Com Boulos, Nunes e Marçal, SP tem 1º turno mais acirrado em décadas

Paulistanos vão às urnas neste domingo escolher o próximo prefeito e os vereadores de SP após campanha marcada por agressões e mentiras

São Paulo — Depois de vivenciarem a campanha mais agressiva da história da capital, os eleitores paulistanos vão às urnas neste domingo (6/10) escolher quem vai comandar a prefeitura da maior cidade do país diante de um cenário eleitoral imprevisível que é o mais acirrado das últimas quatro décadas em São Paulo.

Pesquisa Datafolha divulgada nesse sábado (5/10) mostra que o deputado federal Guilherme Boulos (PSol), o prefeito Ricardo Nunes (MDB), e o influenciador Pablo Marçal (PRTB) chegam ao primeiro turno com um triplo empate técnico, registrando 29%, 26% e 26% dos votos válidos, respectivamente.

Desde 1985, quando as eleições diretas para prefeito foram restabelecidas no Brasil, após o regime militar (1964-1985), nenhuma disputa pela Prefeitura de São Paulo havia chegado ao “Dia D” da eleição com uma diferença tão pequena, de apenas três pontos percentuais, entre o primeiro e o terceiro colocados nas pesquisas realizadas na véspera do pleito — os dois mais votados disputarão o segundo turno em 27 de outubro.

O cenário mais parecido com o da eleição atual foi o de 2012, quando o Datafolha mostrava José Serra (PSDB) com 24%, Celso Russomanno (Republicanos), com 23%, e Fernando Haddad (PT), com 20%. Naquele ano, Serra (30,7%) e Haddad (28,9%) avançaram para o segundo turno e o petista acabou sendo eleito.

Na última eleição, em 2020, o ex-prefeito Bruno Covas (PSDB), morto em 2021, chegou no primeiro turno com 20 pontos de vantagem sobre Boulos no Datafolha — no segundo turno, o tucano venceu. Quatro anos antes, João Doria aparecia com 44% na pesquisa de véspera, ante 16% de Haddad, e levou a disputa no primeiro turno.

Ao todo, dez candidatos disputam a Prefeitura paulistana. Além do trio que chega liderando a corrida, a deputada federal Tabata Amaral (PSB), com 11%, o apresentador José Luiz Datena (PSDB), com 4%, e a economista Marina Helena (Novo), com 2% dos votos válidos, também pontuaram no Datafolha desse sábado.

Mais de 9,3 milhões de eleitores estão aptos a digitar seus votos nas urnas eletrônicas espalhadas em mais de 2 mil locais de votação. As sessões eleitorais abrem às 8h e fecham às 17h. Além do prefeito, os paulistanos também escolheram, entre 1.016 candidatos, os próximos 55 vereadores que vão representar a população na Câmara Municipal.

As mulheres representam 54% do eleitorado, enquanto os homens são 46 %. A faixa etária com maior número de eleitoras e eleitores é aquela entre 45 e 59 anos, com mais de 2,38 milhões.

Segundo o Tribunal Regional Eleitoral, São Paulo já teve 58 prefeitos desde o período do Império — eles ocuparam o cargo por eleição direta ou indireta, por nomeação ou por terem assumido o posto após renúncia ou impedimento do titular. Esta é a 28° eleição municipal realizada na capital desde que a Justiça Eleitoral foi criada, em 1932.

Montagem sobre Reprodução TV

Campanha acirrada

A disputa eleitoral em São Paulo começou, em agosto, já com o cenário mais acirrado dos últimos 28 anos. Nas primeiras pesquisas, Nunes e Boulos protagonizavam uma polarização que parecia espelhar o duelo entre seus respectivos aliados políticos — Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL) — na eleição de 2022, seguidos por Datena.

Com desempenho ruim nos primeiros debates e uma postura de anticandidato nas ruas — sem pedir votos e mostrando desconhecer até mesmo o número do próprio partido —, Datena saiu da posição de destaque nas pesquisas até derreter à quinta posição nos levantamentos mais recentes, ficando atrás de Tabata, inclusive.

Já Marçal, famoso na internet por sua atuação como coach, viu a popularidade crescer ao se vender como o candidato “antissistema” da vez e adotar uma postura altamente agressiva para chamar a atenção, como ele mesmo admitiu. Competindo com o prefeito pelos votos do eleitorado bolsonarista, o influencer subiu rapidamente para os três primeiros postos das pesquisas eleitorais até chegar ao dia do pleito com chances reais de ir ao segundo turno.

