As profissões mais antigas da humanidade não só moldaram a história como também continuam a exercer impacto no mundo contemporâneo. Segundo Camilie Cardoso, historiadora pela USP e consultora de cultura organizacional, essas são as profissões mais antigas que se tem registro:
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Ferramenteiro – cerca de 2,6 milhões de anos
Pelos registros arqueológicos já encontrados, a produção de ferramentas foi iniciada na Etiópia há mais de 2 milhões de anos, o que significa que essa é a profissão mais antiga do mundo, afirma a historiadora. “Essas peças incluíam pedaços de rochas, lascas afiadas feitas de quartzo, obsidiana e sílex, e eram utilizadas sobretudo para caçar e abater animais”.
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Contadores de história – cerca de 200.000 anos
Esse ofício está presente em muitas profissões até os dias de hoje, como o de jornalistas, redatores e escritores. “Surgiram no continente africano transmitindo suas narrativas por meio da história oral. Essa prática de contar histórias foi registrada e instrumentalizada pela linguagem escrita em 3100 a.C.”, diz Cardoso.
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Alfaiates – entre 100.000 e 500.000 anos
Antropólogos estimam que as roupas surgiram em diferentes locais do continente africano entre 100.000 anos e 500.000 anos atrás. “As vestimentas eram simples e usadas sobretudo pelos ancestrais que viviam em climas mais frios, para a sua proteção”, afirma Cardoso.
A necessidade da produção do tecido e sua customização para que pudessem ser utilizados criou, ainda nos tempos antigos, a profissão dos alfaiates.
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Artistas – cerca de 50.000 anos
As pinturas rupestres mais antigas já encontradas foram feitas por um neandertal, na caverna de Altamira, na Espanha. Dada a dificuldade de promover esse registro artístico e mnemônico com os recursos daquele período, era necessário o domínio de uma técnica para fazê-lo. “É possível que nossos ancestrais já dominassem a capacidade de produzir esses registros rupestres antes de migrar de África para os atuais territórios europeus, há mais de 65 mil anos, mas a geologia dificulta que elas sejam encontradas”, afirma a historiadora da USP.
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Músico – cerca de 40.000 anos
Os instrumentos mais antigos de que se tem registro foram encontrados na região em que se localiza a caverna Hohle Fels, na Alemanha. “Em escavações, foram recuperadas várias flautas que datam do período paleolítico, o que sugere a presença de uma tradição musical já naquela época”, diz. “Consequentemente, aponta também para a existência de músicos e musicistas como uma das profissões mais antigas.”
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Empreiteiro – entre 10.000 e 15.000 anos
O estabelecimento de comunidades com habitação fixa na Antiga Mesopotâmia veio acompanhado da necessidade de construir assentamentos para essas populações, o que levou ao nascimento do ofício dos(as) construtores(as). “As casas eram a princípio construídas pelos seus próprios moradores de forma empírica, mas, com o passar do tempo, surgiram especialistas que dominavam essas técnicas”, diz Cardoso.
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Agricultor – entre 12.000 e 13.000 anos
Devido à mudança das formas de ocupação territoriais nômades para “sedentárias”, a Antiga Mesopotâmia também foi palco do nascimento da profissão de agricultor.
“Essa figura emergiu quando nossos ancestrais deixaram de ser caçadores e coletores para começar o cultivo de algumas espécies – começando por grãos como centeio, trigo e cevada.”
Outras profissões antigas
Há outras profissões que não se tem registro de quando surgiram, mas que estão presentes ainda hoje, afirma Joaquim Santini, pesquisador internacional.
- Curandeiro: precursor da medicina moderna, o curandeiro é responsável por cuidar da saúde e tratar doenças utilizando conhecimentos tradicionais e, muitas vezes, práticas espirituais.
- Comerciante: o comércio e a troca de bens e serviços é uma atividade econômica básica desde as primeiras civilizações.
- Pescador: a pesca como meio de subsistência e alimentação é uma atividade que remonta aos primórdios da humanidade.
- Serviços sexuais: a oferta de serviços sexuais em troca de dinheiro ou bens é uma atividade que tem registros históricos desde a antiguidade, em diferentes culturas ao redor do mundo.
- Soldado: guerreiros e defensores estão presentes desde as primeiras civilizações, lutando em conflitos, protegendo territórios e servindo a líderes e Estados.
