A recente decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) sobre o transporte de animais de suporte emocional em voos comerciais trouxe à tona um debate que envolve companhias aéreas, passageiros e defensores dos direitos dos animais. A Quarta Turma do tribunal, em julgamento realizado em maio de 2025, definiu que esses animais não possuem as mesmas prerrogativas que os cães-guia, que passam por treinamentos específicos e têm regulamentação própria. A determinação gerou reações variadas, com alguns passageiros criticando a medida e outros apoiando a autonomia das empresas aéreas.
Essa decisão marca um momento importante para a aviação civil brasileira, especialmente em um contexto de aumento na procura por viagens com animais de estimação. Dados da Associação Brasileira de Empresas Aéreas (Abear) mostram que, em 2024, mais de 1,2 milhão de animais foram transportados em voos domésticos, um crescimento de 15% em relação ao ano anterior.
A seguir, alguns pontos centrais da decisão:
- Animais de suporte emocional não são equiparáveis a cães-guia.
- Companhias aéreas podem definir regras próprias para o transporte.
- A decisão reforça a importância do treinamento específico para animais em voos.
O julgamento, relatado pelo ministro Luis Felipe Salomão, considerou que a regulamentação atual não obriga as empresas a aceitarem animais de suporte emocional, mas também não as impede de fazê-lo, desde que sigam normas de segurança e higiene.
Regras para transporte de animais
A decisão do STJ esclarece que as companhias aéreas têm autonomia para aceitar ou recusar o transporte de animais de suporte emocional, desde que respeitem as condições previstas em suas políticas internas. Essas regras variam entre as empresas, com algumas exigindo documentação específica, como atestados médicos, enquanto outras limitam o tamanho ou o peso do animal.
A Latam, por exemplo, permite o transporte de animais de suporte emocional em voos domésticos, desde que o passageiro apresente um laudo psicológico ou psiquiátrico emitido nos últimos 12 meses. A Gol, por outro lado, restringe o transporte a cães-guia, exigindo identificação oficial e comprovante de treinamento. A Azul adota uma política intermediária, aceitando animais de suporte emocional em casos específicos, mas com análise prévia.
A regulamentação da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) determina que os cães-guia devem ser transportados gratuitamente na cabine, próximos ao passageiro, sem necessidade de kennel. Já para outros animais, incluindo os de suporte emocional, as empresas podem cobrar taxas adicionais, que variam de R$ 200 a R$ 600 por trecho, dependendo da companhia e do destino.
Diferenças entre cães-guia e animais de suporte emocional
Um dos principais argumentos do STJ para diferenciar cães-guia de animais de suporte emocional é o treinamento rigoroso pelo qual os primeiros passam. Cães-guia são preparados para auxiliar pessoas com deficiência visual ou auditiva, aprendendo a controlar impulsos, obedecer comandos e lidar com situações de estresse em ambientes públicos, como aeroportos e aviões.
Animais de suporte emocional, por outro lado, não passam por esse tipo de preparação formal. Esses animais, que podem incluir cães, gatos, coelhos ou até mesmo aves, são recomendados por profissionais de saúde para ajudar no controle de ansiedade, depressão ou outros transtornos emocionais. No entanto, a ausência de treinamento específico pode gerar desafios em voos, como comportamentos imprevisíveis ou dificuldades no controle de necessidades fisiológicas.
A decisão destaca ainda que os cães-guia possuem identificação oficial, emitida por centros de treinamento credenciados, o que facilita sua aceitação em voos. Para animais de suporte emocional, a documentação varia, muitas vezes limitada a laudos médicos que não garantem o comportamento do animal em ambientes confinados.
Os seguintes pontos diferenciam os dois tipos de animais:
- Treinamento: Cães-guia passam por anos de preparação; animais de suporte emocional, não.
- Identificação: Cães-guia têm certificação oficial; outros dependem de laudos médicos.
- Comportamento: Cães-guia são treinados para ambientes públicos; animais de suporte podem ser imprevisíveis.
- Regulamentação: Cães-guia têm direito garantido por lei; outros dependem das companhias.
