Após uma disputa voto a voto na reta final da apuração, os candidatos Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT) passaram ao segundo turno das eleições presidenciais, a ser realizado em 28 de outubro. A confirmação matemática dos nomes que irão seguir na disputa só saiu com mais de 95% das urnas apuradas.
O candidato Jair Bolsonaro, representante da direita, favorito nas pesquisas de intenção de voto, votou na manhã deste domingo na zona oeste do Rio sob forte esquema de segurança. Ele chegou ao seu local de votação, a Escola Municipal Rosa da Fonseca, logo cedo e disse acreditar em vitória em primeiro turno. “Dia 28 é praia”, disse o capitão, ao dizer que ganharia no primeiro turno.
Já o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad, que agora tem a missão de unir a esquerda, votou em uma escola na zona sul da cidade. Haddad foi recebido com panelaço de alguns vizinhos da escola. A militância reagiu cantando: “Bate panela, pode bater, quem tira o povo da miséria é o PT”. O candidato minimizou o protesto. “Dia de eleição é normal esse tipo de manifestação. Desde que seja pacífica, não tem problema nenhum.”
No Rio, durante todo o dia, apoiadores do capitão se aglomeraram diante de seu condomínio, na Barra da Tijuca, zona oeste do Rio. No começo da noite, com o início da apuração e as pesquisas de boca de urna, o clima já era de comemoração.
O mesmo aconteceu no quartel-general do petista, em um hotel na zona sul em São Paulo. Com a divulgação da pesquisa boca de urna do Ibope, petistas gritaram e se abraçaram.
A confirmação do segundo turno fez os militantes petistas gritarem e exaltarem cânticos na sala em que acompanham a apuração. Primeiro, gritaram “Haddad é Lula”. Depois, cantaram “eu vou com ele, eu vou com ela; eu vou com Lula, Haddad e Manuela”. A cantoria contrasta com o clima inicial, de tensão, em função de resultados desfavoráveis apontados nas disputas estaduais. Agora, os militantes aguardam o discurso do candidato do partido.
Da saída de Lula à facada: uma campanha dramática. Uma batalha nos tribunais e um ataque a faca ao líder das pesquisas deram o tom dramático das eleições deste ano.
A disputa pelo Planalto começou bem antes da campanha. O clima eleitoral já começou a esquentar com o imbróglio em torno da candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Preso pela Operação Lava Jato desde abril, Lula pretendia concorrer ao Planalto e chegou a protocolar o pedido de registro de candidatura junto ao TSE. No entanto, em 1º de setembro, o tribunal rejeitou o pedido com base na Lei da Ficha Limpa. Lula foi condenado em janeiro a pena de 12 anos e um mês de prisão pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro no âmbito do processo do tríplex no Guarujá, litoral de São Paulo.
O PT recorreu da decisão, mas, para não se ver fora da eleição presidencial, acabou indicando, no último dia do prazo eleitoral, o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad como substituto, o que ocorreu só no último dia 11 de setembro. A deputada estadual no Rio Grande do Sul Manuela D’Ávila (PCdoB) passou a compor a chapa como candidata a vice-presidente.
A escolha por Haddad não foi unânime no partido. Algumas das dúvidas no primeiro mês de campanha eram se Haddad conseguiria se viabilizar como um candidato forte por ter entrado mais tarde que os concorrentes na corrida e se Lula conseguiria transferir os votos ao pupilo. Uma das principais logomarcas da campanha petista trazia os dizeres “Haddad é Lula”.
Enquanto o PT se dividia entre a defesa de Lula e a entrada tardia de Haddad, Bolsonaro se estabeleceu em primeiro lugar nas pesquisas de intenção de voto. Haddad largou em desvantagem, mas conseguiu se isolar em segundo e, em uma semana, chegou a crescer 11 pontos percentuais, segundo o Ibope.
O curto período de campanha e os reles 8 segundos no horário eleitoral gratuito não atrapalharam o crescimento de Bolsonaro nas pesquisas – o candidato usou e abusou das redes sociais para propagar suas ideias, muitas delas polêmicas.
Algumas dessas declarações, consideradas machistas, geraram um movimento de mulheres de todo o país, que foram às ruas gritar #elenão, em referência a Bolsonaro.
