A pensão alimentícia concedida à ex-cônjuge após a dissolução do matrimônio permanece um tema de acalorados debates no âmbito jurídico e social. Para muitos, constitui um mecanismo imprescindível para assegurar o mínimo existencial e resguardar a dignidade daquela que, frequentemente, se encontra em situação de vulnerabilidade econômica. Para outros, revela-se como um prolongamento indevido dos laços afetivos e financeiros, configurando um fardo que inviabiliza a plena autonomia e o encerramento definitivo da relação conjugal.
Entretanto, qualquer manifestação conclusiva sobre o tema demanda uma análise criteriosa e contextualizada, que transcenda simplificações dicotômicas, tais como “direitos da mulher” versus “privilégios imerecidos” ou “proteção social” versus “dependência emocional”.

Krishina Santos
Advogada
O ordenamento jurídico brasileiro prevê a possibilidade de cobrança de alimentos não apenas nas relações parentais, mas também entre cônjuges e ex-cônjuges, desde que evidenciada a necessidade do alimentando e a capacidade do alimentante. Tal prerrogativa reflete o princípio basilar da solidariedade familiar, que não se esgota com a dissolução do vínculo matrimonial, sobretudo diante das desigualdades econômicas e sociais que frequentemente emergem.
Durante a convivência conjugal, é comum que a mulher abdique parcial ou integralmente de sua atividade profissional para dedicar-se aos cuidados do lar e à criação dos filhos, fenômeno que acarreta impactos diretos e duradouros em sua independência financeira. A pensão alimentícia, portanto, pode ser compreendida como instrumento compensatório temporário, destinado a mitigar os efeitos da vulnerabilidade advinda do término da união, possibilitando a reinserção socioeconômica da ex-cônjuge.
Não se trata de mera concessão benevolente, mas de um reconhecimento do direito à dignidade da pessoa humana, pilar constitucional que orienta o Direito de Família. A proteção econômica a que se refere a pensão alimentícia visa evitar que a pessoa, por ter dedicado sua vida a um projeto familiar, seja relegada a condições de pobreza e marginalização social.
Ademais, a pensão pode constituir forma de reparação pelos desequilíbrios intrínsecos à partilha das responsabilidades e sacrifícios conjugais, notadamente enfrentados pelas mulheres. O pagamento de alimentos, quando fundamentado, promove o equilíbrio justo entre as partes, respeitando as necessidades e capacidades individuais após o término da relação.
Por outro lado, é imprescindível reconhecer que a obrigação alimentar não deve se perpetuar indefinidamente, tampouco servir como mecanismo para manter vínculos afetivos ou dependência financeira indevida. A legislação e a jurisprudência orientam que tal obrigação tem natureza eminentemente temporária, podendo ser prorrogada somente em situações excepcionais, como incapacidade permanente ou avançada idade que impeça a autossustentação.
A manutenção da pensão em cenários onde a ex-cônjuge detém autonomia financeira pode configurar um prolongamento artificial do vínculo conjugal, obstaculizando a emancipação e fomentando uma dependência prejudicial. Tal equilíbrio demanda análise cuidadosa das particularidades do caso concreto, da trajetória conjugal e das condições presentes de ambas as partes.
A pensão alimentícia para a ex-mulher não pode ser analisada sob lentes simplistas. Em alguns contextos, ela é um suporte necessário para corrigir desigualdades geradas ao longo da vida conjugal. Em outros, pode, de fato, perpetuar vínculos emocionais prejudiciais à liberdade e ao crescimento dos envolvidos.
A resposta à pergunta “suporte financeiro ou perpetuação de vínculos emocionais?” é: depende. Depende das intenções, das necessidades, das condições de cada parte e, sobretudo, de como o sistema de justiça interpreta e aplica o princípio da dignidade da pessoa humana em cada caso concreto.