A modelo Victoria Fernandes, de 29 anos, foi eleita Miss T World (MTW) 2021, concurso mundial de beleza trans realizado em Bréscia, na Itália, no último fim de semana. Este é o primeiro título deste nível conquistado pela mineira nascida em Patos de Minas, que começou no mundo da moda em 2013.
Devido à pandemia de Covid, a última edição do MTW ocorreu em 2019 e voltou somente neste ano. Por isso, também foram coroadas a modelo de Sorriso (MT), Bella Valentina, como “Miss T World 2020”; e a modelo tailandesa Valunpath Loysanun como “Miss T World 2022”. O trio foi o mais bem votado entre 17 candidatas, avaliadas por sete jurados.
O objetivo do MTW, segundo Victoria, é exaltar a beleza da mulher trans, além de dar visibilidade para artistas, estilistas, maquiadores e diversos outros profissionais da comunidade LGBTQIA+.
“A importância de ganhar esse título é trazer visibilidade para as transexuais. Mostrar que também podemos ocupar um espaço e uma posição na sociedade, pois estamos cansadas de ser marginalizadas”.
Porém, a tão sonhada conquista do título poderia não ter acontecido. Isso porque Victoria estava decidida a não participar de mais nenhum concurso, já que estava frustrada com os resultados até então e via injustiças.
“Pensei em nunca mais participar de concurso algum, mas queria muito poder representar a minha comunidade trans de uma forma limpa e justa, e também ser uma inspiração e dar coragem para muitas meninas não desistirem dos seus sonhos”.
Faltando apenas três meses para o MTW de 2022, a modelo decidiu entrar na competição.
“Em um concurso mundial como esse, eu precisaria de seis meses de preparação, no mínimo. Eu estava decidida a não participar de nada, mas algo me dizia ‘vai que esse ano é seu!’. Então comecei todo um trabalho em conjunto com a minha equipe de cabeleireiro, maquiador, estilista e personal trainer.
Apesar do tempo curto, o trabalho foi compensado com o primeiro lugar.
História
Victoria nasceu e cresceu em Patos de Minas, no Alto Paranaíba. O interesse em maquiagens, roupas e sapatos femininos começou ainda na infância, quando também gostava de brincar de colocar a toalha na cabeça para imitar cabelo. O comportamento gerava estranheza para a família.
“Minha mãe me levou em uma psicóloga para ajudar a entender porque um garoto de 5 anos se comportava como uma menina. Me lembro que levei todos os desenhos para a médica, que conversava comigo uma vez por semana durante dois meses. O diagnóstico foi que eu era uma criança como qualquer outra”.
Porém, anos se passaram e as coisas ficaram mais difíceis para Victoria, principalmente na adolescência, pois sofra bullying na escola e chegou a ser mudar três vezes de colégio.
Além disso, por não se aceitar como menino, aos 13 anos começou a fazer transição sozinha e se automedicava, o que é contraindicado.
“Antigamente não tínhamos um sistema de saúde como hoje, em que as meninas transexuais podem recorrer a especialista para fazer um tratamento hormonal correto”, alertou.
Outro ponto foi a aceitação da minha família. “Era tudo novo para eles, que também temiam a covardia das pessoas nas ruas com as pessoas trans. Quando eu saía na rua com as minhas amigas, minha mãe temia pela minha segurança, sempre preocupada se eu ia voltar viva para casa”, relembrou.
Conquistas
Aos 18 anos, Victoria se mudou para Uberaba, no Triângulo Mineiro, onde começou a participar de concursos e ganhou o “Miss Trans Uberaba”.
Um ano depois se mudou para a Europa e seguiu na carreira da moda e disputas: em 2016, obteve a 7ª colocação no Miss Trans Universo em Perúgia, Itália; na 1ª edição do Miss T World em 2017, ficou entre as cinco mais bonitas; em 2019, participou do Miss Trans Star em Barcelona, Espanha, conquistando o 2º lugar.
Para Victoria, vencer estas etapas aos poucos é a prova de que ela transformou em conquistas o sofrimento e a insegurança enfrentados quando mais nova.
“O caminho foi árduo. Tentei por diversas vezes me ingressar no mundo na moda no Brasil, mas sem sucesso. As pessoas ainda tinham a cabeça muito fechada para entender que nós, transexuais, também somos seres humanos e não extraterrestres. Esse foi o motivo da minha mudança para Europa, onde lentamente as portas foram abrindo para mim”, contou.
Após receber o título MTW 2021, a modelo tem recebido algumas propostas que ainda não podem ser reveladas. Além disso, ela sonha em abrir a própria marca de vestidos.