Os aliados do capitão também não ficaram atrás no quesito controvérsias. O candidato a vice-presidente na chapa, general Antônio Hamilton Mourão (PRTB), e o coordenador econômico de seu programa de governo, Paulo Guedes, apelidado por ele como seu “posto Ipiranga”, também deram o que falar.
O primeiro, por exemplo, criticou o pagamento do 13º salário e adicional de férias ao trabalhador, além de sugerir que lares pobres “sem pai e avô” são “fábricas de desajustados”. O segundo afirmou pretender criar um imposto nos moldes da extinta CPMF e modificar a alíquota do Imposto de Renda. Diante das declarações, Bolsonaro pediu que cancelassem a participação em eventos e ficassem quietos.
Na reta final da campanha, veículos de imprensa revelaram documentos que indicam queBolsonaro teria ameaçado a ex-mulher – que nega as afirmações – durante disputa pela guarda do filho, furtado um cofre e ocultado bens. Há ainda relatos de “comportamento explosivo” e “desmedida agressividade” por parte do candidato. Bolsonaro nega todas as acusações.
Mas o maior abalo da campanha não viria da imprensa, e sim das ruas. No dia 6 de setembro, na cidade mineira de Juiz de Fora, quando Bolsonaro sofreu uma facadaenquanto fazia uma passeata. Ele teve de suspender a campanha nas ruas e, após duas cirurgias, ficou internado em hospital de São Paulo por 23 dias. Hoje, o candidato se recupera em sua casa, no Rio de Janeiro.
“Terceiras vias” ficam pelo caminho
Ciro Gomes (PDT), Geraldo Alckmin (PSDB), Marina Silva (Rede), Alvaro Dias (Podemos), Henrique Meirelles (MDB) e João Amoêdo (Novo): todos tentaram, em algum momento da campanha, se viabilizar como opção alternativa a Bolsonaro e ao PT.
Marina Silva chegou a aparecer em segundo lugar, atrás somente de Bolsonaro, em cenários sem Lula nas pesquisas do Ibope, porém, foi encolhendo ao longo das semanas. Fatores que ajudaram a derreter sua candidatura foram a intensificação da polarização da disputa e a substituição de Lula por Haddad, para quem parte de seus votos migrou.
Na reta final do primeiro turno, em terceiro lugar, Ciro Gomes se vendeu como a única opção contra Bolsonaro e Haddad por ter condições de vencer os dois no segundo turno, de acordo com simulações de institutos de pesquisa. Ele pediu que os eleitores fizessem uso do voto útil e chegou a sugerir, indiretamente, que Alckmin e Marina desistissem de suas campanhas em seu favor para unir o centro.
Texto divulgado por sua assessoria de imprensa, mas apócrifo, afirma que os eleitores de Marina deveriam “migrar para o Ciro imediatamente, até porque há muita identidade programática entre os dois” e o mesmo se aplicaria aos eleitores do tucano.
Com a segunda campanha mais cara, declarada em mais de R$ 45 milhões do próprio bolso, perdendo em valores apenas para Alckmin, Henrique Meirelles não passou da faixa dos 2% de intenção de voto. Isolado politicamente e amarrado à figura impopular de Michel Temer, não comoveu os eleitores.
Quando Bolsonaro foi hospitalizado pelo ataque a faca, em respeito ao ocorrido e ao estado de saúde dele, os adversários deram uma trégua nos ataques ao concorrente. Cerca de uma semana depois, retomaram as críticas em propagandas eleitorais, debates e discursos uns contra os outros, com destaque ao pesselista. Tanto Ciro quanto Haddad chegaram a comparar Bolsonaro ao ditador austríaco Adolf Hitler. Dos postulantes à terceira via, somente Ciro conseguiu quebrar a barreira dos dois dígitos nas pesquisas de intenção de voto com a estratégia.
Agora, além dos eleitores fiéis aos dois candidatos classificados para o segundo turno, o restante da campanha deverá se polarizar entre os que não querem a volta do PT ao poder e os que recusam a retórica de Bolsonaro. As próximas pesquisas deverão apontar para onde migrarão os votos dos ex-concorrentes tidos como moderados: para o antipetismo ou para o #elenão.