Reações à decisão do STJ
A determinação do STJ gerou debates acalorados nas redes sociais e entre entidades de defesa dos animais. Passageiros que dependem de animais de suporte emocional para viajar expressaram preocupação com a possibilidade de restrições mais rígidas. Uma usuária do X, identificada como defensora dos direitos dos animais, afirmou que a decisão pode dificultar o acesso de pessoas com transtornos psicológicos a voos, especialmente em trajetos longos.
Por outro lado, algumas companhias aéreas e associações de passageiros apoiaram a medida. A Abear destacou que a autonomia das empresas permite equilibrar a segurança dos voos com as necessidades dos passageiros. Um levantamento da entidade mostrou que, em 2024, cerca de 3% dos incidentes em voos domésticos envolvendo animais foram relacionados a comportamentos disruptivos, como latidos excessivos ou acidentes com necessidades fisiológicas.
Entidades como a Organização Nacional dos Cegos do Brasil (ONCB) reforçaram a importância de manter a distinção entre cães-guia e outros animais. Segundo a ONCB, a equiparação poderia comprometer os direitos de pessoas com deficiência visual, que dependem exclusivamente de seus cães para mobilidade e segurança.
Histórico de regulamentações no Brasil
O transporte de animais em voos comerciais no Brasil é regulado desde 2004, quando a Anac publicou as primeiras normas sobre o tema. Inicialmente, apenas cães-guia eram contemplados, com regras claras sobre sua acomodação na cabine. Com o aumento da demanda por viagens com animais de estimação e de suporte emocional, as companhias começaram a criar políticas próprias, muitas vezes gerando inconsistências.
Em 2019, a Anac atualizou a regulamentação, permitindo que as empresas definissem critérios para o transporte de animais na cabine ou no porão, desde que respeitassem normas de segurança. Essa flexibilização abriu espaço para a aceitação de animais de suporte emocional, mas também gerou disputas judiciais, com passageiros questionando recusas das companhias.
O julgamento do STJ em 2025 é o mais recente capítulo dessa trajetória. A decisão foi motivada por um caso específico, no qual uma passageira buscava transportar um animal de suporte emocional sem cumprir as exigências da companhia aérea. O tribunal entendeu que a empresa agiu dentro de suas prerrogativas ao recusar o embarque.
Políticas internacionais sobre animais em voos
A decisão do STJ alinha o Brasil a práticas adotadas em outros países, onde a distinção entre cães-guia e animais de suporte emocional é comum. Nos Estados Unidos, por exemplo, o Departamento de Transportes revisou suas regras em 2021, limitando o transporte gratuito na cabine a cães-guia e impondo restrições a animais de suporte emocional.
Na Europa, a Agência Europeia para a Segurança da Aviação (EASA) permite que as companhias decidam sobre o transporte de animais de suporte, mas exige documentação rigorosa, incluindo laudos médicos e comprovantes de comportamento. Países como Canadá e Austrália adotam políticas semelhantes, com foco na segurança e no bem-estar dos passageiros.
No Brasil, a decisão do STJ pode incentivar as companhias a padronizar suas políticas, reduzindo disputas judiciais. Um levantamento da Anac mostra que, entre 2022 e 2024, cerca de 400 ações judiciais relacionadas ao transporte de animais foram registradas, muitas envolvendo animais de suporte emocional.
Desafios para passageiros
Para os passageiros que dependem de animais de suporte emocional, a decisão do STJ representa um obstáculo adicional. A obtenção de laudos médicos, o pagamento de taxas e a incerteza sobre a aceitação do animal em voos podem dificultar o planejamento de viagens.
Um caso relatado em um portal de notícias envolveu uma passageira que teve seu gato de suporte emocional recusado em um voo internacional, mesmo após apresentar documentação. A companhia alegou que o animal não atendia aos critérios de peso e tamanho, o que gerou uma disputa resolvida apenas com intervenção judicial.
Os seguintes desafios foram destacados por passageiros:
- Custos elevados: Taxas de transporte podem chegar a R$ 600 por trecho.
