Mesmo sem nunca ter andado em um skate de verdade, Maria Luiza, ou simplesmente Maluzzita, como é mais conhecida no mundo gamer, conseguiu um feito inédito. A carioca de 19 anos que nasceu na comunidade da Vila do João, no Complexo da Maré, se classificou em primeiro lugar e vai participar da grande final do World Skate Games que acontece amanhã (19). A jovem, que não tem computador e videogame próprios, treina utilizando equipamentos do tio e da DiversiGames e se tornou a primeira mulher brasileira a participar do torneio realizado em Roma, na Itália. Maluzzita compete na modalidade Skater XL, que simula manobras radicais no ambiente virtual.
Aos 9 anos, Malu se encantou com os jogos eletrônicos e sempre que possível escapava para uma lan house para jogar. E o que era diversão acabou se tornando sua profissão e lhe dando um novo propósito. Aos 14 anos, passou por problemas familiares e enfrentou um início de depressão que foi superado graças a ajuda dos games. Foi nesse momento que ela conheceu um projeto social e teve o primeiro contato com um jogo chamado Valorant, fundamental nesse processo de recuperação. Naquele espaço recebeu as primeiras oportunidades para criar conteúdo e encontrou um novo sentido para a vida.
– Os games e as amizades que eu fiz nos games salvaram a minha vida – desabafou.
Além de atleta de e-sports e produtora de conteúdo, Malu também é embaixadora da DiversiGames – que visa promover acesso ao letramento digital e à cultura gamer para jovens em situação de vulnerabilidade social. Com essa rotina exigente, ela ainda consegue treinar duas vezes por semana e sempre quando sobra um tempo livre.
Malu, no entanto, explica que o acesso aos equipamentos para jogar não é tão simples para quem vem de uma realidade como a dela, mas que tudo é possível com o “jeitinho brasileiro”, nas palavras da atleta. Por isso, ela treina usando as instalações da DiversiGames e também conta com a ajuda do tio que mora ao lado da sua casa.
– Eu sou atleta de skate, mas eu não tenho computador e videogame ainda. Eu jogo na casa do meu tio que tem computador, onde eu passo a maior parte do meu tempo jogando – contou.
Assim, com o apoio da família, ela vai conseguir realizar seu sonho de conhecer a Itália e já está sentindo o gostinho do reconhecimento dentro da própria comunidade. Malu conta que várias meninas já a pararam na rua para dizer que começaram a jogar por causa dela. A respeito dessa influência positiva, ela diz:
– Ser a primeira mulher a se classificar para um campeonato desse é muito incrível porque assim eu mostro para outras meninas que a gente pode tudo o que a gente quer.
Mas ser pioneira nesse mundo dos jogos eletrônicos carrega alguns desafios. Ela explica que muitos jogos ainda são projetados sob um viés masculino e que a receptividade para as mulheres nesse meio ainda é permeada pelo machismo. Ao ouvir comentários misóginos enquanto jogava como “Você é mulher, vai lavar uma louça”, muitas vezes ela se viu obrigada a jogar com o microfone fechado para não revelar sua identidade.
– Ser mulher nos e-sports não é nada fácil. Ganhando ou perdendo sempre vai ter alguém pra falar uma besteira – relata.
Mesmo assim, ela não perde de vista suas referências femininas no esporte. Fã declarada de Rayssa Leal e Pâmela Rosa, ela espera emular as conquistas da Fadinha nas Olimpíadas de Tóquio e Paris. Vale destacar que o Comitê Olímpico Internacional já anunciou a realização das Olimpíadas de e-sports, evento programado para acontecer na Arábia Saudita em 2025. E no que depender da carioca, ela vai seguir levando o Complexo da Maré para o mundo por meio dos jogos:
– É muito gratificante ver os esportes eletrônicos sendo reconhecidos e vai ter Maluzzita na Arábia Saudita, sim – encerrou.