Monitoramento do Pix: mais uma barreira para o trabalhador e o pequeno empresário

Embora o governo insista que o Pix não será taxado, a medida já gera desconfiança e temor entre trabalhadores, pequenos empresários e a população em geral

Desde 1º de janeiro de 2025, a Receita Federal iniciou o monitoramento de transações financeiras acima de R$ 5 mil mensais para pessoas físicas e R$ 15 mil para empresas.

Brasil mantém um dos sistemas tributários mais complexos do mundo/Foto: Reprodução

Embora o governo insista que o Pix não será taxado, a medida já gera desconfiança e temor entre trabalhadores, pequenos empresários e a população em geral. O argumento oficial é que a medida ajudará a combater a sonegação fiscal e a lavagem de dinheiro. Contudo, sabemos que crimes financeiros de grande vulto raramente passam por mecanismos simples como o Pix.

Essas práticas utilizam estruturas sofisticadas – como empresas de fachada e paraísos fiscais – que escapam do alcance de uma medida como essa. Então, quem está realmente sendo impactado? Pense no trabalhador médio, como um pedreiro que recebe valores para comprar materiais de construção. Ele movimenta R$ 5 mil ou mais mensalmente, mas seu ganho real é uma fração disso. Esses valores transitam pela sua conta porque fazem parte da logística do trabalho, não como lucro pessoal.

Agora, com a nova fiscalização, esse pedreiro pode ser obrigado a justificar essas movimentações, enfrentando o risco de cair na malha fina ou de ser penalizado por uma regra que não foi desenhada para sua realidade. E, enquanto o pequeno trabalhador lida com esse ônus, o Brasil mantém um dos sistemas tributários mais complexos do mundo.

Em países como os Estados Unidos e o Reino Unido, o contribuinte consegue declarar seus impostos de forma simples e intuitiva. No Brasil, por outro lado, a entrega da declaração de Imposto de Renda é quase impossível sem a ajuda de um contador.

A Receita Federal deveria focar na simplificação do sistema tributário antes de ampliar fiscalizações que, em vez de ajudar, complicam ainda mais a vida do cidadão. Além disso, a implementação dessa medida foi mal planejada. A comunicação falhou em esclarecer seus objetivos, abrindo espaço para desinformação e boatos. Muitos acreditaram, por exemplo, que o Pix seria taxado – uma narrativa que se espalhou como fogo nas redes sociais e que o governo demorou a desmentir. O resultado? Um ambiente de desconfiança, que prejudica o uso de uma ferramenta essencial para a economia brasileira.

Embora o governo reforce que o Pix não será “taxado”, ele está sendo utilizado como ferramenta de monitoramento para identificar tributos não declarados. Isso gera, na prática, um impacto semelhante ao de uma tributação direta: a fiscalização atinge quem movimenta valores legítimos, mas que não representam vantagens econômicas reais. É o caso de empréstimos entre familiares ou a divisão de despesas domésticas – transações que agora podem colocar o contribuinte sob o escrutínio da Receita.

Se o objetivo é aumentar a arrecadação e reduzir a sonegação, o caminho precisa ser diferente. Priorizar a fiscalização de grandes operações, criar ferramentas de autodeclaração simples e modernizar o sistema tributário são estratégias que promovem transparência sem prejudicar os mais vulneráveis. Penalizar o pequeno trabalhador e o empresário de forma desproporcional não é o caminho.

O Pix é uma inovação que democratizou o acesso a transações financeiras. Mas a maneira como o governo está usando essa ferramenta para fiscalizar as finanças do cidadão pode minar sua confiança e frear a inclusão financeira. Medidas como essa deveriam ser implementadas com maior cuidado, ouvindo as necessidades da população e priorizando soluções que fortaleçam o sistema sem sobrecarregar os que já estão no limite.

Matias Vogt
Advogado e colunista especializado em Direito e Política.

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