O município de Capixaba, a 77 quilômetros da capital Rio Branco, que na semana passada viveu a fúria de um temporal que atingiu mais de cem casas na cidade, destruindo completamente pelo menos nove das residências, viveu mais um drama nesta terça-feira (10). A cidade sofreu um blackout e ficou completamente às escuras do final da tarde até o início da noite – coincidência ou não no mesmo horário em que a Câmara Municipal deveria abrir a sessão semanal para os vereadores se reunirem.
Quando a energia voltou, a Câmara ainda abriu os trabalhos mas os vereadores de oposição não puderam fazer o que pretendiam e para o que haviam se articulado: a apresentação de um requerimento para a criação de uma CEI (Comissão Especial de Investigação), uma espécie de CPI municipal, para apurar irregularidades envolvendo a Prefeitura Municipal. Daí a suspeita de que o blackout não tenha ocorrido por acaso. A Energisa, a fornecedora de energia elétrica no Estado, não revelou as causas da pane.
Mas, nos poucos momentos em que a sessão da Câmara funcionou após o retorno da energia, alguns vereadores informaram o motivo do pedido de investigação: a Prefeitura, através da Secretaria de Ação Social e de um assessora de confiança do prefeito, estaria praticando o chamado “laranjal” – ou seja, utilizando “laranjas” com o pagamento de dinheiro público para pessoas privadas cujos recursos acabam voltando aos bolsos de quem ordenara o pagamento.
“Corrupção explícita”, conforme denunciou o presidente da Câmara, vereador Richard Lima de Oliveira (PSDC), ao se dirigir ao prefeito em exercício do município, Antônio Cordeiro, o “Joãozinho” (MDB), que compareceu à sessão e chegou usar a tribuna por onde passou por dois mandatos de vereador antes de chegar à Prefeitura. O prefeito era o vice de José Augusto, afastado do cargo no ano passado por ordem judicial, também por denúncias de corrupção.
Ao se dirigir aos vereadores que lhe fazem oposição cerrada, “Joãozinho” disse que não tem medo de ser investigado e afirmou que não dar trela para as acusações eu lhe fazem nos bastidores em toda a cidade. Uma delas é de que ele comprara uma mansão em Rio Branco. “Houve um tempo em que eu me preocupavam com o que diziam. O que eu posso dizer é que só devo satisfações à minha consciência. Por isso, digo aos senhores que podem investigar o que quiserem. Que fiquem à vontade”, afirmou o prefeito em exercício.
O esquema do qual o prefeito e uma assessora de sua confiança são acusados funcionaria assim: a assessora de confiança do prefeito, ordenaria pagamento para pessoas privadas e depois daria um jeito de sacar o dinheiro que ela mesmo mandara depositar e o embolsaria – tudo com a ajuda de uma irmã.
Foi o que revelou o vereador Richard Lima de Oliveira no pronunciamento na presença do prefeito. Ele disse que os vereadores receberam as denúncias do que estava acontecendo e resolveram então investigar. Entraram na página do site Transparência Brasil e lá em encontraram um pagamento de um salário mínimo mensal em nome de Israel Brás, empregado do Armazém Santo Antônio, uma empresa privada de Capixaba. “Como a gente conhece o rapaz, o chamamos na Câmara e ele disse que trabalhava para a empresa privada, com carteira assinada por pelo menos um ano, e não haveria sequer compatibilidade de horário para ele prestar serviço para a Prefeitura”, disse o vereador Richard. “Então, ele negou de forma veemente ter trabalhado e recebido qualquer dinheiro da Secretaria de Assistência Social do Município”, acrescentou o vereador na presença do prefeito. O constrangimento foi visível.
Outros três vereadores – Chico Gomes (PSB), Gedeão Santos (PDT) e Geane Silva (PSDB) também foram incisivos nas denúncias e cobraram explicações, que permaneceu calado. “Sinceramente, depois de tudo o que o nosso município passou, que pela primeira vez teve um prefeito afastado por denúncias de corrupção e mesmo assim continua a receber seus salários, eu gostaria, de verdade, que as denúncias que estamos recebendo não sejam verdadeiras”, disse Chico Gomes.
O funcionário do armazém é marido da empregada doméstica da assessora de confiança do prefeito, acusada de fazer as contratações irregulares. Por isso, desconfia o vereadora, a assessora teve acesso a seus aos dados do rapaz para “contratá-lo” e à senha de seu cartão para fazer os saques e depósitos do dinheiro que ele jura nunca ter visto ou recebido. A esposa do trabalhador deve ser chamado à Câmara para tratar do assunto.
Geane Silva disse ainda que as informações são ainda mais comprometedoras. Uma mulher, cujo nome vem sendo mantido em sigilo, que mora na periferia da cidade e foi uma daquelas vítimas do temporal, disse, em depoimento na Polícia Federal, em Rio Branco, na semana passada, que era contratada por um salário mínimo mensal mas, na verdade, recebia apenas R$ 50,00 por mês. Ela disse disso isso em sede policial. Outra mulher na mesma situação, que acompanhou a primeira na PF, disse que só falaria na presença de seu advogado.
O caso já está sendo apurado pela PF, que deve deflagrar uma operação sobre o caso na semana que vem. O caso está sendo investigado sob sigilo. Procurada, a secretária Sara Frank, não recebeu o repórter. O prefeito “Joaozinho” reafirmou que não teme as futuras investigações.
O vereador Gedeão Santos disse que, por causa da suspensão da energia na terça-feira, o requerimento de criação da CEI não pôde ser concluído para ser apresentado na sessão daquele dia. A apresentação, segundo ele, vai ocorrer na próxima sessão, na semana que vem. Os signatários devem ser Chico Gomes, Geane Silva, Gedeão dos Santos e presidente Richard de Oliveira.