Projeto de lei de autoria do deputado federal Coronel Ulysses Araújo (UB-AC), aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, muda os preceitos das audiências de custódia atualmente em vigor. Lançadas em 2015, as audiências de custódia consistem na rápida apresentação da pessoa que foi presa a um juiz, em uma audiência onde também são ouvidos um membro do Ministério Público, um integrante da Defensoria Pública ou o advogado do preso.
No caso concreto, o juiz analisa a prisão sob o aspecto da legalidade e a regularidade do flagrante, da necessidade e da adequação da continuidade da prisão, de se aplicar alguma medida cautelar e qual seria cabível, ou da eventual concessão de liberdade, com ou sem a imposição de outras medidas cautelares. A análise avalia, ainda, eventuais ocorrências de tortura ou de maus-tratos, entre outras irregularidades.
A implementação das audiências de custódia está prevista em pactos e tratados internacionais de direitos humanos internalizados pelo Brasil, como o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos e a Convenção Americana de Direitos Humanos. Além disso, a realização das audiências de custódia foi confirmada pelo Supremo Tribunal Federal ao julgar, em 2015.
Desde janeiro de 2019, a qualificação, a consolidação e a expansão das audiências de custódia é um dos temas trabalhados na parceria entre o Conselho Nacional de Justiça e o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, com o apoio do Ministério da Justiça e Segurança Pública, para enfrentar problemas estruturais no sistema prisional e socioeducativo do país – hoje o programa Fazendo Justiça. As ações sobre audiências de custódia são executadas em parceria com o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime.
O projeto de Ulysses Araújo pretende rever tudo isso. O deputado propõe que passaria a ser obrigatória a prisão preventiva de presos envolvidos em crimes hediondos, roubo, associação criminosa, além de reincidentes, durante as audiências de custódia. O projeto ainda prevê o depoimento dos policiais responsáveis pela prisão em flagrante dessas pessoas.
Além do parecer favorável da CCJ, o projeto do deputado acreano tem pedido de urgência, com apoio de mais de 400 deputados, para ser votado no plenário da Câmara. O projeto altera o art. 310 do Código de Processo Penal (CCP), que regulamenta as audiências de custódia.
“A proposta representa um avanço significativo no fortalecimento dos princípios e da equidade”, destacou o deputado Kim Kataqui (União–SP), relator do PL de Ulysses na CCJ. Segundo ele, o projeto de Ulysses, “ao estabelecer exigências específicas sobre a liberdade provisória, promove a transparência e a responsabilização do Judiciário”. Além disso, o projeto aumenta a confiança da população nas instituições, reduzindo o sentimento popular de que “a polícia prende, mas a Justiça solta”.
Ainda, conforme o parecer, a ideia de Ulysses de garantir a oitiva de policiais nas audiências de custódia permite uma análise mais equilibrada dos fatos, evitando, desse modo, que a narrativa do acusado prevaleça sem contestação. “Quem comete crime tem uma enorme possibilidade de mentir para se defender. Sem a oitiva dos policiais que fizeram o flagrante, é enorme a possibilidade da mentira prosperar”, disse o deputado, ao justificar sua proposta. “Incluir os policiais na audiência [de custódia] assegura que as suas versões e condições de atuação sejam consideradas, reforçando a proteção dos direitos humanos no sistema prisional”, destaca o relator da proposta.
Segundo ele, o depoimento dos policiais pode fornecer informações cruciais sobre a abordagem, a legalidade da detenção e as circunstâncias em que os fatos ocorreram, ajudando o juiz a formar uma visão mais completa do caso. Atualmente, face à falta de previsibilidade de oitava dos policiais responsáveis pela prisão, criminosos de alta periculosidade [reincidentes em crimes hediondos, roubo e associação criminosa], são liberados com facilidade nas audiências de custódia, com a alegação de suposto excesso praticado por policiais.
O projeto dispõe ainda que o prazo para a realização da audiência de custódia aumenta para 72 horas após a prisão. Atualmente, a pessoa detida enquanto comete um crime ou após cometê-lo, deve ser apresentada a um juiz em até 24 horas após a prisão, conforme a resolução 213/2015 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), para ser submetida à audiência de custódia.
Na opinião do relator, a dilação do prazo coaduna com as boas práticas internacionais em matéria de justiça penal, e tem a finalidade de evitar a sobrecarga das autoridades policiais e judiciárias, além de ensejar um prazo mais razoável para a elaboração da defesa técnica [por advogado ou defensor público] do acusado.
Para Ulysses, o fato de o relator da CCJ dar parecer favorável ao seu projeto, “é, sem dúvida, prova cabal de que estamos no caminho certo em lutar para endurecer as leis penais e processuais penais para dificultar a vida de bandidos, particularmente de integrantes do crime organizado”.
De acordo com Ulysses Araújo, o atual modelo de audiência de custódia, além de beneficiar criminosos, desacredita o sistema de justiça criminal, pois fortalece na sociedade e no público policial a sensação de impunidade. Na opinião da Ulysses, hoje a ausência de regras limitando o relaxamento da prisão ou concessão de liberdade provisória no art. 310, do CCP, nos casos de crimes hediondos, roubo, associação criminosa, ou quando configurada a reincidência criminal, reforça cada vez mais os questionamentos da sociedade quanto à atuação do Poder Judiciário, externados no dito popular de que “a polícia prende, mas o Judiciário solta”.
A ausência desses limites, observa Ulysses, “além de impulsionar a percepção de impunidade na sociedade, desestimula a ação diária dos operadores de segurança pública no combate ao crime”. “Nosso projeto vem para mudar essa realidade”, explica Ulysses, ao comemorar o parecer favorável de Kim Kataguiri.