Cota racial nas eleições: É possível mudar as regras do jogo no meio do jogo?

No dia 25 de agosto, o Tribunal Superior Eleitoral decidiu que os partidos políticos devem distribuir as verbas públicas de campanha e o tempo de TV e rádio de forma proporcional aos candidatos negros em patamares mínimos que serão fixados por resolução.

A Corte Eleitoral também se manifestou afirmando que é possível determinar o custeio proporcional das campanhas dos candidatos negros, destinando 30% como percentual mínimo, para a distribuição do Fundo Especial de Financiamento de Campanha.

Essa decisão foi tomada numa consulta feita pela Deputada Federal Benedita da Silva (PT-RJ), que pretendia que a Justiça Eleitoral obrigasse ainda os partidos políticos a reservar vagas para candidatos negros, nos mesmos termos do que ocorreu com as mulheres, que têm direito a 30%, por lei.

A lei eleitoral impõe aos partidos políticos a reserva de vaga de 30% para candidaturas femininas. E por essa reserva de gênero, os partidos devem destinar 30% do Fundão Eleitoral para candidaturas de mulheres.

Apesar de ter garantido a distribuição igualitária do tempo de TV e rádio e do Fundo Eleitoral, a Justiça Eleitoral negou a reserva de vagas para candidatos negros.

Essas mudanças só valerão para as eleições de 2022. O ministro Og Fernandes propôs a aplicação do princípio da anualidade previsto no artigo 16 da Constituição, e foi seguido pelos ministros Luís Felipe Salomão, Tarcísio Vieira e Sérgio Banhos.

Esse princípio da anualidade é como aquela regra que aprendemos desde a infância: Não é justo mudar a regra do jogo no meio do jogo.

Entendo que a cota feminina contribui para o aumento da participação da mulher na política e pode reduzir a desigualdade de gênero nos espaços de poder.

Da mesma forma, a decisão do TSE de distribuir proporcionalmente os recursos financeiros e o direito de antena aos candidatos negros é a forma mais rápida de se fazer Justiça à sub-representatividade política racial e ao racismo estrutural da sociedade brasileira.

Mas algumas perguntas parecem não ter respostas: (i) a questão da autodeclaração racial, quem julgará se o candidato é negro? Juiz Eleitoral ou Comissão Examinadora? (ii) quais as consequências legais dos partidos políticos que não obedecerem as novas regras? (iii) Se o partido não tiver candidatos negros, pode usar todo o Fundo Eleitoral?

Esses são alguns dos problemas que se apresentam quando se tenta mudar as regras de um jogo no meio do jogo.

Aprendemos desde pequeno que todo jogo deve ser jogado quando todos os participantes conhecem as regras do jogo, ou, pelo menos, são informados com antecedência sobre as regras que devem seguir. É o que chamo de regra da “não surpresa”.

No direito eleitoral não é diferente.

Espero que até o dia 15 de novembro os candidatos não sejam pegos de surpresa com novas regras. Porque aprendi desde pequeno que mudar as regras no meio do jogo só favorece quem está ganhando.

 Kaio Marcellus

Advogado de Direito Eleitoral

Presidente da Comissão de Direito Eleitoral – OAB

Doutorando – UnB

Mestre – UnB

Professor e Autor de diversas obras jurídicas.

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