Debates agressivos

Marcada por ofensas pessoais em série, agressões físicas em debates e acusações de corrupção, ligação com o tráfico e até de uso de drogas, a campanha eleitoral paulistana contou com o uso sistemático das redes sociais, reverberou em batalhas jurídicas e colocou à prova a influência de padrinhos políticos e de grandes alianças partidárias.

Promovido pela TV Bandeirantes, o primeiro dos 11 debates entre os principais candidatos desta eleição teve Marçal insinuando que Boulos era usuário de cocaína. Apesar das reiteradas promessas e das condenações na Justiça Eleitoral, o candidato do PRTB nunca apresentou provas da acusação e nunca voltou atrás na fala.

No debate da TV Globo, na última quinta-feira (3/10), o candidato do PSol exibiu um exame toxicológico para provar que não usa drogas e desafiou o rival do PRTB a fazer o mesmo. Na noite seguinte, na última sexta-feira (4/10), Marçal postou um laudo médico falso no qual constava que Boulos havia sido internado em janeiro de 2021 em uma clínica no Jabaquara, zona sul de São Paulo, com “surto psicótico” e cocaína no sangue.

O laudo foi prontamente desmentido por Boulos, que apontou uma série de inconsistência no suposto documento, como erro no número do RG, assinatura de um médico falecido e uma foto dele em uma ação numa comunidade da cidade no dia seguinte à suposta internação.

O candidato do PSol pediu a prisão de Marçal por propagar mentira a um dia da eleição, mas a Justiça Eleitoral indeferiu o pedido e ordenou que a suspensão das redes do influenciador por 48 horas. Ao Metrópoles, as filhas do médico citado no laudo desmentiram Marçal, dizendo que o profissional nunca havia trabalhado naquele clínica, que pertence a um amigo do influenciador. No fim da tarde desse sábado (5/10), o Instituto de Criminalística (IC) divulgou uma perícia confirmando que a assinatura do médico foi falsificada.

A postura agressiva de Marçal se estendeu também a outros adversários, que ganharam apelidos jocosos, como “bananinha”, no caso de Nunes, e “para-choque de comunista”, no caso de Tabata, e foram alvo de provocações e mentiras. Depois do segundo debate, quando o influencer usou uma carteira de trabalho pagar fingir “exorcizar” Boulos, que reagiu dando um tapa no documento, as campanhas passaram a exigir regras mais duras das organizações dos eventos televisivos.

Boulos, Nunes e Datena chegaram a faltar a um dos debates, promovido pela revista Veja, como estratégia para tentar frear Marçal. O evento contou, no entanto, com a participação de outras duas adversárias, Tabata e Marina Helena (Novo), e as equipes acabaram confirmando presença nos debates seguintes.

Mesmo com regras mais duras, os encontros de adversários seguiriam sendo palco de trocas de ofensas generalizadas e clima tenso, principalmente entre Marçal, Nunes, Datena e Boulos. Com pouca discussão de propostas sobre a cidade, os candidatos repetiram acusações uns contra os outros até o fim da campanha, fazendo associações dos rivais com o Primeiro Comando da Capital (PCC) e relembrando polêmicas como o boletim de ocorrência de violência doméstica registrado pela mulher de Nunes contra ele, em 2011.

O ápice da violência entre os postulantes aconteceria no debate seguinte, promovido pela TV Cultura. Marçal, que chamara Datena de estuprador logo no início do evento, relembrando uma acusação de assédio contra o apresentador, provocou novamente o tucano, dizendo que ele “não era homem” nem para agredi-lo.

“Você é um arregão. Atravessou o debate esses dias para me dar um tapa e falou que queria ter feito. Você não é homem nem para fazer isso”, disparou o influencer.

Datena deixou o púlpito em que estava e agrediu Marçal com uma cadeira usada por Marina Helena. O tucano acabou expulso do debate e o influencer foi levado a um hospital, com “traumatismo na região do tórax à direita e em punho direito, sem maiores complicações associadas”, segundo o boletim médico.

Dias depois, outro episódio de violência também foi registrado em um encontro dos adversários, desta vez envolvendo um produtor da campanha de Marçal que deu um soco no marqueteiro de Nunes, Duda Lima. O caso aconteceu nos bastidores, logo após Marçal ser expulso do debate do Flow por desrespeitar as regras da organização e fazer ofensas pessoais a Nunes durante suas considerações finais.

Já o último debate da eleição à Prefeitura de São Paulo, promovido pela TV Globo na noite da última quinta-feira (3/10), mostrou Ricardo Nunes acuado em meio aos sucessivos ataques dos adversários e projetou confrontos entre o deputado federal Guilherme Boulos e o influenciador Pablo Marçal, cotados a avançarem para o 2º turno da disputa na capital paulista, que está marcado para o dia 27 de outubro.

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