No Brasil, o Instituto Nacional de Câncer (Inca) estimou 704 mil novos casos de câncer para cada ano do triênio 2023-2025. De acordo com estudiosos dos Estados Unidos e do Reino Unido, há um aumento do diagnóstico da condição entre jovens adultos. Um artigo do portal norte-americano New York Post revelou que, na cruzada contra a elevação no número de casos, os oncologistas “apontaram o dedo para o junk food e a carne processada”.
Diante da informação, a coluna Claudia Meireles mobilizou especialistas para saber se, de fato, o junk food e a carne processada podem ser responsáveis pelo aumento do número de câncer entre jovens adultos. Foram requisitados André João Rossi, atuante em oncologia clínica no Instituto de Câncer do Estado de São Paulo pela Universidade de São Paulo (USP); e Gabriel Machado Leite, oncologista da Oncoclínicas do Hospital Santa Lúcia, em Brasília.
Alimentos e câncer
De acordo com Gabriel, a associação de alimentos e câncer é uma questão complexa: “A alimentação nunca está sozinha e não conseguimos dizer que existe só um vilão e defini-lo como o responsável por causar câncer”. O médico destaca que a doença está relacionada a vários outros hábitos de vida capazes de contribuir para um indivíduo vir a apresentar um tumor
“É muito difícil, às vezes, buscar essa associação e ter um vilão só para um câncer que, na maioria das vezes, é multifatorial. Entendendo isso, precisamos ver o que os estudos nos trazem com relação aos alimentos”, aborda o oncologista. Ele acrescenta sobre existir um boom do consumo de junk foods e opções ultraprocessadas em países do Ocidente: “Acredita-se que esses alimentos sejam o grande vilão para a formação da doença.”
Junk foods
Segundo o médico, tanto os junk foods quanto às opções ultraprocessadas podem contribuir para a formação de câncer em jovens adultos por terem quatro fatores relacionados e que merecem atenção. “O primeiro tópico é a composição. Geralmente, são alimentos ricos em gordura total, açúcares e gordura saturada, além da baixa quantidade de fibras e de densidade de vitaminas”, elucida.
Atuante em oncologia clínica, André João Rossi esclarece sobre o junk food ser um termo genérico que inclui uma grande variedade de alimentos. “Trazem em comum o fato de serem de fácil acesso, rápidos para o consumo e ultraprocessados, ou seja, resultam da manipulação industrial excessiva de ingredientes”, evidencia. Na avaliação do médico, o crescimento do consumo dessas opções se tornou um “fenômeno mundial” entre os mais jovens.
“São alimentos que dispõem, em sua composição, do excesso de calorias normalmente derivadas de gorduras saturadas e carboidratos de rápida absorção, além de açúcar adicionado, como o branco, xarope de frutose e xarope de milho. Também são ricos em sódio e sem quantidades significativas de nutrientes”, destaca o especialista do Instituto de Câncer do Estado de São Paulo pela USP.
André João enfatiza que a ingestão de junk foods tem ligação com hábitos de vida mais sedentários. Consequentemente, essa rotina mais inativa favorece o aumento da incidência de sobrepeso e obesidade que, por sua vez, está associada à elevação do risco de diversos tipos da doença, como o de mama, intestino grosso e endométrio, conforme argumenta o médico.
Depois da composição, o oncologista Gabriel Machado Leite faz uma alerta quanto à forma de preparo desses alimentos: “Muitas vezes, como o aquecimento é feito e a maneira de ser frito ou assado tendem a contribuir para [a presença de] certos elementos, com propriedades cancerígenas, como os hidrocarbonetos aromáticos e as aminas heterocíclicas. Isso pode estar ajudando para que esses alimentos ofereçam algum risco na formação do câncer”.
Gabriel cita como terceiro ponto o modo como os junk foods e opções ultraprocessadas são envoltas. “Acredita-se que a depender da embalagem, esses alimentos entre em contato com produtos que possam ter propriedades cancerígenas”, menciona. O oncologista encerra a lista de quatro fatores com referência aos aditivos, em outras palavras, os pigmentos, aromatizantes e conservantes.
“Apesar de [os aditivos] serem aprovados, há estudos em animais que sugerem uma atividade cancerígena, mas não em humanos. Esse seria o quarto elemento justificante da associação dos junk foods e que podem estar aumentando o caso de câncer em jovens adultos”, ressalta o médico da Oncoclínicas Hospital Santa Lúcia, em Brasília.
Carnes processadas
O oncologista Gabriel Machado Leite sustenta sobre a carne processada seguir “os mesmos princípios de outros ultraprocessados”: “Passa por vários processos de industrialização em que, dependendo o modo de preparo, integra muitos componentes que oferecem fatores de risco para o câncer. É o caso dos aditivos, aromatizantes, conservantes e a quantidade de sal e gordura presente”.
Já o médico atuante em oncologia clínica reforça a respeito das carnes processadas serem perigosas para a saúde por conter determinados componentes. “A presença de nitratos e nitritos nesse tipo de alimento — que levam à formação de aminas, substâncias capazes de lesar o DNA das células intestinais —, principalmente quando é cozido em altas temperaturas”, frisa. André João Rossi garante não existir uma quantidade segura para consumo.
“O risco de câncer colorretal aumenta cerca de 23% a cada porção adicionada de carne processada na alimentação regular”, reforça o especialista.
O oncologista finaliza com uma explicação sobre ser necessário entender “as características, composição, forma de preparo, modo como é embalada e os aditivos presentes nos alimentos”. “A melhor maneira de identificar quais são as opções alimentícias que oferecem risco de causar o câncer é vendo se há muito açúcar, sal, gordura, conservantes e aromatizantes. Caso tenha, vale evitar”, encerra.