Os filhos do quarto: Uma geração presente no corpo, ausente na convivência

"E não estamos falando somente de crianças."

O silêncio que ecoa na alma

Vivemos tempos em que a presença física já não garante a presença emocional. A pandemia da COVID-19 escancarou uma realidade que já se desenhava: estamos cada vez mais próximos pelas telas, mas distantes nos afetos. O que antes era um lar cheio de vozes, agora muitas vezes se resume a portas fechadas, fones de ouvido e olhares perdidos em telas brilhantes.

O “quarto” — símbolo de privacidade e descanso — tornou-se, para muitos, um refúgio silencioso onde se esconde a solidão. E não são apenas os filhos que se recolhem. Adultos, casais, amigos, colegas de trabalho… todos, em algum nível, estão se tornando “filhos do quarto”: presentes no corpo, mas ausentes na convivência.

A nova solidão: Digital, Silenciosa e Coletiva

A hiperconectividade nos prometeu acesso ilimitado ao mundo, mas não nos preparou para o vazio que ela também pode causar. A pandemia acelerou esse processo. Aulas, reuniões, encontros e até celebrações migraram para o digital. E, com isso, muitos perderam o hábito  e a habilidade — de estar verdadeiramente com o outro.

Hoje, não é raro ver famílias inteiras em silêncio à mesa, cada um imerso em seu próprio universo digital. Relações se tornaram funcionais, conversas se tornaram superficiais, e o silêncio, antes sinal de paz, passou a ser sintoma de desconexão.

E a tecnologia?

A tecnologia é neutra. O que fazemos com ela é o que define seu impacto. Quando usada como ponte, ela aproxima, educa, conecta. Mas quando se torna muro, ela isola, fragmenta e silencia. O problema não está no uso, mas no excesso e, principalmente, na substituição do real pelo virtual.

Estamos formando uma geração de todas as idades, que sabe interagir com algoritmos, mas tem dificuldade em lidar com emoções humanas. Que compartilha tudo nas redes, mas não sabe pedir ajuda. Que responde mensagens, mas evita conversas profundas.

“A maior doença do mundo hoje não é a lepra ou a tuberculose, mas sim o sentimento de não ser querido, de estar só.”
— Madre Teresa de Calcutá

A boa notícia é que ainda há tempo. O vínculo humano pode estar adormecido, mas não está perdido. Reconstruir a convivência exige intenção, presença e coragem. Coragem para sair do quarto — físico ou emocional — e se permitir estar com o outro de forma autêntica.

Algumas atitudes simples podem fazer a diferença:

  • Criar espaços de convivência real, mesmo que breves: uma refeição sem celular, uma conversa sem pressa, um passeio sem distrações.
  • Praticar a escuta ativa, sem julgamentos, com empatia.
  • Reaprender a estar em silêncio juntos, não como ausência, mas como presença compartilhada.
  • Desconectar-se para reconectar-se: com o outro, consigo mesmo, com a vida.

 

Este não é um texto nostálgico. É um alerta. Um convite. Um lembrete de que, por trás de cada tela acesa, há um ser humano que precisa ser visto, ouvido e acolhido. Que o quarto pode ser abrigo, mas não deve ser prisão. Que o silêncio pode ser conforto, mas não pode ser abandono.

A pandemia nos ensinou o valor da presença. Agora, cabe a nós resgatar o valor da convivência. Porque viver é mais do que existir — é se relacionar, é pertencer, é sentir.

Talvez o maior desafio do nosso tempo não seja a falta de tempo, mas a falta de presença. E talvez o maior ato de amor hoje seja simplesmente estar — de verdade — com o outro.

Repito, Viver é mais do que existir — é se relacionar, é pertencer, é sentir.

Maysa Bezerra

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