O Tribunal de Justiça do Acre (TJAC), aproveitando novembro como o mês nacionalmente dedicado ao Tribunal do Júri Popular, está promovendo, em meio à população em geral, uma campanha esclarecendo o funcionamento da instituição, que tem origem no Império Romano, na Roma Antiga, e que perdura até os dias atuais ao redor do mundo, nas nações democráticas, entre elas o Brasil. O Tribunal do Júri Popular é formado por pessoas escolhidas entre cidadãos de uma comunidade para julgarem, com independência e sem qualquer tipo de subordinação, os crimes cometidos contra a vida, o chamado Conselho de Sentença.
No Brasil, com a denúncia formulada pelo Ministério Público e aceita por uma vara especializada, seja ela criminal ou do Tribunal do Júri, é lançada a sentença de pronúncia. Isso significa que, de pronto, a Justiça enxerga nas denúncias indícios de crime e autoria definida, e, então, passa-se a formar o Conselho de Sentença, composto pelo corpo de jurados. Composto por sete pessoas, maiores de idade e de ambos os sexos, escolhidas por sorteio, com seus perfis analisados pela acusação (MP) e pela defesa do réu ou réus, o Conselho decide pela culpa ou inocência do acusado. Conhecido o veredicto, o juiz de Direito da unidade, que preside a sessão judiciária, deve tão somente realizar a fixação da pena.
Os membros do Conselho de Sentença, geralmente funcionários públicos, têm algumas imunidades em relação aos demais membros da comunidade que não participam dos Conselhos de Sentença. Uma dessas vantagens é, por exemplo, a condição ser considerada em disputas em concursos públicos.
A Constituição Federal de 1988 e o Código de Processo Penal (CPP) preveem que os julgamentos de crimes dolosos contra a vida, tanto na forma consumada quanto na forma tentada, são de competência exclusiva do Tribunal do Júri. Em seu art. 5º, a Constituição Federal reconhece a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei, sendo assegurados a plenitude de defesa, o sigilo das votações, a soberania dos veredictos e a competência para os crimes dolosos contra a vida, como homicídios qualificados, feminicídios, infanticídios e induzimento ao suicídio. O Código de Processo Penal também prevê os procedimentos relativos aos processos de competência do Tribunal do Júri (arts. 406 e seguintes).
O julgamento pelas Varas do Tribunal do Júri começa com a instrução preliminar, na qual ocorre o oferecimento da denúncia pelo Ministério Público. Em seguida, o magistrado passa a analisar se há, nos autos, a comprovação da materialidade do delito e a existência de “indícios suficientes” de autoria, aceitando ou rejeitando, por falta de provas, a representação criminal.
Em seguida, vem a fase da “pronúncia”, na qual, uma vez apresentado o caso pelo Ministério Público e presentes os requisitos legais, cabe ao juiz de Direito da unidade judiciária lançar sentença de pronúncia do denunciado ao julgamento pelo Conselho de Sentença da unidade judiciária.
Já na fase de julgamento propriamente dita, o Conselho de Sentença (corpo de jurados) deve responder a questões objetivas como: se o réu foi o autor do fato, se incidem circunstâncias qualificadoras e/ou agravantes – e se o denunciado é culpado ou não pelas práticas criminosas a ele imputadas, bem como se deve ser absolvido.
A fase de julgamento consiste em três diferentes etapas:
- Preparação, na qual é realizado o sorteio dos jurados que irão participar do Conselho de Sentença;
- Sessão de julgamento propriamente dita, que é quando as partes apresentam suas respectivas provas e argumentos aos jurados;
- Deliberação do veredicto, quando os jurados decidem sobre a culpa do (s) réu (s) quanto às acusações imputadas pelo Ministério Público.
No caso de os jurados deliberarem que o denunciado é culpado, seguindo o rito da lei, compete ao juiz da Vara do Tribunal do Júri fixar a pena privativa de liberdade, sopesando as atenuantes (como a confissão espontânea e a menoridade relativa), agravantes (meio cruel e recurso que impossibilitou a defesa da vítima, por exemplo) e as causas de aumento de pena (como concurso de pessoas e motivação torpe), para não incorrer no chamado bis in idem, termo em latim para “duas vezes sobre o mesmo”. No jargão jurídico, refere-se à situação em que uma pessoa é punida ou julgada duplamente pelo mesmo fato – princípio proibido em diversos sistemas jurídicos, por violar direitos humanos fundamentais.
Os julgamentos pelo Tribunal do Júri têm um andamento diferenciado das Varas Criminais genéricas, o que resulta em um tempo maior de tramitação, em decorrência de fatores como a complexidade do caso (geralmente envolvem mais investigações, perícias e testemunhas); maior número de fases processuais, cada uma com prazos específicos e possibilidade de recursos; tempo para selecionar e instruir os jurados; o direito à plena defesa, que prevê que o réu tenha direito à defesa completa, o que pode incluir audiências, apresentação de provas e testemunhas (8 na fase de instrução e 5 na fase de plenário, incluindo peritos e informantes); além dos argumentos finais de cada parte envolvida.
Também são motivos para a tramitação mais longa: o maior volume de provas e de testemunhas, o longo tempo das audiências, as deliberações dos jurados, intervalos e suspensões e até mesmo questões emocionais, já que algumas pessoas chegam a passar mal durante as audiências, devido à forte carga psicológica.
O Princípio da Soberania do Júri é uma garantia constitucional no Brasil que estabelece que as decisões do Tribunal do Júri são soberanas – isto é, devem ser respeitadas e têm primazia sobre qualquer outro julgamento. Isso significa que os veredictos não podem ser alterados ou desconsiderados, exceto em situações específicas previstas na lei. Esse princípio destaca o papel fundamental da participação popular no julgamento dos crimes dolosos contra a vida, assegurando que a decisão do júri, formado por cidadãos comuns, seja a última palavra sobre a culpa ou inocência do réu.