O carnaval é uma festa que se perpetua há séculos no país e integra o calendário de nossa cultura popular. Apesar de ser uma festa vibrante e cheia de alegria, pode apresentar alguns perigos, especialmente para as mulheres, pois, a atmosfera de festa e liberdade pode levar a situações de assédio e violência. Além disso, o consumo excessivo de álcool pode afetar o julgamento e a capacidade de se defender em situações desconfortáveis.
Apesar de todos os avanços ideológicos, sociais e culturais conquistados pelas mulheres, voltados ao livre arbítrio de ir, vir, vestir e dispor do próprio corpo, o comportamento feminino ainda protagoniza pautas recorrentes que as culpabilizam, especialmente em contextos de violência sexual e assédio.
A despeito da polêmica social, que muitas vezes sugere que a mulher é, de alguma forma, responsável pelos crimes que possam lhe acontecer, baseada na escolha de vestimenta, comportamento ou estilo de vida, é de suma importância destacar que a responsabilidade pela violência recai unicamente sobre o agressor.
Essa ideia de que a vestimenta pode “provocar” ou “justificar” a violência é uma forma de perpetuar estigmas e preconceitos, além de desviar a atenção da sociedade para questões estruturais que envolvem a cultura de violência de gênero.
Para desmistificar esse impasse social, o Código Penal (Decreto-Lei nº 2.848/1940) dispõe de uma série de dispositivos, organizados no Título VI, que especificam as condutas que violam e ofendem de forma grave a dignidade sexual, a integridade e o respeito que cada indivíduo merece, sobretudo as mulheres.
Dentre os principais crimes previstos, destacam-se:
- a) estupro e estupro de vulnerável (artigo 213 e 217-A do CP), onde o consentimento e a capacidade, psicológica ou etária, de consentir são fatores-chave para identificação da conduta criminosa;
- b) violação sexual mediante fraude (artigo 215), que consiste em ter conjunção carnal ou prática de atos libidinosos mediante fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a manifestação de vontade da vítima;
- c) importunação sexual (artigo 215-A), que consiste na prática de atos libidinosos com alguém que não tenha consentido com a prática;
- d) assédio sexual (artigo 216-A), onde o fator-chave também está ligado ao constrangimento da vítima em se submeter a atos de natureza sexual;
- e) registro não autorizado da intimidade sexual (artigo 216-B), que está relacionado à conduta de produzir, fotografar, filmar ou registrar conteúdo com cena de nudez ou ato sexual, ou libidinoso, sem a prévia autorização dos participantes;
- f) além dos crimes de difamação e injúria (artigos 139 e 140) e de lesão corporal (artigo 129), que, embora não versem exclusivamente sobre a dignidade sexual, podem se relacionar a ofensas à honra, imagem e integridade corporal de uma pessoa, inclusive de natureza sexual.
Quando condutas similares às listadas forem praticadas contra menores de 14 anos, o Código Penal prevê dispositivos específicos de punibilidade, estabelecendo penas mais altas para quem praticar.
Portanto, as mulheres são livres para vestir, transitar, se divertir e dispor do próprio corpo, de forma consciente, como bem entender, e é dever do próximo respeitar quando limites forem estabelecidos, seja pelo não consentimento com a prática de qualquer ato que julgar afetar a própria intimidade, seja quando a capacidade psicológica de prestar consentimento de forma consciente esteja afetada por qualquer motivo, ainda que temporariamente.
Todavia, independentemente dos direitos que lhes resguardam, para evitar contratempos neste momento festivo, é importante se manterem atentas ao entorno, tomando algumas precauções, como evitar andar sozinhas em locais isolados, manter seus pertences seguros, não aceitar bebidas de terceiros, não compartilhar copo ou garrafinhas para que outras pessoas segurem e, principalmente, que estejam conscientes dos direitos que lhes resguardam, sobretudo em relação à disposição do próprio corpo.
É dever da sociedade compreender que “não é não!” e esse posicionamento deve ser respeitado, sem insistência ou pressão, bem como, estar consciente de que interações interpessoais mais íntimas, sexuais ou libidinosas, com pessoa que esteja com a capacidade mental ou psicológica alterada, ainda que temporariamente, pelo uso excessivo de álcool ou outras substâncias, pode levar à responsabilidade pela prática de um dos crimes acima listados, especialmente contra a dignidade sexual.
Para finalizar, é fundamental que as mulheres se cuidem e se apoiem mutuamente durante as festividades, estejam atentas às iniciativas de promoção da segurança no ambiente em que frequentarem e andem sempre acompanhadas por alguém de confiança. O importante é aproveitar a festa com responsabilidade e segurança, sem precisar lidar com incidentes graves.