Há exatos 34 anos, no dia 22 de dezembro, uma quinta-feira como hoje, o então presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Xapuri, Francisco Alves Mendes Filho, o Chico Mendes, tombava morto, com um tiro no peito, disparado à queima roupa. Fazia exatamente sete dias que ele havia completado 44 anos de idade. Estava em seu segundo casamento.
Passavam poucos minutos das 18 horas quando a futura viúva Ilzamar Gadelha Mendes, mãe de Helenira e Sandino, os filhos de Chico Mendes ainda crianças, veio pedir que o marido e seus parceiros de dominó desocupassem a única mesa da casa humilde no centro da cidadezinha de Xapuri, já que ela tinha pressa para servir o jantar e ficar livre das obrigações domésticas para poder assistir sossegada ao último capítulo de sua novela preferida.
Era o folhetim “Vale Tudo”, exibida pela rede Globo, que trazia como vilã a personagem da atriz Beatriz Segal, já falecida, que na história havia sido assassinada e, naquela noite, último capítulo da novela, saber-se-ia, enfim, quem havia matado Odete Roitman, o nome da personagem da trama. Na semana anterior, graças à força da audiência da Rede Globo na época, o Brasil interior passara a se preguntar quem havia matado Odete Roitman? Na dura novela da vida real na qual Chico Mendes era personagem central, a partir do início daquela noite, o Brasil e boa parte do mundo passaram a se perguntar quem havia mandado matar Chico Mendes?
Porque quem apertara o gatilho, em Xapuri, praticamente todos já sabiam: teria sido o fazendeiro Darli Alves da Silva ou alguém a mando dele. Quem dava conta disso era o próprio Chico Mendes, segundo o próprio afirmara a uma freira ao visitar o Hospital Epaminondas Jácome, naquele dia, lá mesmo em Xapuri. Quando a freira o saudou e o desejou “Um Feliz 1989”, o ano seguinte, Chico Mendes teria arrematado:
– Irmã, acho que não chego nem ao ano que vem.
Não chegaria mesmo.
Naquela noite, ao levantar-se da mesa onde jogava dominó com os policiais militares que cuidavam de sua segurança para ir tomar banho num banheiro improvisado no fundo do quintal da casa. Trazia a toalha no ombro e estava sem camisa, vestindo apenas calção, quando levou uma saraivada de chumbos no peito direito. Peritos da Unicamp (Universidade de Campinas), de São Paulo, ao examinarem o cadáver, constataram que ele levou uma saraivada de 44 caroços de chumbo no peito. Morreu poucos instantes depois, pedindo para morrer dignamente sobre sua cama, no que foi, em parte, atendido.
O tiro teria sido disparado por Darcy Allves Pereira, um dos filhos de Darli Alves, os quais se entregaram à polícia uma semana após o crime. Nesses 44 anos ainda há dúvidas se foi de fato o filho do fazendeiro quem atirou.
A dúvida persiste nesses 44 anos porque Chico Mendes, por causa de seu enfrentamento à UDR (União democrática Ruralista), entidade que congregava fazendeiros no país, tinha interesse em sua morte, já que , por suas relações internacionais, Chico Mendes se tornado uma espécie de peça indesejável ao agronegócio brasileiro.
Militante da reforma agrária e da conservação do meio ambiente, além de fundador de reservas extrativistas não predatórias, Chico Mendes foi assassinado por donos de terras opositores à sua luta.
Chico Mendes nasceu no seringal Porto Rico, localizado na região de Xapuri. Com pai seringueiro, ele acompanhou o trabalho dos seringueiros desde a infância, tornando-se profissional da área. Diferentemente de outros seringueiros, que eram analfabetos devido ao difícil acesso aos estudos na região, Mendes alfabetizou-se aos 16 anos, quando aprendeu a ler e escrever com Euclides Távora, refugiado político que morava próximo de sua casa.
Chico Mendes teve três filhos — Angela (da primeira união), Elenira e Sandino. O ambientalista deixou a viúva Ilzamar Mendes, com quem ficou casado de 1983 a 1988.