- Documentação: Laudos médicos nem sempre são aceitos pelas companhias.
- Inconsistência: Políticas variam entre empresas, gerando confusão.
- Restrições: Animais maiores ou de espécies não convencionais são frequentemente recusados.
Avanços na regulamentação de segurança
A decisão do STJ também reforça a importância de normas de segurança no transporte de animais. A Anac exige que todos os animais na cabine sejam acomodados de forma a não comprometer a segurança dos voos, incluindo o uso de kennels ou contenção adequada. Para cães-guia, a regulamentação é mais flexível, permitindo que fiquem ao lado do passageiro sem contenção.
As companhias aéreas investiram em treinamento de equipes para lidar com animais em voos. A Latam, por exemplo, oferece cursos anuais para comissários de bordo, com foco na identificação de comportamentos de risco e no atendimento a passageiros com deficiência. A Gol mantém um protocolo específico para cães-guia, garantindo que sejam acomodados em assentos com espaço extra.
Impacto nas companhias aéreas
A autonomia concedida pelo STJ às companhias aéreas pode reduzir custos operacionais relacionados a disputas judiciais e incidentes em voos. Um relatório da Abear estima que, em 2024, as empresas gastaram cerca de R$ 5 milhões em processos e indenizações envolvendo transporte de animais.
Por outro lado, a decisão pode levar a uma revisão das políticas internas. Algumas companhias, como a Azul, já anunciaram que planejam atualizar suas regras para animais de suporte emocional, com foco em critérios mais claros e acessíveis. A Gol, por sua vez, informou que manterá a política restritiva, priorizando cães-guia.
As principais mudanças esperadas incluem:
- Padronização de taxas: Redução da variação de preços entre empresas.
- Documentação unificada: Exigência de laudos padronizados.
- Treinamento de equipes: Ampliação de programas para comissários.
- Comunicação clara: Divulgação de regras nos sites das companhias.
Casos emblemáticos
Casos envolvendo animais de suporte emocional têm ganhado destaque na mídia. Em 2023, uma passageira tentou embarcar com um pavão como animal de suporte emocional em um voo da Latam, gerando polêmica nas redes sociais. A companhia recusou o transporte, citando riscos à segurança, mas o caso levantou debates sobre os limites da aceitação de animais em voos.
Outro episódio, ocorrido em 2024, envolveu um cão de suporte emocional que escapou do kennel durante um voo doméstico, causando tumulto na cabine. A companhia foi multada pela Anac por falhas na fiscalização, mas o incidente reforçou a necessidade de regras mais rigorosas.
Perspectivas para o setor aéreo
O setor aéreo brasileiro enfrenta o desafio de equilibrar a demanda por transporte de animais com a segurança e o conforto dos passageiros. A decisão do STJ é vista como um passo para esclarecer as responsabilidades das companhias, mas também destaca a necessidade de diálogo com os passageiros.
A Abear planeja realizar, ainda em 2025, um fórum com representantes de companhias aéreas, associações de passageiros e entidades de defesa dos animais para discutir novas diretrizes. A iniciativa busca criar um consenso sobre o transporte de animais de suporte emocional, com foco em critérios objetivos e acessíveis.
Dados do transporte de animais
O transporte de animais em voos domésticos cresceu significativamente nos últimos anos. Segundo a Anac, o número de animais transportados passou de 800 mil em 2020 para 1,2 milhão em 2024, impulsionado pelo aumento de viagens pós-pandemia. A maior parte desses animais (70%) é transportada no porão, enquanto 25% viaja na cabine como animais de estimação ou de suporte emocional, e 5% são cães-guia.
As taxas cobradas pelas companhias variam conforme o tipo de transporte:
- Cabine: R$ 200 a R$ 600 por trecho.
- Porão: R$ 300 a R$ 1.000, dependendo do peso.
- Cães-guia: Gratuito, conforme regulamentação.
A decisão do STJ não altera essas taxas, mas pode incentivar as empresas a revisar suas políticas para atrair passageiros que viajam com animais.