Michel Temer (MDB) era presidente quando Donald Trump se elegeu pela primeira vez nos Estados Unidos, em 2016. Manteve uma relação institucional com o americano e, agora, avalia que um segundo mandato do republicano terá efeitos limitados sobre o Brasil -o que inclui uma eventual pressão para reverter a inelegibilidade de Jair Bolsonaro (PL).
“Eleito Trump nos EUA, isso vai influenciar o Judiciário daqui? Eu não acredito”, afirma Temer, que em 2021 atuou como ponte para reduzir tensões entre o então presidente e o STF (Supremo Tribunal Federal).
“Veja o que o Alexandre [de Moraes] fez no caso do Elon Musk. A posição dele foi firme”, diz.
Temer também classifica de “brincadeira” informações que circularam de que ele poderia ser vice de Bolsonaro caso ele revertesse sua inelegibilidade. “Achei esquisitíssimo”.
PERGUNTA – O sr. era presidente durante os primeiros anos de Trump. Como um novo mandato do republicano afeta a relação com o Brasil?
MICHEL TEMER – A relação que haverá não será Lula com Trump. É o presidente da República Federativa do Brasil com o presidente dos EUA, uma relação institucional.
A pergunta que ouço é: isso vai prejudicar a relação com o Brasil? Não prejudica coisa nenhuma. Basta que o governo brasileiro tenha previdência, e o presidente Lula já mandou cumprimentar o Trump. Não se deve alimentar nem um lado nem outro, como aquilo que o Lula disse antes da eleição, que preferia a Kamala [Harris, candidata democrata], acho que não vale a pena.
P – Não vê impactos nem das políticas propostas por Trump para a economia?
MT – Isso é o tempo que vai dizer. Não é a eleição dele que vai definir, agora. Pode haver impactos caso haja uma redução de importações, e ainda assim no plano institucional, de Estado para Estado.
P – A vitória de Trump pode mudar a situação da inelegibilidade de Bolsonaro, como gostariam aliados dele, a partir de uma pressão americana sobre o STF?
MT – Eu não acho que isso vá acontecer. Pode eventualmente ser usado como argumento, mas não no campo jurisdicional. Se ele se tornar elegível, será por uma eventual disposição do Judiciário.
Efetivamente, para você cuidar dessa questão da inelegibilidade, tem que contar com o Poder Judiciário. Eleito Trump nos EUA, isso vai influenciar o Judiciário daqui? Eu não acredito. Você veja o que o Alexandre [de Moraes, ministro do STF] fez no caso do Elon Musk [empresário dono do X]. Por mais pressões variadas que existissem, a posição dele foi firme.
P – O sr. já fez o papel de ponte entre Bolsonaro e o STF. Faria isso de novo para ajudá-lo, neste caso?
MT – Naquele 7 de Setembro [de 2021], Bolsonaro pediu meu auxílio, falei com Alexandre, combinamos uma fórmula que resultou naquele comunicado à nação [em que Bolsonaro negou “intenção de agredir” outros Poderes, dois dias depois de chamar Moraes de “canalha”]. Era, na verdade, para pacificar o país, porque aquilo poderia dar num grande conflito civil. Agora, eu não vou entrar, a não ser que me peçam para opinar, e isso não ocorreu.
Eu acho que o Judiciário fez muito bem de apenar [impor pena] aquelas pessoas que tentaram, não sei se golpe de Estado ou não, mas que violaram os Poderes de Estado, porque invadiram fisicamente as sedes. O Supremo não tinha outra solução.
O que pode ocorrer é, por medida judicial, num dado momento, o Judiciário dar uma solução redutora da pena, por exemplo. Mas eu aplaudo a decisão do Supremo e, no particular, do Alexandre.
P – Nos últimos dias, circularam rumores de uma chapa Bolsonaro-Temer caso ele recupere o direito de se candidatar. Essas conversas existem?
MT – Aquilo é uma brincadeira, só pode ser. Achei esquisitíssimo.
P – Bolsonaro diz que não descartaria essa hipótese.
MT – Se ele disse isso, então ele foi delicado. Se ele falasse que descarta, poderiam achar que sou eu que estou querendo…