Esquecidos: à espera de visto, haitianos pedem esmola e dormem em praça no Acre

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Fome, cansaço e esperança. É com essa mistura de sentimentos que os haitanos cruzam a fronteira e chegam todos os dias a Brasileia (a 219 km de Rio Branco), no Acre, à espera de um futuro melhor. Sem ter onde ficar na cidade, eles deixam família e amigos para trás, se abrigam na praça central da cidade, sob sol e chuva, e pedem até esmolas à espera do visto que garante a permanência no Brasil.

Os haitianos têm direito a visto especial humanitário desde 2010, quando um terremoto atingiu o país e deixou 75 mil mortos e 1 milhão de desabrigados. Segundo o Conselho Nacional de Imigração, os haitianos são maioria dos que solicitaram pedido de residência no Brasil. Desde 2011, foram 9.352 solicitações aceitas. De acordo com o governo do Acre, cerca 35 mil imigrantes já passaram pelo Estado nos últimos anos.

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Sem abrigo

Apesar de terem ingresso garantido por decreto presidencial, a peleja dos haitianos não acaba quando eles cruzam a fronteira do Brasil. Até abril de 2014, os haitianos eram recebidos em um abrigo em Brasileia, que fica na fronteira com a Bolívia. Lá, tinham local para dormir e recebiam comida.

Mas, há um ano, o abrigo foi desativado –segundo o governo acriano– porque “Brasileia colaborou até o seu limite” com a entrada de haitianos. Agora, todos só têm assistência em Rio Branco, onde o governo mantém um abrigo.

Mas, até chegarem à capital, eles não contam com nenhum tipo de assistência e precisam custear despesas como alimentação e a viagem até o abrigo. O problema é que, ao chegarem ao país, os haitianos precisam se regularizar na delegacia da Polícia Federal em Brasileia. Só depois seguem viagem à capital, onde se cadastram e, dias depois, recebem transporte até São Paulo –destino final da viagem da maioria.

Chegada é sonho realizado

Para chegar ao Brasil, os haitianos normalmente pegam um avião até Quito, capital do Equador. Lá entram em ação os “coiotes”, que prestam serviço aos imigrantes e os levam até Brasileia, cruzando todo o Peru. A viagem de carro dura pelo menos três dias.

O UOL visitou a cidade e encontrou cerca de 30 haitianos que estavam alojados na praça que fica em frente à sede da PF. Era um domingo, e eles aguardavam chegar a segunda-feira para dar entrada no pedido de visto humanitário.

A maioria dos haitianos não quer conversa com jornalistas. Além de dificuldade com a língua, eles têm medo que a exposição atrapalhe sua nova vida. Mas o que todos não escondem é que o visto é um passaporte para realização do sonho de uma vida melhor.

Augusma Daniel, 22, um dos poucos do grupo que fala espanhol e aceitou conversar com a reportagem, contou que o grupo que chegou ao Brasil após viagem de “alguns dias”. “Aqui a gente tenta uma nova vida, porque no Haiti o jovem não tem o que fazer. O país ainda está destruído, não há emprego. Queremos ir para São Paulo trabalhar”, contou.

“A gente dormiu na praça, sofreu com a chuva, mas faz tudo para que o Brasil nos receba e nos dê uma vida melhor”, disse outro haitiano, que não quis informar o nome.

Serviço rápido

Segundo o agente da PF que estava de plantão, o serviço burocrático é rápido e, no mesmo dia em que dão entrada, eles já podem seguir para Rio Branco. Ele conta que os haitianos não param de chegar ao Brasil. “Essa situação é rotineira. Nas segundas-feiras, são de 20 a 30 para pedir visto. Não existe nenhum controle”, afirmou. “Muitos chegam doentes e disseminam essas doenças. Além disso, muitos chegam sem dinheiro e pedem recursos para viajar até Rio Branco e para comer. É uma situação complicada, a comunidade aqui é pobre e não tem condições de ajudar.”

A situação, que já era complicada, ficou ainda pior após este mês com a cheia histórica do rio Acre, que destruiu mais da metade da cidade.

Apoio dos governos

O governo do Acre informou ao informou que a Secretaria de Justiça e Direitos Humanos atende aos imigrantes haitianos, dominicanos e senegaleses que entram de forma ilegal pelas fronteiras do Estado. Em Rio Branco, os haitianos ficam hospedados na Chácara da Aliança, onde têm alimentação, apoio na retirada de documentação e serviços de saúde.

“Como se trata de uma política de fronteiras abertas do governo federal, o Acre coopera em toda atenção humanitária e, em parceria, apoia no seguimento de viagem para as cidades do Centro-Sul. O Acre é apenas uma porta de entrada e regularização da situação imigratória”, explicou.

Segundo o Ministério da Justiça, os haitianos não têm status de refugiados por não terem sido perseguidos no país. As solicitações dos haitianos que chegam são encaminhadas ao Conselho Nacional de Imigração, que desde 2010 concede visto especial humanitário que lhes dá proteção internacional e os mesmos direitos garantidos aos refugiados.

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