Golpe da doença: pessoas fingem câncer para ganhar dinheiro e doações

Só em Goiás, foram ao menos três casos envolvendo esse tipo de crime. Golpistas tentam sensibilizar pessoas próximas para arrecadações

A descoberta de uma doença grave é quase sempre um momento delicado não só para o paciente, mas também para familiares e amigos que estão por perto, prestam apoio e podem ficar traumatizados com a situação. Cientes de que problemas de saúde são sensibilizadores, algumas pessoas têm usado isso como recurso para promoverem golpes.

Em Goiás, ao menos três casos chamaram a atenção e foram divulgados pelo Metrópoles. Situações em que os supostos pacientes forjavam tratamentos ou desviavam a finalidade dos valores arrecadados para procedimentos estéticos, por exemplo.

Em todos os casos, os suspeitos se aproveitaram da boa-fé das pessoas para conseguirem doações, benefícios, cessão de créditos ou serviços gratuitos.

Divulgação/Polícia Civil

Relembre alguns casos

Na situação mais recente, uma mulher de 29 anos foi presa suspeita de fingir câncer terminal e lúpus para aplicar golpes e, assim, realizar procedimentos estéticos. Ela usava uma bandana na cabeça para sensibilizar as vítimas, não trabalhava e ostentava vida de luxo nas redes sociais.

Kamilla Morgana foi presa em Aparecida de Goiânia, na região metropolitana da capital goiana, por estelionato, na última terça-feira (30/7). O caso foi denunciado à corporação por parentes e amigos da mulher, que desconfiaram das doenças que ela dizia ter.

De acordo com a corporação, a mulher confessou que aplicava os golpes em amigos, parentes e pessoas próximas. Até mesmo a escola onde a filha dela estuda chegou a arrecadar doações em dinheiro para o suposto tratamento e fez transferências por Pix.

“Ela, inclusive, simulava que estava realizando tratamento quimioterápico quando, na verdade, realizava procedimentos estéticos e obtinha vantagens indevidas de amigos e pessoas próximas”, afirma a polícia.

Influencer usava filha

Apesar de não fingir nenhuma doença, neste caso que aconteceu em Anápolis, a cerca de 55 km da capital goiana, ao que parece, o dinheiro doado para a pequena Sofia, de 2 anos, que tem paralisia cerebral, não foi usado em coisas pessoais apenas pelo pai dela, o influencer Igor Viana.

De acordo com a Polícia Civil de Goiás, chegaram denúncias de que a mãe da criança, Ana de Santi, também teria se beneficiado dos valores e feito tratamentos estéticos.

“Há informação de que a mãe teria feito cirurgia plástica com esse dinheiro”, confirmou Aline Lopes, delegada responsável pelo caso.

Igor Viana, influencer de 24 anos, é acusado de uma gama de crimes relativos à sua filha, de 2 anos, que tem paralisia cerebral. Ele é investigado pela corporação por suspeita de desviar doações e ridicularizar a criança.

A delegada afirma que o influenciador é suspeito de maus-tratos, desvio de proventos de pessoa com deficiência, estelionato e por causar constrangimento à criança. Aline Lopes disse que a mãe também está sendo investigada por suposto desvio de dinheiro recebido para a menina.

“Ambos trabalham com a internet, mas a principal fonte de renda deles vem das doações que a menina recebe. Estamos apurando se houve desvio de dinheiro e se ele foi utilizado para algo que não seja o sustento e os tratamentos da menina”, explicou a delegada.

A delegada ainda destaca que a mãe da menina também é suspeita de desviar o dinheiro da filha e, caso os crimes nos quais Igor é investigado forem comprovados, ela pode responder também por omissão.

Fingia leucemia

A camareira Débora Barros dos Santos, de 26 anos, foi alvo de investigação por fingir que tinha leucemia para aplicar golpes. Segundo a Polícia Civil de Goiás, ela recebeu, ao menos, R$ 12 mil em doações. Segundo a corporação, cerca de 100 pessoas que trabalhavam com a mulher participaram de uma rifa, feita por ela, no valor de R$ 25.