- Cozinheiro: preparar e cozinhar alimentos é uma atividade básica e essencial que acompanha a humanidade desde o domínio do fogo.
“Essas profissões perduraram, porque atenderam a necessidades humanas fundamentais e se beneficiaram dos avanços da ciência e da tecnologia para se tornarem mais eficientes, precisas e inovadoras”, afirma Santini.
Como as profissões resistiram ao tempo?
As profissões que resistiram ao tempo, como por exemplo, medicina, agricultor, ferreiro e artesão, conseguiram se manter relevantes e adaptáveis ao longo dos anos devido a uma série de fatores interligados, mas dois se destacam: necessidade humana e investimentos em novas tecnologias, afirma Luciana Veloso Baruki, auditora em fiscalizações de assédio no Ministério do Trabalho, advogada e médica pós-graduanda em saúde do trabalho.
Ferreiro
Embora modernizada pelo uso de máquinas e novas técnicas, a profissão de ferreiro permanece relevante em comunidades que valorizam o artesanato e a produção manual. “A preservação de tradições e o apelo por itens personalizados sustentam a continuidade dessa profissão”, afirma Baruki.
Medicina (anteriormente curandeiro)
A medicina evoluiu de práticas ancestrais para um campo moderno e tecnológico, incorporando avanços científicos e novos tratamentos. “A formação contínua e a especialização mantêm os profissionais atualizados, enquanto a crescente demanda por cuidados de saúde, impulsionada pelo envelhecimento da população, garante sua relevância”, afirma Baruki.
Santini lembra que o conhecimento médico evoluiu do empirismo dos curandeiros para a medicina científica moderna, incorporando avanços como a teoria dos germes e os antibióticos. “A busca por cura e bem-estar é universal”.
Agricultor
A agricultura é uma das profissões mais antigas e essenciais, sustentada por inovações como a agricultura de precisão e práticas sustentáveis, afirma Baruki. “Essas inovações permitiram a adaptação à crescente demanda alimentar e às mudanças climáticas, consolidando sua relevância na sociedade moderna.”
O avanço tecnológico é muito forte e preciso no ramo, afirma, Santini. “A necessidade de alimentos é contínua. Os agricultores têm se adaptado a novas tecnologias, desde o arado até o GPS, e a novas técnicas para aumentar a produtividade”.
Artesão
Os artesãos sobrevivem pela capacidade de criar produtos únicos e personalizados, adaptando-se ao mercado digital para alcançar novos públicos, afirma Baruki. “A valorização de autenticidade e originalidade no consumo garante a longevidade do ofício.”
Soldado
A necessidade de defesa e conquista persistiu, afirma Santini. “Os soldados se adaptaram a novas tecnologias e estratégias, desde espadas até drones.”
Comerciante
A troca de bens e serviços é fundamental para a economia. Os comerciantes têm se adaptado a novos produtos, rotas e tecnologias, desde o escambo até o e-commerce, conta Santini.
Pescador
Os pescadores têm se adaptado a novas tecnologias (como sonar) e práticas sustentáveis para lidar com a sobrepesca, diz Santini.
Cozinheiros
Têm se adaptado a novos ingredientes, técnicas e estilos, incorporando influências de diferentes culturas, diz Santini.
Empreiteiro
Essa profissão surgiu há milhares de anos com as primeiras grandes construções humanas, como templos, casas e sistemas de irrigação, continua a ser essencial devido à evolução das necessidades de infraestrutura e habitação. “Empreiteiros se adaptaram à modernidade com o uso de máquinas, softwares de planejamento e técnicas avançadas de construção”, diz Cardoso.
Alfaiates
A necessidade de roupas e tecidos é contínua, afirma Santini. “Os tecelões se adaptaram a novos materiais, como fibras sintéticas, e tecnologias, como teares mecânicos.”
Serviços sexuais
Apesar das mudanças legais e morais, a profissão persiste. “Muitas vezes à margem da sociedade”, diz Santini.
Contadores de história
Hoje, a prática de contar histórias está presente em diversas áreas, como literatura, teatro, cinema, podcasts e até mesmo marketing digital. “Com o advento da tecnologia, muitos contadores de histórias migraram para o ambiente digital, utilizando redes sociais, vídeos e audiolivros para alcançar públicos maiores. Essa evolução garante a continuidade da profissão em um mundo onde a necessidade por boas histórias permanece universal”, afirma a historiadora Cardoso.