A Latam estuda transferir suas operações de passageiro no Brasil para uma outra subsidiária do grupo no país, a cargueira Absa, numa tentativa de reduzir os custos com a folha de pagamentos da tripulação.
Os planos foram apresentados pela Latam em uma reunião virtual fechada com tripulantes realizada na quarta-feira — cujo vídeo O GLOBO teve acesso — e foram recebidos como uma ameaça pelo Sindicato Nacional dos Aeronautas, num momento em que a companhia tenta negociar um acordo coletivo de redução de salários.
O projeto está sendo tratado internamente na Latam como um Plano B, para ser acionado caso as negociações com o Sindicato não evoluam. Segundo fontes próximas à companhia, a intenção é demitir todos os tripulantes e abrir novas vagas na outra empresa, oferecendo uma política de remuneração mais competitiva — obtendo assim a redução pretendida da folha de pagamentos.
Como a Absa é uma empresa do grupo chileno, operando sob o nome fantasia de Lan Cargo, o CNPJ permaneceria o mesmo e o entendimento é que não haveria prejuízo para o processo de recuperação judicial que corre na Justiça dos EUA.
Segundo fontes, a Latam já teria em mãos pareceres jurídicos defendendo a legalidade da decisão. A empresa também estaria em conversas com a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) para atualizar a chamada Especificação Operativa da Absa para incluir a operação de passageiros e as aeronaves Airbus 320.
Em recuperação judicial nos EUA desde maio, o grupo Latam tem dívidas que somam US$ 18 bilhões. No Brasil, a companhia tem uma estrutura de custos com a folha de pagamentos mais cara do que Azul e Gol e tem sido mais impactada pela pandemia por ter uma operação internacional maior.
Com as restrições de diversos países à entrada de estrangeiros, o fluxo de internacional de passageiros deve demorar ainda mais para se recuperar. A empresa retomou menos de 45% dos voos da era pré-pandemia no doméstico. E no internacional, só 5% dos voos foram retomados.
Diante do cenário desafiador para o setor, a Latam calcula que sairá da pandemia 30% a 40% menor. A empresa já demitiu 2,7 mil tripulantes e vem sinalizando que do quadro remanescente de 4,4 mil tripulantes, 1,2 mil estão ociosos, sem perspectiva de voltarem a voar.
Negociações com os sindicatos
O grupo chileno conseguiu negociar redução de salários nas suas subsidiárias do Chile, Peru e Equador e está em negociações abertas na Colômbia. Por aqui, a primeira proposta de redução permanente de salários foi rejeitada pelo sindicato, mas no mês passado a companhia conseguir reabrir as negociações. A nova proposta mantém a remuneração variável baseada em quilômetros voados, com redução dos salários fixos e variáveis em 12% para comandantes e em torno de 7% a 8% para comissários. Como contrapartida, a empresa promete 24 meses de estabilidade no emprego.
Embora a irredutibilidade de remuneração esteja prevista na Constituição, a CLT prevê essa possibilidade em situações excepcionais, por motivos de força maior e mediante aprovação em acordo coletivo.
Procurado, o Sindicato dos Aeronautas considerou o plano da nova empresa uma “fraude trabalhista” e que o mesmo “poderá prejudicar o processo de recuperação judicial devido ao gigantesco passivo trabalhista que seria criado”.
A Latam não quis comentar. [Foto de capa: Edilson Dantas/Agência O Globo]