Ela também recebeu diversas doações de pessoas próximas e familiares. Ela pedia contribuições em dinheiro para a suposta realização de exames, tratamentos e custeio de remédios.

O caso aconteceu em Pirenópolis, no Entorno do Distrito Federal, e foi revelado em janeiro do ano passado. De acordo com o delegado responsável pela apuração, Tibério Cardoso, os valores podem ser ainda mais altos. Segundo ele, outras pessoas que participavam de outros núcleos de convivência de Débora, além dos colegas de trabalho, participaram das campanhas para ajudá-la no suposto tratamento.

“Só um jardineiro que trabalhava com ela conseguiu uma doação com vizinhos de R$ 750. Ela também conseguiu doações da família do namorado, de pessoas próximas, familiares, valores individuais que chegavam a R$ 3 mil”, contou o delegado ao Metrópoles.

Para sensibilizar os colegas de trabalho, Débora usava fotos com sangue falso, além de imagens com curativos. No entanto, segundo o delegado, médicos analisaram as fotos e afirmaram que se trata apenas de uma substância avermelhada. “Opiniões médicas já afirmaram que o sangue é falso. Mas enviamos para a perícia para uma análise mais aprofundada”, revelou.

Mesmo sensibilizados, muitos colegas de trabalho da camareira desconfiaram do comportamento dela, até que um deles denunciou o caso à polícia. Três amigas de Débora chegaram a fazer tatuagens em homenagem à colega doente.

Débora dizia aos colegas que fazia o tratamento acompanhada de uma amiga, que ninguém conhecia. Ao Metrópoles, Cardoso disse acreditar que esse personagem também seja uma invenção de Débora, já que ela não consegue dar informações sobre a mulher. Ainda segundo o delegado, a mulher nunca apresentou diagnósticos ou exames que comprovassem a leucemia.

A camareira alegava ainda que realizava o tratamento contra o suposto câncer em um hospital no qual ela não é paciente. Em depoimento, as testemunhas falaram que a jovem alegava fazer o tratamento no Hospital Araújo Jorge, em Goiânia. Porém, o hospital informou que Débora nunca foi paciente da unidade.

Tirando vantagens

Camilla Maria Barbosa dos Santos, de 27 anos, foi indiciada por estelionato após fingir uma doença grave para aplicar golpes financeiros. Neste caso, a mulher era da cidade de Morrinhos, no sul goiano. De acordo com a Polícia Civil de Goiás, ela supostamente se utilizava da justificativa de ter câncer de mama, com metástase no pulmão e intestino, para conseguir doações e vantagens.

Conforme a polícia, diversas vítimas compareceram à delegacia e relataram que ajudaram a mulher, mas que começaram a desconfiar da veracidade da sua doença. Camilla realizava campanhas e rifas para arrecadar dinheiro. O caso também foi descoberto no início de 2023.

Em interrogatório, Camilla afirmou que tinha câncer de mama e o tumor teria retornado no início de 2022. Ela também disse que teria descoberto a recidiva quando pegou dengue. Segundo ela, em julho de 2022, iniciou o tratamento da doença no Hospital Araújo Jorge. No entanto, a unidade de tratamento informou à polícia que Camilla nunca foi paciente.

Os responsáveis pelo hospital relataram diversas situações em que Camilla se fez presente no local, onde foi flagrada tirando fotos em uma maca no setor de quimioterapia, utilizando um cartão de identificação interno do hospital, em nome de terceiros. A mulher chegou a ser retirada da unidade de saúde em razão da conduta.

Durante busca e apreensão realizada na residência da investigada, diversos documentos e exames foram apreendidos, mas em nenhum deles é possível constatar que Camilla, de fato, tem câncer. Ainda de acordo com a polícia, a própria indiciada não possuía qualquer exame ou laudo médico que confirmasse o diagnóstico.

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