abordagem democrata, com um foco maior em questões de direitos humanos, meio ambiente e cooperação multilateral, pode beneficiar a América Latina em áreas como financiamento para iniciativas de sustentabilidade, apoio à democracia e combate à corrupção. Esses esforços podem ajudar a fortalecer as instituições locais e promover um desenvolvimento mais inclusivo e sustentável na região.

No entanto, é crucial que os países latino-americanos desenvolvam uma estratégia independente e bem informada, interagindo com qualquer administração dos EUA de forma a maximizar os benefícios dessas relações.

A polarização no Brasil, exacerbada por uma tendência de simplificação dos debates, não deve fragilizar a necessidade de uma análise crítica e informada das políticas internacionais.

É imprescindível traçarmos um paralelo entre alguns conceitos, já que, na prática, esses sugerem grande distinção, a exemplo do nacionalismo.

O nacionalismo americano pode ser ligado a uma visão de liderança mundial e à promoção dos interesses americanos no exterior, muitas vezes através de políticas de defesa e comércio. O Brasil, por outro lado, historicamente oscilou entre o alinhamento com potências estrangeiras e uma política de não-intervenção e neutralidade.

O nacionalismo brasileiro tende a ser mais identitário, focando na proteção da soberania nacional e na busca de uma posição mais independente na política internacional, especialmente em relação às grandes potências. Percebam que existe um abismo entre as ideias inseridas em cada um dos conceitos.

Entender as entrelinhas das disputas políticas nos leva a um passo além das narrativas simplistas, sendo essencial para um debate político mais profundo e construtivo, que realmente aponte para o progresso e o entendimento coletivo em uma conjuntura de desafios globais.

É importante destacar que, independentemente de quem saia vitorioso na corrida eleitoral norte-americana — seja pela torcida pelo o enfraquecimento ou fortalecimento da extrema direita representada por Trump ou pelo entusiasmo em torno do simbolismo de uma mulher negra como Kamala Harris à frente do governo americano — a política imperialista e dominante dos Estados Unidos provavelmente permanecerá inalterada.

Em resumo, o cenário naturalmente incerto pelo contexto eleitoral concebe uma oportunidade para que o Brasil e outros países da América Latina avaliem aspectos importantes de suas relações com os EUA. Independentemente de quem chegue ao salão oval da Casa Branca, é imperativo adotar uma postura nacionalista e diplomática, associando políticas que promovam o desenvolvimento econômico sustentável e a justiça social, sem cair na armadilha do dualismo político simplista.

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