O governo Lula (PT) apresentou recurso ao Supremo Tribunal Federal (STF) contra a decisão de impedir o uso do Bolsa Família em apostas de quota fixa, as chamadas bets. A manifestação foi apresentada nesta semana pela Advocacia-Geral da União (AGU), que colheu argumentos dos ministérios da Fazenda, responsável pela regulamentação e fiscalização do mercado de apostas no país, e do Desenvolvimento Social, que faz o repasse do programa assistencial.
Flávio José Roman, substituto do ministro da AGU Jorge Messias, argumenta que o recurso não manifesta discordância com as premissas conceituais do acórdão, que visa defender a saúde mental, especialmente das crianças e adolescentes, e proteger a situação econômica de indivíduos e famílias vulneráveis.
Em síntese, a manifestação diz que “não é operacionalmente viável” distinguir entre a renda proveniente do trabalho e o benefício financeiro recebido do programa Bolsa Família.
Veja os argumentos do Ministério da Fazenda:
- A Secretaria de Prêmios e Apostas (SPA) ainda está em processo de análise e avaliação dos pedidos de autorização, não tendo, até o momento, a lista definitiva das empresas que estarão autorizadas a ofertar os serviços de apostas a partir de 12 de janeiro de 2025;
- A pasta não possui a atribuição regimental direta para tratar dados de beneficiários de programas sociais e de benefícios de prestação continuada, incluindo os recursos pagos a estes beneficiários.
Veja os argumentos do Ministério do Desenvolvimento Social (MDS):
- O valor financeiro repassado pelo programa a cada família beneficiária é recurso privado, a partir do momento que integra sua conta bancária, e não mais recurso público;
- A conta bancária de pagamento dos benefícios do Bolsa Família (utilizada por 99% das famílias beneficiárias) não é de uso exclusivo do programa e pode movimentar valores monetários oriundos de fontes diversas, sem qualquer vínculo com o Bolsa Família;
- Não há meios técnicos para impedir que os valores do Bolsa Família depositados em uma conta bancária sejam utilizados para fins específicos (como para apostas de quota fixa).
O MDS conclui: “Desta forma, é possível afirmar que esta área não dispõe de tecnologia atualmente para operacionalizar o comando judicial”.
Benefícios estaduais
A AGU também afirma que, além dos diversos programas de benefícios sociais existentes na esfera federal, há inúmeros benefícios estaduais e é preciso especificar se os estados também deverão impedir a utilização de seus recursos para a realização de apostas de quota fixa.
“Com efeito, tendo-se em vista a existência de apostas de quotas fixas no âmbito estadual, faz-se necessário esclarecer o direcionamento dos estados-membros no que diz respeito às suas atribuições.”
Decisão do STF
Em 14 de novembro, o plenário do Supremo referendou, por unanimidade, a decisão do ministro Luiz Fux que determinou medidas para impedir que beneficiários usem o Bolsa Família para apostar em bets.
Na ocasião, nove ministros acompanharam a decisão do relator na íntegra. Apenas o ministro Flávio Dino apresentou ressalvas, ao defender dar interpretação para que o Sistema Único de Saúde (SUS) seja estabelecido como a instância regulamentar competente para dispor sobre “transtornos de jogo patológico”.
A decisão liminar do ministro Luiz Fux, expedida em 13 de novembro, se deu no âmbito de duas ações diretas de inconstitucionalidade (ADI). Uma delas tem como autor a Confederação Nacional do Comércio (CNC), e a outra, o partido Solidariedade.
Fux determinou que sejam implementadas medidas imediatas para impedir que recursos provenientes de programas sociais e assistenciais como o Bolsa Família e o Benefício de Prestação Continuada (BPC) sejam usados para apostar em bets.