Professor sofre agressão e ataque racista ao defender filho de 6 anos de acusação de roubo em mercado; VÍDEO

O professor doutor da Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD) Sikiru Balogun, que é nigeriano, foi vítima de racismo em um supermercado de Dourados (MS) na tarde desta quarta-feira (3). Ele levou um soco ao defender o filho, de 6 anos, de uma acusação de roubo feita por um casal (veja o vídeo acima).

CLIQUE AQUI para ver o vídeo.

Segundo Balogun, o crime ocorreu após ele ter se confundido e deixado com o filho um carrinho que pertencia a outras pessoas que estavam no estabelecimento. O professor afirma que, depois disso, uma mulher bateu na criança e a acusou de roubo (leia relato mais abaixo).

Seguranças do supermercado se aproximaram dos envolvidos, e a Polícia Militar foi acionada e levou todos à Delegacia de Pronto Atendimento Comunitário (Depac).

O marido da mulher, de 61 anos, foi denunciado por vias de fato (lesão corporal leve) e injúria racial por ter dado soco no ombro do professor, a quem chamou de “preto”, de acordo com o registro policial.

A mulher acusada pelo professor disse a um policial que não agrediu a criança e que apenas retirou a mão dela do carrinho. Também declarou ter feito isso “pois já havia ocorrido isto com ela, de roubarem seu carrinho, por esse tipo de pessoa”, segundo o registro policial.

O delegado Lucas Albé Veppo afirmou que homem confessou ter agredido o professor e usado o termo “preto” de maneira pejorativa. “Informou que ficou nervoso com a situação, por isso agiu dessa forma”, disse o delegado. O agressor foi liberado após pagamento de fiança no valor de um salário mínimo.

A vítima também fez denúncia de racismo contra a mulher, mas a polícia informou não ter conseguido reunir elementos que confirmassem a acusação e que, por isso, ela não responderá por nenhum crime.

O que diz a vítima

Sikiru Balogun relatou ao g1 que estava no estabelecimento com a esposa e o filho. A família estava com dois carrinhos. Em determinado momento, o professor deixou o filho na fila do caixa com um dos carrinhos e foi até a esposa para pegar o outro.

“Perguntei onde ela tinha deixado, e ela apontou para perto das frutas. Só que houve um engano, eu peguei de outra pessoa”, disse ele. Foi então que Balogun levou o carrinho errado para o caixa, deixando junto com o filho, e se afastou para pesar uma fruta.

Ao retornar para a fila, encontrou o filho com os olhos vermelhos de choro. “Um dos clientes me falou que uma mulher levou [o segundo carrinho] e deu um tapa no meu filho. Eu pensei que fosse a minha esposa, fui atrás dela, perguntei a ela por que ela pegou o carrinho e ela disse que não havia sido dela”, comenta.

Quando chegou perto do filho novamente, Balogun viu que a criança estava chorando. Olhando pelo supermercado, ele identificou o carrinho que havia pego por engano junto com um casal e foi até o homem e a mulher.

“Perguntei ao homem se ele era dono do carrinho. Ele foi grosso e perguntou por que eu estava perguntando. Eu disse: ‘Peguei o carrinho por engano, porém me disseram que a sua senhora bateu no meu filho’. Eu disse que não era para ter batido nele, porque o erro foi meu. Resolvi deixar para lá, voltei, falei para a minha esposa que tinha achado, mas só conversei com o homem”, conta.

Segundo ele, a esposa disse que eles não poderiam deixar a situação de lado. “Porque se acontece com o nosso filho, a nossa criança, pode acontecer com qualquer outra e deveríamos falar para ele que isso não deve.”

O casal foi junto até o homem e a mulher. “Minha esposa chegou e perguntou por que ela tinha batido no nosso filho. Ela disse: ‘Você roubou o nosso carrinho. Eu não bati, apenas tirei a mão dele’.”

“Nesse momento, um dos clientes que presenciou quando ela bateu nele disse: ‘Não, a senhora bateu, eu presenciei, eu vi, a senhora está errada’. O marido dela me deu um soco no ombro, [dizendo] ‘sai daqui, preto’”, conta o professor universitário.

Rótulos

Ao g1,a coordenadora do Núcleo de Estudos Afro-brasileiro da UFGD e professora da Faculdade de Educação da UFGD, Claudia Cristina Ferreira Carvalho, afirmou que o ocorrido com o professor nigeriano não é um caso isolado.

“Eu acho que a grande questão posta é a ideia do negro como criminoso, como subalterno, dos corpos negros como sendo aquele que toda e qualquer violência possa ser aplicada, como uma forma de correção”, afirmou ela.

“Então, quando nós circulamos nesses espaços, a última coisa que alguém ao olhar para os nossos corpos vai ver é que ele é um doutor, uma doutora, que é um pesquisador, que é um profissional liberal, porque se tira a ideia de possibilidade de uma pessoa negra ser vista como um igual diante daquele que nos discrimina.”

A pesquisadora ainda comenta que é comum a colocação de rótulos em pessoas negras.

“É muito comum quando nós entramos em lojas, sermos rotulados como um pretenso ou uma possibilidade de sermos alguém que vai cometer um ato criminoso, pequenos furtos, porque somos julgados por aquilo que nós somos”, diz

“Ou seja, pela cor da nossa pele, pelas nossas características fenotípicas, pelo tom da nossa pele, pelo tipo de cabelo que nós temos, pelos nossos traços, nariz, boca, muito menos por aquilo que nós fazemos. Há uma pré-concepção de que nós somos violentos, que nós somos criminosos, isso são representações sociais que alimentam o racismo.”

“São fatos que são alimentados por essa ideia de uma supremacia racial e essa supremacia é branca.”
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